Uma equipa de investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) está a construir uma ferramenta eletrónica que visa melhorar a prescrição de medicamentos aos doentes com mais de 65 anos de idade, prevenindo as reações adversas, consideradas “um problema de saúde pública”.

A meta deste grupo é criar uma ferramenta adaptada à população portuguesa, testá-la em médicos de família a partir de 2024 e, a longo prazo, tentar a sua integração com os sistemas de informação utilizados nos Cuidados de Saúde Primários, isto é, em centros de saúde e unidades de saúde familiar, a nível nacional.

“O programa de prescrição médica eletrónica acabou com o papel, mas não é inteligente nem amigável, pois não comunica com o médico, não avisa, por exemplo, que a dose que estou a prescrever não é a mais correta. Podemos dizer que o médico tem de saber, mas a verdade é que há cada vez mais informação e é impossível abarcar tudo. Não podemos basear-nos apenas na memória”, explica Luís Monteiro, professor da FMUP.

O objetivo desta ferramenta eletrónica, que já está a ser aplicada com sucesso noutros países, é ajudar os médicos a detetarem e a descontinuarem os fármacos que já não são necessários ou que podem estar a causar mais dano do que benefício aos doentes que os tomam.

Como recorda o autor principal deste trabalho, “a ideia surgiu depois de ter visto, ainda como estudante de Medicina da FMUP, os sacos com várias caixas de medicamentos, alguns com o mesmo princípio ativo, que os idosos levavam para a consulta. Da minha experiência como médico de família, este tema é cada vez importante”.

De facto, “os doentes idosos têm mais tendência a apresentar problemas relacionados com a medicação por estarem polimedicados”. Em Portugal, estima-se que cerca de 77% da população mais velha tome mais de cinco medicamentos em simultâneo. As barreiras à “desprescrição” neste grupo etário incluem a falta de tempo dos médicos.

Com esta ferramenta, os médicos poderão fazer pesquisas e aceder, de forma simples e rápida, a propostas sobre quais os medicamentos que deverão descontinuar nos seus doentes e de que forma devem fazê-lo. Pretende-se, desde logo, “poupar tempo”.

Segundo o professor da FMUP, “não se trata de adicionar mais uma janela ou de diminuir o tempo de contacto com o doente. Pelo contrário. Queremos diminuir o tempo de ecrã precisamente porque libertamos o médico da tarefa de ler, dando sugestões, sem substituir a decisão partilhada entre o médico, o doente e a família”.

Além dos ganhos em custo-efetividade, está provado que as ferramentas eletrónicas de apoio à “desprescrição” são “eficazes na melhoria da qualidade e segurança dos cuidados de saúde aos idosos, levando, por exemplo, a uma diminuição do número de quedas”.

Outras estratégias para aumentar a qualidade e segurança da prescrição estão a ser estudadas na FMUP, nomeadamente a aplicação de instrumentos que estabeleçam um canal de comunicação entre médicos de família, médicos hospitalares e farmacêuticos.

Este trabalho, publicado na PLOS ONE, foi financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT). Além de Luís Monteiro (FMUP/CINTESIS), a equipa agrega os investigadores Sofia Baptista, Inês Ribeiro Vaz, Andreia Teixeira e Matilde Monteiro Soares (FMUP/CINTESIS), James McCormack (University British Columbia), no Canadá, Cristiano Matos (Instituto Politécnico de Coimbra) e Carlos Martins (CINTESIS).