O telescópio ótico do Observatório Astronómico Professor Manuel de Barros, património da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP), vai ter uma nova casa a partir de 2022. Depois de ajudarem na certificação do céu na Pampilhosa da Serra, investigadores da FCUP querem levar alguns dos seus equipamentos para este local com o objetivo de monitorizar o céu em tempo real.
O propósito é também “varrer o céu” em busca de objetos novos, algo que se consegue fazer com telescópios mais pequenos. Ainda que seja o maior em Portugal, o facto é que é pequeno quando comparado com os do Chile e tem as suas vantagens. “Percorrem as áreas grandes do céu e podemos descobrir supernovas, asteroides, ou cometas que não se conheciam”, explica Dalmiro Maia, docente do Departamento de Geociências, Ambiente e Ordenamento do Território (DGAOT) da FCUP. A ideia é, entre 2022 e 2025, criar uma base de dados e poder fornecer dados à ciência.
“Se for descoberto um objeto novo, podemos avisar colegas da Astronomia, que podem recorrer aos telescópios como os do Chile para ver em detalhe”, acrescenta o investigador
De olhos postos no Sol
Para além do telescópio, o Observatório da FCUP quer levar também o seu radiotelescópio solar, o primeiro a ser desenvolvido em Portugal em 1979 pelo engenheiro António Magalhães, para a Pampilhosa da Serra.
“Este equipamento observa o sol doze horas por dia e permite-nos estudar fenómenos como explosões solares com algum detalhe”, descreve Dalmiro Maia, cujo trabalho se foca na área da física solar. É que a radiação e as fortes emissões rádio provenientes do Sol podem mesmo causar danos no espaço, como afetar satélites como o GPS ou ondas de rádio. A este estudo dos efeitos do sol dá-se o nome de meteorologia do espaço.
Atualmente, não há nenhum programa em Portugal dedicado a este estudo ou à monitorização de objetos potencialmente perigosos, como asteroides. Apenas existe o programa nacional de rastreio de Lixo Espacial, com um Centro de Operações Espaciais, recentemente inaugurado nos Açores. Estes três parâmetros fazem parte da Avaliação de Situação Espacial (SSA) e estão nos planos da equipa da FCUP.
O objetivo é fazer uma série de testes-piloto com estes equipamentos na Pampilhosa da Serra. Com esse propósito, os investigadores estão já a fazer uma proposta para colocar a cúpula e para os instalar.
Porquê a Pampilhosa da Serra?
“Contactaram-nos, por parte da Comunidade Intermunicipal da Região de Coimbra para um estudo de avaliação do nível de poluição luminosa no céu de Coimbra para fins de interesse turístico”, conta o docente da FCUP. Através de técnicas de deteção remota, fizeram, em 2017, a classificação das zonas tendo por base um conjunto de parâmetros: brilho do céu, dias de céu sem nuvens, quantidade de aerossóis (poeiras que absorvem luz e impedem a observação). “As aldeias do Xisto cumpriam todos esses critérios”.
O facto de ser uma zona de céu limpo agradou aos investigadores, que viram uma oportunidade para colocar o equipamento do Observatório e outros equipamentos novos naquela região.
“As pessoas estão muito sensíveis à poluição luminosa, mas também existe a poluição radioelétrica”, diz Dalmiro Maia, explicando que este é o local ideal, pelo facto de ser uma zona mais isolada entre montanhas e vales.
Monitorizar o lixo espacial em órbita alta
Com este trabalho, o investigador acredita que a Universidade do Porto pode dar contributos importantes para o primeiro programa de Avaliação de Situação Espacial (SSA, na sigla em inglês) no nosso país. Esta é a vontade da equipa do projeto europeu Engage SKA, que conta com a participação da FCUP, do Instituto de Telecomunicações, da Universidade de Évora, da Universidade de Coimbra e do Instituto Politécnico de Beja.
Para além disso, os cientistas têm também uma ambição na área do lixo espacial. “Nós queremos também monitorizar objetos em órbita alta (órbita na qual os objetos estão parados quando vistos do solo), usando telescópios maiores”, explica.
Segundo Dalmiro Maia, esta seria uma iniciativa pioneira em Portugal. Aqui entraria em ação o telescópio do Observatório Prof. Manuel de Barros que possui um espelho de 30 polegadas.
“O lixo espacial é muito preocupante porque as órbitas onde nós colocamos os satélites, neste caso a órbita geoestacionária, são recursos e temos de ter a certeza que esses recursos estão disponíveis”. Entre o lixo espacial podem estar, por exemplo, pequenos fragmentos de tinta, bocados de satélites, partes dos lançadores, ou até mesmo satélites que deixaram de funcionar. E basta um pequeno detrito para desativar um satélite.
O Engage SKA, financiado pelo Roteiro das Infraestruturas de Investigação, que teve início em 2017, entrará numa nova fase em 2022.