Aos 38 anos, João Horta Belo, investigador júnior do Instituto de Física dos Materiais Avançados, Nanotecnologia e Fotónica da Universidade do Porto (IFIMUP) na Faculdade de Ciências (FCUP), lidera um projeto internacional de grande envergadura financiado em 3,7 milhões de euros. O objetivo? Salvar vacinas através de um refrigerador mais eficiente e com menores custos. Tudo graças ao poder do magnetismo: atraiu o interesse deste jovem físico e atrai materiais magnetocalóricos que, por ação da aplicação e remoção de um campo magnético, fazem aquecer e arrefecer um material, de forma mais amiga do ambiente.
Foi uma engenheira química apaixonada pela Física que o motivou a seguir esta área. Com um percurso, na área da Física, todo ele realizado na FCUP, João Horta Belo trilhou o seu caminho à volta do magnetismo. Uma atração que se deu durante o mestrado, numa mobilidade Erasmus na Holanda, que o fez conhecer o magnetismo em detalhe para além dos fenómenos mais básicos que todos experimentámos na infância ao ver um íman atrair um metal.
Ao longo da sua ainda curta, mas bem preenchida, carreira de investigador, João já conseguiu registar uma patente para um efeito magnetocalórico rotativo que torna a refrigeração magnética (mais sustentável), mais próxima da realidade, ajudou a desenvolver e a testar nanopartículas de ouro com potencial no tratamento do cancro e descobriu uma propriedade inédita num material com potencial impacto tecnológico.
Para a saúde, para a tecnologia ou para o ambiente, várias são as aplicações de tanto trabalho realizado na FCUP. Do Porto para o mundo.
Naturalidade? Porto (nasci na freguesia da Vitória).
Idade? 38 anos
– De que mais gosta na Universidade do Porto?
Da capacidade de conjugar o antigo com o moderno – o conhecimento aprofundado com as aplicações mais recentes. Da multidisciplinariedade das disciplinas. Da coragem dos seus investigadores e professores. Da capacidade de atrair alunos brilhantes, trabalhadores e motivados.
– De que menos gosta na Universidade do Porto?
De estar dispersa fisicamente pela cidade – acho que é uma característica que inibe a criação de mais projetos colaborativos dentro da UP. Outro ponto que gostava de realçar é a precariedade dos investigadores (problema que não é só da UP) e a escassez de oportunidades para se fixarem – obviamente, investigadores motivados e com segurança contratual podem contribuir mais e melhor para a investigação e formação na UP.
– Uma ideia para melhorar a Universidade do Porto?
Promover a colaboração entre faculdades e centros de investigação através de programas de incentivo de projetos e/ou orientações de alunos conjuntas.
– Como prefere passar os tempos livres?
Em família ou com os amigos, em jantares, em concertos ou em passeios no parque e na praia.
– Um livro preferido?
“To a God Unknown” do John Steinbeck; “Livro” do José Luís Peixoto
– Um disco/músico preferido?
É uma escolha muito difícil, mas por ambos terem sido muito importantes em diferentes fases da vida, escolheria: “Strange Days” dos The Doors; e “Kind of Blue”, do Miles Davis
E um português “Guitarra Portuguesa” do Carlos Paredes. Também gosto de bandas e músicos mais contemporâneos como os Capitão Fausto, Bruno Pernadas, David Bruno, Manel Cruz.
– Um prato preferido?
Outra difícil! Tenho um gosto bem tradicional que vai do robalo grelhado de Matosinhos à Carne de porco à Alentejana da minha mãe.
– Um filme preferido?
Houve um filme que me marcou muito e que vi num dos auditórios do teatro do Campo Alegre “Sunrise: A Song of Two Humans” do F. W. Murnau. Mas gosto sempre de ver um filme seja em casa ou no cinema, seja mais ou menos comercial. Gosto muito de ir aos festivais de cinema do Porto, seja ao Fantasporto seja ao Queer Film festival.
