O grupo de trabalho criado pelo Governo português para a elaboração de uma proposta de Plano Operacional para a Saúde em Contexto de Privação da Liberdade, do qual fez parte o Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), enquanto Centro Colaborador da Organização Mundial da Saúde (OMS), apresentou este fim de semana o documento final que propõe a integração da saúde prisional no Serviço Nacional de Saúde, através da transição faseada de competências da Justiça para a Saúde.

A equipa, que envolveu, além do ISPUP, peritos de diferentes organismos das áreas da Saúde, da Justiça e da Ciência, apresentou o relatório final ao Governo, propondo uma alteração do modelo de governação da prestação de cuidados de saúde em meio prisional. O documento, tornado público a 30 de março no portal do SNS, constitui uma base de intervenção neste contexto, defendendo a transferência da tutela dos cuidados de saúde prisionais para o Ministério da Saúde e, consequentemente, a integração da saúde prisional no Serviço Nacional de Saúde, tendo por base territorial – na atual organização da prestação de cuidados de saúde – a Unidade Local de Saúde a que pertence o Estabelecimento Prisional.

O grupo de trabalho propõe ainda uma transição faseada de competências do Ministério da Justiça para o Ministério da Saúde, associada a uma monitorização contínua que tenha por base indicadores que permitam avaliar o custo-efetividade da alteração da governação. Este processo deverá envolver uma equipa multidisciplinar, na qual se incluam profissionais de entidades relevantes da saúde, justiça, ciência, trabalho e segurança social.

Para a equipa responsável, o Plano para a Saúde em Contexto de Privação da Liberdade 2023-2030 constitui uma ferramenta essencial de saúde pública, que servirá os direitos e a dignidade tanto da população em reclusão, quanto da comunidade de onde ela provém e para a qual voltará.

Garantir a continuidade do acompanhamento de saúde

O relatório destaca que uma continuidade entre o acompanhamento de saúde em meio livre e em meio prisional permitiria melhorar o seguimento de condições crónicas, reduzir custos com novos exames, reduzir a possibilidade de desenvolver resistências a medicamentos e reduzir perdas de seguimento e até reincidência criminal.

A proposta de Plano assenta em seis eixos estratégicos, designadamente a proteção e promoção da saúde; a prevenção da doença; o acesso, retenção e continuidade de cuidados de saúde; a reintegração social; os sistemas de informação e tecnologia e a componente de investigação. Para cada um destes eixos é apresentado um conjunto de medidas intersetoriais, com vista à melhoria dos indicadores de saúde e integração psicossocial.

Entre as medidas, destaca-se a relevância de o Plano Individual de Readaptação do Indivíduo sujeito a privação da liberdade conter uma avaliação personalizada das suas necessidades de saúde, realizada pelos serviços clínicos. Garante-se o acesso a rastreios oncológicos e de doenças transmissíveis, a implementação do programa de vacinação, bem como de medidas de promoção da saúde e na área da saúde mental.

Propõe-se ainda que cada Estabelecimento Prisional, pela excelência das suas práticas, possa ser reconhecido como Estabelecimento Prisional promotor de um ambiente saudável.

O grupo de trabalho foi designado pelos Gabinetes da Ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, do Secretário de Estado Adjunto e da Justiça e da Secretária de Estado da Promoção da Saúde na sequência da organização em Portugal de uma conferência da Organização Mundial de Saúde para apresentação do primeiro relatório europeu sobre o estado da saúde nas prisões. Nesta conferência internacional, que teve lugar em Lisboa e no Porto em fevereiro de 2023, foi reiterado o compromisso nacional com o desenvolvimento de políticas de saúde transversais a toda a população, nomeadamente nos contextos de maior vulnerabilidade, que garantam o respeito pelos direitos humanos e pelo acesso à saúde ao longo de todas as fases da vida.