Celebram-se esta terça-feira 13 de abril, os 30 anos sobre o arranque da coleção de cianobactérias e microalgas LEGE-CC do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental da Universidade do Porto, uma iniciativa pioneira que reúne atualmente cerca de 1200 exemplares de cianobactérias e microalgas, constituindo-se como uma autêntica biblioteca de organismos marinhos e de água doce.

Foi com o objetivo de obter estirpes nacionais de cianobactérias tóxicas, em especial da espécie Microcystis aeruginosa (a cianobactéria mais comum e produtora das hepatotoxinas), para usar em ensaios de ecotoxicidade durante o seu doutoramento, que o o atual diretor do CIIMAR e  professor da Faculdade Ciências da Universidade do Porto, Vítor Vasconcelos começou, em 1990, aquilo que hoje se tornou na coleção LEGE-CC.

Naquela altura, a única coleção nacional, a Algoteca de Coimbra (ACOI) tinha lacunas nesta espécie e os investigadores tinham de fazer uso de estirpes compradas a instituições internacionais.

As primeiras amostras

Foi no âmbito de um projeto de caracterização ecológica das lagoas de Mira para avaliação dos efeitos de cianobactérias tóxicas que Vítor Vasconcelos iniciou uma série de amostragens que deram origem aos três primeiros isolados pertencentes à espécie Microcystis aeruginosa, ainda existentes na coleção.

Entre 1991 e 1994, período em que decorreu o projeto, o investigador isolou 44 estirpes desta espécie em vários locais em Portugal, e constituiu aquilo a que chama o “embrião da LEGE-CC”. Também em 1994, é publicado o primeiro artigo com base na coleção.

Os trabalhos realizados conduziram a um plano nacional de monitorização de cianobactérias e suas toxinas em 1996 coordenado pela Direção Geral de saúde e o então Instituto de Água que levou à legislação de parâmetros de qualidade da água associados às cianobactérias e toxinas em Portugal. Depois de 2000, a coleção começou a diversificar-se com trabalhos de mestrado e doutoramento de colaboradores. Ao mesmo tempo, multiplicam-se as aplicações da LEGE-CC. Em 2005, havia já uma equipa trabalho conducente à aplicação biotecnológica das cianobactérias que publica os primeiros artigos nessa temática em 2008.

Em 2015, a coleção LEGE_CC – Blue Biotechnology and Ecotoxicology Culture Collection foi registada no World Federation of Culture Collections (WFCC) e, em 2018, na European Culture Collections Organization (ECCO). 

A LEGE-CC hoje

Atualmente, a coleção conta com infraestruras na sede do CIIMAR no terminal de cruzeiros que incluem uma sala de isolamento, duas salas de coleção, uma sala de cultivo, câmaras de incubação e 10 fotobiorectores que permitem otimizar as condições de cultivo.

Cerca de 93% das estirpes hoje depositadas na coleção são de origem nacional (Portugal Continental, Açores e Madeira), sendo as restantes de todos os continentes que resultaram de colaborações internacionais como os projetos FARCYANO (Republica Dominicana), EMERTOX (Portugal, Cabo Verde, Marrocos) e TOXICROP (Portugal, Colômbia, Peru, Egipto, Marrocos, Tunísia).

Embora inicialmente as amostras se focassem sobretudo em ambientes dulçaquícolas, desde 2005 que abrangem ambientes muito diversos que vão desde o mar, os estuários, grutas, fontes termais e até à Antártida.

O potencial biotecnológico

Mais do que uma mera coleção, é o potencial biotecnológico da LEGE-CC que a torna ainda mais especial como fonte de recurso para aplicações farmacêuticas, alimentação humana e nutraceutica, cosmética, agricultura ou mesmo a indústria naval.

Entre as aplicações estudadas incluise o tratamento de infeções microbianas, cancro, parasitoses como a malária, obesidade, doenças cardiovasculares e doenças neurológicas; incorporação em suplementos alimentares, corantes, estabilizantes, peliculas protetoras ou suplementação em rações animais; aplicação na cosmética anti-ageing, protectores solares, cicatrizantes; como biofertilizantes, bioestimulantes, bioproteção; e na integração de tintas anti-incrustantes ou em biofuel.

No CIIMAR, são já inúmeros os projetos a trabalhar nas diferentes aplicações das estirpes da LEGE-CC Dos projetos já concluídos resultou o registo de quatro patentes, incluindo compostos naturais anti-malária ou compostos para protecção UV a aplicar, por exemplo, em cosméticos.

Três décadas após o seu início, a colecção LEGE-CC é hoje reconhecida a nível mundial através das plataformas EMBRC – European Marine Biological Resource Centre, do MIRRI – Microbial Resource Research Infrastructure e do EU-OPENSCREEN – European Infrastructure of Open Screening Platforms for Chemical Biology.

Através destas plataformas a colecção está acessível para investigadores em todo o mundo possibilitando maximização do seu potencial na investigação de novos produtos de origem natural.