O Núcleo Regional do Norte da Liga Portuguesa Contra o Cancro (LPCC-NRN) atribuiu recentemente 17 Bolsas de Investigação em Oncologia, sete das quais foram conquistadas por jovens investigadores da Universidade do Porto.

Com um valor individual de 12.600 euros, estas bolsas anuais têm como objetivo apoiar projetos inovadores nas áreas da prevenção, diagnóstico e tratamento do cancro. De um financiamento total de mais de 214 mil euros atribuídos pela LPCC-NRN, mais de 88.000 euros servirão assim para financiar projetos da U.Porto.

Dos projetos distinguidos, quatro estão sediados no Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S). Focam-se em tumores cerebrais pediátricos (Bárbara Ferreira), cancro familiar da tiroide (Elisabete Teixeira), cancro da mama metastático (Rita Carvalho) e cancro da mama triplo-negativo (Ricardo Pinto).

As restantes Bolsas de Investigação em Oncologia LPCC-NRN 2024 foram atribuídas às/aos investigadoras/es Ana Lobo de Almeida, do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS), Carla Luís, da Faculdade de Medicina (FMUP), e João Morais, da Faculdade de Farmácia (FFUP) e vão apoiar trabalhos nos domínios da oncofertilidade e do cancro da mama (no caso dos dois últimos), respetivamente.

Terapias dirigidas para os tumores pediátricos do sistema nervoso central

Os tumores pediátricos do sistema nervoso central são o tema central do projeto apresentado por Bárbara Ferreira, do grupo «Cancer Signalling & Metabolism» do i3S.

Sob orientação do investigador Jorge Lima e integrada numa equipa multidisciplinar composta por cientistas do i3S e do Ipatimup e clínicos do Centro Hospitalar Universitário São João, a investigadora – que já tinha conquistado uma das bolsas atribuídas pela LPCC-NRN em 2023 – pretende encontrar alternativas às terapias existentes que se baseiam numa combinação de cirurgia, quimioterapia e radioterapia e que estão associadas a efeitos adversos com um grande impacto na qualidade de vida das crianças sobreviventes e das suas famílias.

Licenciada em Bioquímica pela U.Porto e mestre em Medicina e Oncologia Molecular (FMUP) , Bárbara Ferreira vai desenvolver o seu projeto no grupo de investigação em «Cancer Signalling & Metabolism» do i3S. (Foto: DR)

O principal objetivo, explica, “é utilizar tecnologia de sequenciação de células para caraterizar diferentes subpopulações celulares em tumores pediátricos do sistema nervoso central complexos utilizando o modelo de organoides derivados de doentes já estabelecido pela nossa equipa”.

Depois de identificadas as alterações moleculares dos tumores, sublinha Bárbara Ferreira, “esperamos realizar testes de fármacos dirigidos a estas alterações, o que pode resultar em novas abordagens terapêuticas para estes doentes”.

Prevenir e desenvolver terapias inovadoras para o cancro da tiroide

O projeto da investigadora Elisabete Teixeira, do grupo «Cancer Signalling & Metabolism» do i3S, liderado por Paula Soares, centra-se no cancro familiar da tiroide, “uma doença complexa e pouco compreendida”.

Este trabalho, explica a jovem investigadora do i3S, “visa facilitar o diagnóstico precoce, a estratificação do risco e a medicina personalizada para famílias com historial genético da doença”.

Estudante do Programa Doutoral em Metabolismo – Clínica e Experimentação (FMUP), Elisabete Teixeira vai desenvolver o seu projeto no grupo de investigação em «Cancer Signalling & Metabolism» do i3S. (Foto: DR)

Através de um estudo genético abrangente de famílias com vários elementos afetados por cancro da tiroide, “pretendemos compreender melhor a doença, permitindo a sua prevenção, vigilância ativa e contribuindo para o desenvolvimento de terapias inovadoras”, adianta Elisabete Teixeira, que frequenta atualmente o 4.º ano do Programa Programa Doutoral em Metabolismo – Clínica e Experimentação da FMUP.

Esta abordagem, sublinha, “poderá reduzir casos de doença avançados, tratamentos agressivos, comorbilidades e cirurgias invasivas, aliviando também a carga económica para o Sistema Nacional de Saúde”.

Conseguir prever o risco de ter metástases cerebrais

Cerca de dez por cento dos cancros da mama metastizam para o cérebro. A percentagem não é muito alta, mas é o órgão metastático com o impacto mais negativo na sobrevida das doentes: As taxas de sobrevivência são muito baixas e os tratamentos existentes não são eficazes. O grupo «Cancer Metastasis» do i3S, onde Rita Carvalho vai desenvolver o seu projeto, sob orientação da investigadora Ana Sofia Ribeiro, identificou recentemente uma proteína secretada por células tumorais que desempenha um papel crucial na metastização cerebral.

Com este projeto, agora financiado pela LPCC, explica Rita Carvalho, “vamos validar o impacto clínico dessa proteína e o seu potencial como biomarcador preditivo para metástases cerebrais, permitindo uma identificação mais precisa das mulheres com alto risco para desenvolverem metástases neste órgão”.

O objetivo, adianta a investigadora do i3S e estudante do Programa Doutoral em Ciências Biomédicas do ICBAS, “é conseguirmos desenvolver tratamentos mais eficazes, beneficiando as mulheres afetadas por essa doença devastadora”.

