Estaremos a medir corretamente a temperatura corporal em tempo de pandemia, onde o recurso aos termómetros digitais é uma realidade? O alerta é dado por Joaquim Gabriel Mendes, investigador da Faculdade de Engenharia da U.Porto (FEUP), que admite a necessidade de se apostar noutras tecnologias já disponíveis e validadas cientificamente, capazes de atestar com rigor a temperatura corporal.

Dado que a temperatura superficial da pele é naturalmente afetada pelo ambiente – pela temperatura, sol, vento, humidade – a recomendação é que o local a usar na medição tenha uma correspondência direta com os vasos sanguíneos superficiais, em particular as artérias, ou ser cavidades naturais e, portanto, locais mais protegidos.

“Para efeitos do controlo da pandemia, naturalmente que a medição sem contacto é preferível, limitando assim a escolha à zona das têmporas e do canto do olho. Contudo, a prática habitual mostra que a medição da temperatura está a ser feita na testa, que é uma zona sem irrigação direta”, alerta Joaquim Gabriel Mendes.

De acordo com o investigador da FEUP, a termografia infravermelho é a melhor opção na medição da temperatura sem contacto, podendo ser aplicada na medição pontual (termómetros infravermelhos) ou abranger uma determinada área (termografia).

“No caso da termografia, a temperatura deve medir-se no canto do olho, e assim, a câmara deve ter resolução suficiente para efetuar no mínimo três medições nessa zona de modo a minimizar o erro. Uma boa câmara terá capacidade de medição de cerca de 0,5 m. Isto significa que, em caso algum, é possível medir a temperatura de um grupo de pessoas, mas pelo contrário a temperatura deve ser medida individualmente”, assegura o investigador da FEUP.

Outra vantagem da termografia coloca-se ao nível do tempo de medição, bastante mais reduzido que outros métodos. “tipicamente de 0,02 s e a fiabilidade da medição é bem maior”, acrescenta.

O método ideal em tempos de pandemia?

Medir a temperatura em certas zonas do corpo como o ouvido, boca, região das axilas, ou ânus é, de há muitos anos, um hábito comum. Mas em contexto de pandemia, estes métodos não podem ser aplicados no rastreio da temperatura em massa.

Ao contrário do que se tem vindo a fazer, defende Joaquim Gabriel Mendes, o local de eleição para o registo da temperatura quando utilizamos uma câmara termográfica deveria ser o canto interno do olho, “por ter a artéria que passa próximo do centro regulador da temperatura corporal do indivíduo”.

No contexto do coronavírus SARS-CoV2, tal como nas situações anteriores do SARS-CoV, e MERS, a termografia médica surge assim como a técnica de eleição para a medição da febre, “especialmente pela capacidade de medir a temperatura de um individuo a distância”.

Foi, de resto, a pensar nestas questões, que a Faculdade de Engenharia montou recentemente, junto à entrada da faculdade, uma câmara termográfica para medição da temperatura corporal. A ideia é que todas as pessoas interessados possam rastrear a temperatura de forma rápida e bastante fiável.

Uma área científica em expansão

Professor do Departamento de Engenharia Mecânica da FEUP, Joaquim Gabriel Mendes tem-se dedicado desde há vários anos à utilização da termografia como meio complementar de diagnóstico e terapêutico em diferentes áreas da saúde.

Desde 2006 que tem vindo a trabalhar de perto com Pedro Amorim, médico do Hospital de Santo António (Centro Hospitalar do Porto), na monitorização da anestesia em pacientes com recurso à termografia. Esta colaboração permitiu abrir portas em outras unidades hospitalares, faculdades interessadas em contribuir para o aprofundamento do tema, tendo originado teses de doutoramento e mestrado e diversos artigos científicos na área das ciências da saúde.

Particularmente relevante tem sido a colaboração com Miguel Pais Clemente, professor da Faculdade de Medicina da U.Porto (FMUP) no estudo das lesões dos músicos, Disfunção Temporomandibular (DTM) e dor usando a termografia, e com quem editou, com o apoio da Bial, o livro “Termografia – Imagem Médica e Sindromes Dolorosas”.

O reconhecimento internacional da FEUP na área da termografia traduziu-se igualmente, no último ano, no estágio de 6 meses de Wally auf der Strasse, estudante de doutoramento da UTFPR (Brasil), e no trabalho de Isobel Taylor (UK), estudante de doutoramento em design a terminar o seu estudo na Síndrome de Raynaud, em colaboração com o Hospital de Santo António.