A investigadora Marina Silva, do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S), recebeu recentemente um financiamento de 137 mil euros no âmbito do programa de bolsas médicas da multinacional farmacêutica Pfizer para, durante dois anos, criar um modelo humano de neurónios sensitivos, precisamente os neurónios que são afetados pela Polineuropatia Amiloidótica Familiar (PAF), também conhecida como paramiloidose ou “doença dos pezinhos”. O objetivo é descodificar o que acontece nos neurónios antes da doença estar instalada e agir preventivamente, travando a neurodegeneração.

A Polineuropatia Amiloidótica Familiar (PAF), hoje cientificamente conhecida como Polineuropatia Amiloide de Transtirretina (ATTR-PN), é uma doença genética rara causada por mutações na proteína Transtirretina (TTR), o que faz com que esta proteína se deposite nos neurónios sensitivos, causando assim neurodegeneração. Afeta aproximadamente 10 mil pessoas em todo o mundo, sendo que a doença tem um impacto relevante em Portugal, onde estão identificados cerca de dois mil doentes, o que equivale a 20% das pessoas diagnosticadas em todo o planeta.

As opções terapêuticas para a PAF incluem o transplante de fígado (órgão onde a proteína TTR é sintetizada) e estratégias para estabilizar ou silenciar a TTR, com o objetivo de diminuir a progressão da doença. Contudo, estas opções não revertem a neurodegeneração causada pela deposição da TTR nos nervos periféricos, ou seja, não curam as lesões já existentes.

O objetivo de Marina Silva, que integra a equipa liderada por Márcia Almeida Liz, do grupo do i3S «Nerve Regeneration», é “descobrir os mecanismos que acontecem inicialmente na doença e caracterizar melhor a neurodegeneração progressiva para encontrar novas terapias que possam ser aplicadas antes que a doença se instale“.

“Criar neurónios sensitivos humanos”

Já se fizeram estudos em alguns tecidos como fígado, tecido adiposo e glândulas salivares de pacientes, mas Marina Silva pretende estudar os neurónios sensitivos, o tipo de célula afetada por este problema clínico. Para isso, a partir de células de doentes com PAF, a equipa “vai gerar células pluripotentes (iPSCs), ou seja, células que podem ser diferenciadas em vários tipos de células, e ‘criar’ neurónios sensitivos humanos para estudar a doença nos estadios iniciais e monitorizar as alterações que a TTR vai causando”, explica.

Este estudo, sublinha Marina Silva, “vai aumentar significativamente o conhecimento sobre a PAF, além de ser um impulso para o futuro desenvolvimento de novas terapias para a doença”.

Os resultados obtidos serão depois validados com recurso a amostras de biópsias de doentes, no âmbito de uma colaboração com o médico Ricardo Taipa, da Unidade de Neuropatologia do Centro Hospitalar Universitário do Porto. O projeto conta ainda com a participação dos investigadores Pascal Röderer e Oliver Brüstle, Alemanha.