– Uma viagem de sonho (realizada ou por realizar)?
América do Sul. Gostava de visitar o Brasil, o Chile e a Colômbia.
– Um objetivo de vida?
Ser feliz e proporcionar felicidade e prosperidade à minha família.
– Uma inspiração?
Tenho a sorte de ter tido orientadores que me inspiraram e continuam a inspirar com o Professor André Pereira, o Professor João Pedro Araújo, o Professor João Bessa ou o Dr. João Amaral e o Professor Vítor Amaral. Tenho tido também a sorte de me cruzar com Investigadores internacionais com quem tenho aprendido muito – incluindo o Professor Victorino Franco ou o Professor John Evans.
– O projeto da sua vida…
Profissionalmente, o projeto mais significativo foi mesmo o último a ser aprovado – o MAGCCINE, financiado pelo European Innovation Council, no programa EIC Pathfinder. Este projeto de sete parceiros europeus e outros oito parceiros internacionais (no conselho consultivo) foi financiado com aproximadamente 3.7 milhões de euros e a U.Porto é a entidade coordenadora e eu o investigador principal. Vai ser um grande desafio coordenar este projeto, cujo objetivo final é o de produzir um protótipo de um refrigerador mais eficiente, leve e com menores custos para o transporte e armazenamento de vacinas.
– Como surgiu o gosto pela Física e pelo Magnetismo?
O gosto pela Física no secundário sobretudo instigado pela Professora de… Química – a Professora Alice Cação, uma engenheira química que era fascinada pela Física e que, fora do horário, nos ficava a contar sobre os mistérios da mecânica quântica ou da energia nuclear. O gosto pelo Magnetismo surgiu mais tarde, durante o semestre em Mobilidade ERASMUS que fiz na Radboud Universiteit, em Nijmegen (Holanda) – onde tive a oportunidade de seguir a cadeira de Nanomagnetismo lecionada pelo Professor Andrei Kiriliouk. Esta paixão pelo Magnetismo foi sendo aprofundada ao longo do mestrado onde, durante a tese, tive o primeiro contacto com os materiais magnetocalóricos – materiais onde a grande correlação entre Magnetismo e a Termodinâmica é exemplarmente ilustrada.
Desde os fenómenos mais básicos de atração e repulsão magnética (que todos experienciámos em idades juvenis), aos fenómenos mais complexos e até às mais variadas aplicações tecnológicas, o Magnetismo é uma área fascinante – e que tem e terá um papel decisivo na era de transição energética em que vivemos.
– Uma ideia para promover a investigação da U. Porto a nível internacional?
Tanto quanto me tenho apercebido, a U.Porto tem feito um trajeto crescente em vários dos indicadores usados nos rankings internacionais, revelando que o trabalho realizado tem resultado. É sempre verdade que todos gostaríamos que o impacto internacional da UP fosse maior. Para isso eu julgo que seria interessante criarem-se concursos internos para promover as candidaturas a fundos internacionais (por exemplo aos programas EIC Pathfinder, ERC grants, M-ERA Net, entre outros) – que pudessem não só prestar apoio à preparação destas candidaturas, como também financiar estudos preliminares – prática comum em outros países, mas também em outras instituições em Portugal.
Julgo que também é importante sabermos “vender” o que fazemos de forma mais eficaz internacionalmente – isto é, comunicar os nossos destaques de forma mais eficiente em meios internacionais.
Por fim, parece-me que também seria importante aumentarmos o número de pessoas em cargos de associações científicas e de engenharia, onde muitas vezes se tomam decisões sobre que tópicos devem ser mais financiados e que assim impactam (e moldam) a direção de áreas cientificas. Estas são sempre ideias muito discutidas e na verdade não creio que medidas isoladas possam ter um impacto significativo – será necessário um plano de internacionalização com medidas integradas e complementares.