2040 é o ano que a NASA apresentou para levar humanos para Marte. Mas será que é possível viver neste planeta? Quais as consequências? Um trabalho de mestrado na área da Física Médica da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) analisou a possibilidade de vida em Marte sob o ponto de vista da radiação. Um estudo pioneiro, dado que, até agora, só foram realizados estudos sobre os efeitos da radiação em objetos. 

No trabalho de dissertação de Miguel Ralha, agora mestre em Física Médica, ficou demonstrado que “um ser humano em Marte, em condições normais, receberia 20 vezes mais radiação anual do que na Terra”. 

“Marte não tem um campo magnético nem uma atmosfera densa o suficiente para proteger a superfície do planeta da radiação solar”, começa por explicar Pedro Teles, docente da FCUP que orientou o trabalho em conjunto com o astrofísico Nuno Cardoso Santos, investigador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) na U.Porto e também professor na Faculdade de Ciências. 

Para chegar a estas conclusões, Miguel Ralha usou um fantoma de voxel, ou seja, uma simulação computacional de tecidos e órgãos do corpo humano. A radiação anual em Marte é de 125 mili-sieverts (mSv), ao passo que, na Terra, a média, por pessoa, ronda os 6 mSv. 

Os efeitos da radiação, não seriam, dizem os investigadores, “uma sentença de morte certa para os astronautas, mas as possibilidades de desenvolverem doenças de todo o tipo, desde cataratas, a doenças a nível do sistema nervoso, a todo o tipo de cancros aumentariam drasticamente”.

Dado que a Física Médica procura estudar e promover o uso pacífico da radiação para tratamento e diagnóstico, através do controlo das doses, os investigadores estão também à procura de soluções para uma ida a Marte o mais segura possível para os astronautas. “As implicações são muito difíceis de contornar, mas uma delas seria a de exposição em curtos espaços de tempo”, referem.

Como proteção, para ser possível, em Marte, um espaço com radiação similar à da Terra, o trabalho de Miguel Ralha sugere, por exemplo, construções à base de paredes de regolito marciano com sete metros de espessura, ou então paredes de água com 11 metros de espessura. 

Os investigadores estão agora a trabalhar na apresentação de um projeto à Fundação para a Ciência e Tecnologia para dar continuidade a este trabalho. “São necessários estudos mais detalhados, como a questão da viagem de ida e volta, onde a radiação também é alta, por exemplo”, descrevem. 

Pedro Teles (à esquerda) orientou, em conjunto com o astrofísico Nuno Cardoso Santos (à direita), o trabalho de mestrado de Miguel Ralha (ao centro).

A dissertação “Effective dose equivalent estimation for humans on Mars” foi defendida em dezembro do ano passado e contou com a colaboração do Centro Aeroespacial Alemão (DLR), onde trabalha a também antiga estudante da FCUP, Marta Cortesão.