Um estudo inovador, focado na ação de uma proteína nas células estaminais do intestino, e desenvolvido por investigadores do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S), merece honras de capa na última edição da EMBO Reports, uma das mais conceituadas revistas científicas do mundo no domínio da biologia molecular.
Os investigadores do i3S descobriram que a proteína designada MEX3A é importante para a identidade das células estaminais intestinais, as responsáveis pela contínua renovação do tecido num intestino saudável. A equipa está agora a tentar perceber quais as implicações desta proteína no cancro do cólon e na sua progressão.
“Esta proteína era conhecida, mas muito pouco estudada. Sabíamos, até pelo trabalho que desenvolvemos anteriormente, que a MEX3A funciona na regulação do ARN, um outro nível de transmissão de informação dentro da célula após a leitura do ADN. Agora, conseguimos demonstrar o papel fundamental de uma proteína deste tipo nas células estaminais do intestino”, explica Raquel Almeida, última autora do artigo e líder do grupo de investigação «Differentiation and Cancer».
Raquel Almeida, que é também professora auxiliar convidada do Departamento de Biologia da Faculdade de Ciências da U.Porto, acrescenta que “o nosso trabalho mostra que este tipo de regulação ao nível do ARN é muito relevante, mas ainda pouco estudado, sobretudo em doenças como o cancro.”
Um modelo inovador
Como explica Bruno Pereira, primeiro autor do artigo e investigador CEEC-FCT no mesmo grupo, o trabalho agora publicado estabelece “o primeiro modelo animal sem essa proteína”, tendo-se verificado que “as células estaminais intestinais acabam por se extinguir ao fim de duas a três semanas. Como consequência, o epitélio intestinal torna-se anormal, comprometendo a função de absorção de nutrientes, por exemplo”.
Por outro lado, aponta o investigador, “existem evidências de que estas células estaminais ao sofrer mutações podem dar origem a tumores intestinais. Sabendo que a proteína MEX3A controla a identidade destas células, estamos agora a investigar o papel específico da proteína no processo de desenvolvimento tumoral”.
Este é também dos primeiros artigos científicos a nível nacional com recurso a culturas celulares 3D avançadas de organóides intestinais (uma versão miniatura do órgão, mas fisiologicamente idêntica), uma forma de “tentar reduzir a experimentação animal”, sublinha Raquel Almeida.
“É um modelo biológico com potencial de aplicação na área da medicina regenerativa. Os conhecimentos que adquirimos através da cultura de organóides são um marco importante para a estratégia científica a longo prazo do grupo e do i3S.”, acrescenta Bruno Pereira.