As investigadoras Joana Gaifem e Ana Isabel Fernandes, do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S), foram recentemente distinguidas com duas bolsas da Sociedade Europeia de Microbiologia Clínica e Doenças Infecciosas (ESCMID), no valor de 20 mil euros cada uma. O estudo de Joana Gaifem centra-se no papel dos glicanos das células intestinais no desenvolvimento da doença inflamatória intestinal, ao passo que o de Ana Isabel Fernandes na variabilidade da bactéria que causa a tuberculose.

As cientistas juntam-se assim ao grupo restrito de 28 cientistas de toda a Europa galardoados pela ESCMID. Estes prémios têm como principal objetivo apoiar jovens cientistas europeus que desenvolvem investigação de excelência nos campos da microbiologia clínica e das doenças infeciosas.

Intitulado «Os glicanos como elemento central na reparação da disbiose na doença inflamatória intestinal», o projeto apresentado por Joana Gaifem, do grupo «Immunology, Cancer & Glycomedicine», liderado por Salomé Pinho, pretende estudar de que forma as alterações na expressão de glicanos (carboidratos/açúcares) presentes à superfície das células do intestino podem influenciar a composição de bactérias (microbiota intestinal) e, desta forma, interferir com a função do sistema imunitário levando ao desenvolvimento de inflamação no intestino.

A doença inflamatória intestinal (DII) é um conjunto de distúrbios inflamatórios do trato gastrointestinal que engloba a Doença de Crohn e a Colite Ulcerosa. Esta doença é caracterizada por alterações na composição da microbiota intestinal, designadas por disbiose. Apesar de já estarem descritas em pacientes com DII, ainda não se sabe qual a relação causal entre a disbiose e o desenvolvimento da doença. Assim, explica Joana Gaifem, “este projeto tem como objetivo investigar o papel desses glicanos na regulação entre a microbiota intestinal e o sistema imunitário, ou seja, perceber se essas alterações nos glicanos das células do intestino podem estar na base do desenvolvimento de inflamação do intestino e da DII”.

Os resultados obtidos com este projeto, que está ainda numa fase inicial, vão contribuir para “clarificar os mecanismos subjacentes à disbiose e, consequentemente, ao desenvolvimento da doença inflamatória intestinal”. Além disso, adianta Joana Gaifem, “pretendemos encontrar novas estratégias de tratamento da doença, mas sobretudo de prevenção”. O projeto será desenvolvido no i3S em colaboração com o serviço de Gastroenterologia do Centro Hospitalar Universitário do Porto e do Saint Antoine Hospital (Paris, França).

Para Joana Gaifem, o financiamento atribuído pela ESCMID constitui uma “enorme honra”. “Representa a valorização da investigação científica que o nosso grupo no i3S produz, mas também a importância e o impacto do estudo na área da doença inflamatória intestinal”. Por outro lado, acrescenta a investigadora júnior, “a oportunidade de liderar um projeto de investigação ambicioso com uma equipa multidisciplinar representa um desafio extremamente motivador e impulsionador dos próximos passos na minha carreira científica”.

Desvendar a variabilidade da bactéria que causa a tuberculose

Estudante de doutoramento do programa Molecular and Cell Biology, do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS), e a desenvolver investigação no grupo do i3S «Immune Regulation», liderado por Margarida Saraiva, Ana Isabel Fernandes vai focar-se por sua vez no estudo das interações entre o hospedeiro e a bactéria Mycobacterium tuberculosis, o agente causador de tuberculose.

“Trata-se de uma doença extremamente heterogénea, cuja variabilidade não se encontra ligada exclusivamente ao hospedeiro. Aliás, o impacto da variabilidade genética desta bactéria no ser humano tem vindo a ser profundamente estudada pelo nosso grupo e resultou numa recente publicação na Nature Communications“, explica a investigadora.

No artigo já publicado, a equipa demonstrou que a (pouca) diversidade genética da bactéria que causa a tuberculose poderá influenciar o grau de gravidade – ligeira, moderada ou severa – com que a doença se manifesta no ser humano.

Este projeto, esclarece Ana Isabel Fernandes, “surge no seguimento desta publicação e tem como objetivo desvendar o papel da diversidade da M. tuberculosis na reprogramação metabólica dos macrófagos (a primeira «arma» do sistema imunitário no combate a uma infeção)”. A resposta a esta questão, sublinha, “pode ajudar a esclarecer aspetos mecanísticos da adaptação metabólica do sistema imune inato durante uma infeção bacteriana”.

Para Ana Isabel Fernandes, “é uma honra e um grande orgulho receber uma ESCMID Research Grant. Eu estou numa fase muito inicial da minha carreira e esta bolsa permite-me desenvolver o meu projeto de doutoramento de uma forma muito competitiva”. Para além disso, conclui, “é também uma grande oportunidade para iniciar as minhas competências na gestão de projetos, algo que penso ser muito relevante para o meu crescimento científico e pessoal”.