Medicina personalizada para tratamento de cancros gastrointestinais, tratamento da dor óssea e estudo dos glicanos nos processos de progressão e proliferação tumoral são os temas dos três projetos europeus em que o Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S) participa e que foram recentemente financiados pelo programa da União Europeia Marie Skłodowska-Curie Actions (MSCA), que visa promover a excelência de investigação e a formação graduada e pós-graduada de investigadores.

Estes projetos perfazem cerca de um milhão de euros para o i3S e permitirão aos seus coordenadores, Celso Reis, Cristina Barrias e Meriem Lamghari, selecionar quatro estudantes não-residentes em Portugal, que serão depois inscritos na Universidade do Porto. Durante um período de três anos, haverá uma rotatividade dos locais de formação o que significa que as equipas do i3S vão receber e formar estudantes dos restantes parceiros dos respetivos consórcios e os seus estudantes irão também fazer farte do seu doutoramento em instituições parceiras.

Modelos in vitro que mimetizam órgãos humanos

O projeto europeu TOP-GUT pretende formar estudantes de doutoramento na área de modelos pré-clínicos inovadores para o avanço da medicina personalizada em cancros do trato gastrointestinal. O projeto envolve oito parceiros, incluindo seis académicos, e conta com a participação portuguesa dos investigadores do i3S Celso Reis, líder do grupo «Glycobiology in Cancer» e Cristina Barrias, que lidera o grupo «Bioengineered 3D Microenvironments».

«Vamos fazer novos modelos in vitro capazes de mimetizar órgãos humanos do trato gastrointestinal e desenvolver novas ferramentas e protocolos para criar modelos gastrointestinais mais complexos, nomeadamente utilizando tecnologia avançada de “organ-on-chip”. Isto significa que teremos novos modelos para medicina personalizada usando organoides derivados de doentes», explica Celso Reis.

No i3S, o aluno de doutoramento sob orientação das investigadoras Cristina Barrias e Marta Silva irá desenvolver uma plataforma de “organ-on-chip” projetada para simular o microambiente in vivo, que será depois usada para investigar o impacto dos componentes do estroma, nomeadamente fibroblastos, microvasculatura e matriz extracelular, no desenvolvimento e função de organoides gástricos e intestinais.

Já o estudante de doutoramento que será orientado por Celso Reis e Filipe Pinto irá desenvolver e caracterizar organoides gástricos humanos para estudar recetores oncogénicos, “imuno checkpoints” e avaliar o impacto da glicosilação nesses alvos através de estudos de glicómica e proteómica. «Serão ainda estudados os efeitos de drogas específicas nos organoides e comparado o seu efeito com o respetivo tumor primário para avaliar o seu impacto na medicina personalizada», sublinha Celso Reis.

Dor músculo-esquelética: avançar para a fase clínica

Liderado por Meriem Lamghari, o BonePain III segue os passos dos seus antecessores, BonePain I e II, que se centraram no estudo da dor músculo-esquelética causada por doenças, como a artrite e o cancro ósseo, e tem como objetivo principal avançar para uma fase mais clínica. Neste projeto, explica a investigadora, «12 parceiros europeus (académicos e da indústria) unem esforços para criar um programa de treino integrado excecional para investigadores em início de carreira com o intuito de aumentar a capacidade de tradução clínica da investigação de dor óssea, a descoberta de medicamentos e fornecer uma nova visão mecanicista e potenciais alvos terapêuticos a uma nova geração de cientistas».

A equipa portuguesa vai desenvolver modelos «organ-on-a chip» totalmente humanizados do microambiente de doença óssea para obter dados clinicamente relevantes. O consórcio, adianta Meriem Lamghari, «pretende identificar novos mecanismos de doença, potenciais alvos de tratamento e explorar a eficácia de terapias em doenças esqueléticas dolorosas, como por exemplo a osteoartrite, artrite reumatoide, cancro ósseo, doença óssea rara ou displasia fibrosa».

«Num extenso esforço de formação que abrange tanto competências de investigação específicas como competências transferíveis, os alunos selecionados obterão uma formação interdisciplinar de excelência e inovadora por parte de todos os parceiros. Os estudantes beneficiarão de formações com parceiros industriais e com alguns dos principais investigadores especializados em dor na Europa», sublinha a investigadora.

Travar as células tumorais «atacando» os glicanos

O projeto europeu GlyCanDrug, por seu lado, centra-se no desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas de precisão direcionadas à glicosilação no cancro. Nesta rede europeia, cuja participação portuguesa é liderada pelo investigador Celso Reis, estão envolvidos nove parceiros europeus, referências na academia e indústria.

Sob orientação dos investigadores Celso Reis, Joana Gomes e Catarina Gomes, serão desenvolvidas estratégias de modulação precisa da expressão de glicanos expressos pelas células tumorais. «O foco estará direcionado para os glicanos mais importantes nos processos de progressão e proliferação tumoral, vamos utilizar inibidores altamente específicos e de ponta que interferem na biossíntese e na interação funcional destes glicanos num contexto biológico», explica Celso Reis.

A equipa pretende ainda desenvolver e avaliar anticorpos direcionados para epítopos de glicanos específicos do cancro. Esta estratégia, assegura o investigador, «irá contribuir para a descoberta e aplicação de novas fórmulas e tratamentos num contexto de medicina de precisão».