Uma equipa de investigadores do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S), em colaboração com o Instituto Superior Técnico, de Lisboa, e a Universidade Técnica de Viena (TU Wien), na Áustria, desenvolveram uma tecnologia baseada em xurografia, que permite produzir um órgão-em-chip em apenas algumas horas e a baixo custo. Esta técnica, descrita num artigo publicado recentemente na prestigiada revista científica Advanced Science, permite acelerar um processo que normalmente é muito demorado e poderá facilitar a disseminação do uso dos sistemas órgão-em-chip como alternativa à experimentação animal.

Esta tecnologia, explica Daniel Ferreira, primeiro autor do artigo e estudante de doutoramento do Programa Doutoral em Biotecnologia Molecular e Celular Aplicada às Ciências da Saúde (BiotechHealth), do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS), “utiliza uma impressora de corte para remover, a partir de folhas de silicone, as geometrias dos canais de perfusão do chip, numa questão de segundos”.

“Além da melhoria significativa no tempo de produção, todo o processo pode ser executado com equipamento de baixo custo, reduzindo os três maiores encargos de fabricação: tempo, custo e espaço para alojar o equipamento de produção”, acrescenta o investigador, que desenvolveu o seu trabalho no grupo Biofabrication do i3S, liderado pelo investigador Pedro Granja.

Órgão-em-chip: uma nova forma de fazer ciência

O tempo que medeia o desenvolvimento de um medicamento e a sua aplicação na clínica é, em geral, superior a dez anos. Isso deve-se, em parte, à utilização de modelos animais nos chamados ensaios pré-clínicos. Para além das questões éticas inerentes ao uso de animais, estes modelos não conseguem replicar, de forma eficiente, a resposta humana a um determinado fármaco. Nesse sentido, têm-se multiplicado os esforços para encontrar alternativas que possam substituir a experimentação animal, num contexto pré-clínico, nomeadamente os órgão-em-chip.

Estes chips, do tamanho de um disco USB e produzidos num tipo de silicone biocompatível, “permitem recriar com detalhe o microambiente de um tecido ou órgão num contexto laboratorial, replicando não só a arquitetura, mas também as condições dinâmicas do órgão. Além disso, é possível combinar estes dispositivos com células provenientes de doentes, o que permite uma abordagem única num contexto de medicina personalizada”, esclarece Daniel Ferreira.

Daniel Ferreira é estudante do Programa Doutoral BiotechHealth, do ICBAS, e desenvolveu o seu trabalho no grupo Biofabrication do i3S. (Foto: DR)

Apesar das inúmeras vantagens dos sistemas órgão-em-chip, a sua fabricação é um processo complexo que requer equipamento especializado e vários dias de execução. Nesse sentido, a procura por novos métodos de fabricação que possam reduzir o tempo necessário da conceção até ao protótipo final, tem sido uma prioridade.

Utilizando um modelo biológico da mucosa gástrica, continua o investigador, “demonstrámos que os dispositivos produzidos por esta técnica são biocompatíveis e permitem replicar a arquitetura e condições dinâmicas da mucosa gástrica, num contexto in vitro. Pela sua modularidade, baixo custo e facilidade de execução, este método é uma alternativa interessante aos métodos de fabrico convencionais”.

Este trabalho é o culminar de um longo processo de desenvolvimento decorrente do projeto de tese do estudante, que contou ainda com a supervisão de Carla Oliveira (i3S) e João Pedro Conde (IST) e com a colaboração de Peter Ertl (TU Wien).