Daniel Serrão (Fotos: Egídio Santos)

“Pai” da bioética em Portugal, médico e investigador reconhecido internacionalmente, pedagogo de excelência, mas, acima de tudo, um humanista convicto. Os epítetos são muitos e, em conjunto, ajudam a construir o legado deixado por Daniel Serrão, antigo estudante e professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) falecido este domingo, aos 88 anos de idade.

Natural de Vila Real mas portuense “por opção”, Daniel Serrão (1924-2017) licenciou-se com distinção na FMUP em 1951. Nos corredores do antigo edifício de Medicina no Largo Abel Salazar aprendeu a lição que o acompanharia para o resto da vida. “Foi nesta experiência que se enraizou em mim a convicção de que nenhuma dificuldade pode ser superior à nossa vontade de a vencer. Máxima a que continuo fiel e, quase sempre, com sucesso. Sei que não vencerei a morte mas estar vivo não é uma dificuldade, é um privilégio”, dizia em 2011 a propósito das comemorações do Centenário da U.Porto.

Um ano após concluir o curso, Daniel Serrão iniciou a sua carreira de docente na FMUP, à qual virá a dedicar a maior parte do seu tempo (até 2005), muito para além da sua jubilação, em março de 1998. Ali, viria a afirmar-se como um dos professores de maior destaque da instituição, quer pela sua obra científica, quer pela sua vasta intervenção pública em prol dos valores humanistas. O seu trabalho científico nas áreas da patologia Anatómica, e posteriormente, da Bioética é, aliás, justamente reconhecido internacionalmente, tendo sido um dos primeiros professores de Medicina em Portugal a dedicar-se ao debate em torno das questões éticas da profissão.

Doutorado em Anatomopatologia pela FMUP (1959), notabilizou-se, também, como autor de centenas de publicações e especialista internacionalmente reconhecido nos domínios da patologia hepática, regeneração do fígado, biopsia renal, oncologia. Em 1975, ano em que é demitido das suas funções na FMUP na sequência do processo revolucionário (regressaria um ano mais tarde), fundou e dirigiu o seu laboratório de Anatomia Patológica, que viria a realizra mais de 1,6 milhões de exames histológicos e citológicos até 2002.

Daniel Serrão fez parte de diversas organizações de referência no campo da ética médica e da bioética , como o Comité Internacional de Bioética da UNESCO, o Comité Diretor de Bioética do Conselho da Europa ou o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida. Em 1994, viu reconhecidos os seus méritos nestas temáticas com a nomeação, pelo Papa João Paulo II, como membro e consultor da Academia Pontifícia para a Vida.

Entre as distinções que somou ao longo da vida incluem-se o Prémio Pfizer (três vezes), a Medalha de Mérito da Ordem dos Médicos, o Prémio Nacional de Saúde,a  Medalha de Serviços Distintos do Ministério da Saúde (grau ouro), a Medalha de Mérito Militar do Ministério da Defesa ou a Medalha de Ouro da Cidade do Porto. Em 2008, foi agraciado com a Grã-Cruz da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada.[4]

“O nome do Prof. Doutor Daniel Serrão ficará para sempre ligado à formação de brilhantes gerações de médicos e investigadores científicos na Universidade do Porto. Mas será, porventura, o seu humanismo, a sua humildade e a sua relação de proximidade com estudantes e colegas pelo qual mais será recordado na nossa comunidade académica”, recorda Sebastião Feyo de Azevedo, Reitor da U.Porto.

“O seu desaparecimento seria, por isso, uma perda irreparável para a Universidade do Porto, em particular para a sua Faculdade de Medicina, não fosse o facto do Prof. Daniel Serrão ter deixado um legado perene em toda a academia”, acrescenta.

A morte de Daniel Serrão aconteceu na madrugada deste domingo, na sequência dos problemas de saúde que o afetaram desde o atropelamento que sofreu, há mais de dois anos. O funeral realiza-se na segunda-feira pelas 09h45, saindo da Igreja da Lapa.