A frequentar o Programa Doutoral em Ciências Biomédicas do ICBAS desde 2017, Rita Carvalho vai desenvolver o seu projeto no grupo de investigação em «Cancer Metastasis» do i3S. (Foto: DR)

Estudar o cancro da mama triplo negativo das mulheres africanas

Caracterizado por uma incidência muito elevada em mulheres de ancestralidade africana, sobretudo em faixas etárias mais jovens, o cancro da mama triplo-negativo é o subtipo de cancro da mama mais agressivo e de pior prognóstico e tem sido esse o foco do investigador Ricardo Pinto, do grupo «Genetic Diversity» do i3S, liderado por Luísa Pereira.

Em colaboração com o IPO-Porto e parceiros de Países Africanos de Língua Portuguesa (PALOP), e com recurso a tecnologias de alto rendimento, o jovem investigador do i3S e estudante do Programa Doutoral em Ciências Biomédicas do ICBAS pretende “caracterizar perfis somáticos mutacionais e avaliar a resposta a terapias no contexto do cancro da mama triplo-negativo africano”.

As informações obtidas na sequência do estudo dos mecanismos biológicos deste grupo de neoplasias em mulheres africanas, explica, “poderão contribuir para o desenvolvimento de estratégias preventivas e terapêuticas informadas”.

Estudante do o Programa Doutoral em Ciências Biomédicas do ICBAS, Ricardo Pinto vai desenvolver o seu projeto no grupo de investigação em «Genetic Diversity» do i3S. (Foto: DR)

 Inovar em oncofertilidade e na luta contra o cancro da mama

Dos cientistas da U.Porto reconhecidos pela LPCC -NRN há a destacar outra “repetente” relativamente à edição anterior. Trata-se de Ana Lobo de Almeida, jovem investigadora do ICBAS – concluiu recentemente o Mestrado em Oncologia – que vê agora premiado o seu PvB PreCare project: Whether in pink or blue- the important thing is to remember that prevention is much more important than curing!, focado no domínio da oncofertilidade.

A desenvolver no Laboratório de Biologia Celular do Departamento de Microscopia do ICBAS, sob a orientação da docente e investigadora Rosália Sá, o trabalho agora distinguido dá seguimento ao projeto BOAST, no qual Ana Lobo de Almeida procurou determinar e avaliar o efeito da bleomicina isolada nos espermatozoides humanos, “permitindo uma maior compreensão da ação in vitro da bleomicina na função reprodutora, e fornecendo aos clínicos e aos doentes [com cancro testicular] em si um maior conhecimento dos riscos reais deste fármaco na fertilidade masculina”.

“A atribuição da Bolsa de Investigação em Oncologia 2024 ao nosso projeto de investigação é um reconhecimento que nos deixa muito honrados! Mas, mais do que um incentivo, é uma divisa significativa para a preservação da fertilidade na literacia em saúde e uma aposta clara na qualidade de vida dos doentes oncológicos e sobreviventes do cancro”, refere a cientista.

Ana Lobo de Almeida é mestrado em Oncologia pelo ICBAS e membro  do grupo «Biology and Genetics of Reproduction / Molecular and Cellular Medicine (BGR & MCM)» da UMIB/ICBAS. (Foto: DR)

Dos laboratórios do ICBAS para os da vizinha Faculdade de Farmácia é por sua vez o o caminho que  João Morais vai percorrer com o objetivo de testar um novo composto contra o cancro da mama triplo-negativo.

O projeto do mestre em Oncologia visa explorar o potencial anticancerígeno do composto BBIT20, “um promissor inibidor da via de reparação do DNA” recentemente identificado no grupo da investigadora Lucília Saraiva, orientadora do projeto. A ideia passa por “melhorar a eficácia dos tratamentos convencionais e reduzir os efeitos secundários nos doentes com este subtipo de cancro da mama, caracterizado por ser o mais agressivo e com pior prognóstico”.

“Ficamos muito gratos por este apoio da LPCC, pois com esta bolsa o João poderá dar continuidade ao trabalho de investigação que tem desenvolvido, no nosso grupo de investigação”, refere Lucília Saraiva.

Mestre em Oncologia pelo ICBAS, João Morais vai desenvolver o seu projeto no grupo de investigação de Lucília Saraiva, na FFUP. (Foto: André Maia)

Por fim, há a destacar a bolsa atribuída a Carla Martins Luís, mestre em Medicina e Oncologia Molecular pela FMUP e a frequentar atualmente o 4.º ano do Programa Doutoral em Metabolismo – Clínica e Experimentação da mesma faculdade.

O projeto premiado propõe uma “abordagem integradora” ao cancro da mama e à obesidade e será orientado por Raquel Soares, professora da FMUP e líder do grupo de investigação em «Metabesity» do i3S.

Com a verba atribuída, a estudante irá então continuar a estudar a associação entre cancro da mama e obesidade, com foco nas alterações do metabolismo energético central e, mais especificamente, na glicólise e na gluconeogénese. Para tal, vai avaliar os metabolitos presentes no sangue e em tecido de mama de mulheres com cancro da mama e obesidade, em mulheres com cancro da mama e com peso normal e em mulheres sem doença.

Para Carla Luís, os resultados deste projeto, assente no seu trabalho de doutoramento, poderão ter um papel na mudança de paradigma, permitindo apostar na medicina personalizada. “Ainda não existem guidelines para doentes com cancro da mama obesas. A obesidade é considerada um fator de risco, mas não é tido em conta na terapêutica. Está na altura de começarmos a ver a obesidade como um modulador do cancro da mama”, apela.

Carla Luís frequenta o último ano do Programa Doutoral em Metabolismo – Clínica e Experimentação da FMUP. ( Foto: FMUP)

A cerimónia de assinatura dos contratos de atribuição das Bolsas de Investigação em Oncologia 2024 teve lugar no passado dia 5 de fevereiro, na sede da LPCC-NRN, no âmbito das comemorações do Dia Mundial de Luta Contra o Cancro.