Bruno sempre se preocupou com os outros. De resto, a escolha da Licenciatura em Criminologia da Faculdade de Direito da Universidade do Porto (FDUP) – onde entrou em 2010 – estará ligada à dedicação que teve desde sempre a projetos de intervenção cívica e social. Hoje, está em Londres, a trabalhar na área de prevenção de crime com crianças e jovens na Victim Support UK, uma instituição que presta apoio a vítimas e testemunhas de crimes.
Ainda no ensino secundário, Bruno participou no projeto do Parlamento Europeu dos Jovens (EYP), onde se manteve até há pouco tempo. Aqui, desenvolveu um projeto adaptado a menores institucionalizados no Porto, que também contou com o apoio da Universidade do Porto. Depois da licenciatura e de uma pós-graduação, partiu para a Holanda, onde frequentou o Mestrado em Vitimologia e Justiça Criminal, na Universidade de Tilburg. Há um ano, mudou-se novamente. Está agora em Londres, a trabalhar na área que sempre quis.
Como surgiu a oportunidade de ir para Londres?
Encontrei uma vaga para um projeto nesta organização (Victim Support UK) para fazer trabalho de campo em prevenção de crime e vitimação com Crianças e Jovens e, após candidatar-me, consegui o emprego. Após esse projeto de prevenção ter terminado, acabei por continuar na organização na área de triagem de casos.
O que te levou a ir para fora?
Por um lado, o facto de em Portugal ainda não se reconhecer o total potencial da Criminologia e Vitimologia e o impacto direto que isto tem nas oportunidade de emprego e de desenvolvimento pessoal. A profissão de Criminólogo, por exemplo, só se viu reconhecida já eu não estava no país e isto alia-se ao facto de os serviços onde nós podemos ser úteis (ironicamente aqueles onde estagiamos) estarem construídos para receber Psicólogos ou Assistentes Sociais por exemplo, mas não criminólogos.
Existem barreiras à nossa integração ou vê-se a nossa área como uma duplicação de serviços. Isto já está a mudar e tenho colegas que estão agora empregados na área mas ainda há trabalho a ser feito para realmente usufruir de todos os benefícios que uma educação multidisciplinar como a nossa pode dar a diferentes serviços relacionados com o comportamento criminal ou o apoio à vítima.
Por outro lado, também reconheço que não quis ficar preso a Portugal e sempre acreditei no projeto Europeu, o que me levou a não ver a fronteira como um impedimento mas como uma ponte para beber de outras culturas e aprender em outros países. Isto para que no futuro possa voltar a Portugal e trabalhar na minha área, muito mais realizado e consciente do trabalho prático que posso desenvolver.
Há quanto tempo estás fora de Portugal?
Fui estudar para fora em 2017 e voltei a Portugal por um período de tempo e mudei-me para Londres em novembro de 2018.
Como foi a adaptação?
Não foi fácil, e a verdade é que achava que ia conseguir lidar melhor com este processo, mas qualquer decisão teria obstáculos e acho que isso faz parte.
A minha vinda para Londres é muito recente e ainda me estou a tentar adaptar a viver uma vida plena aqui, mas acima de tudo sinto-me realizado por estar a conseguir trabalhar na área em que investi tanto tempo a estudar. Mudar-me sozinho para a Holanda e depois para Inglaterra e estar em constante mudança à procura de algo que faça sentido tem obviamente as suas dificuldades mas não posso deixar de estar grato pelas oportunidades que tive. Tento sempre ver as coisas pelo seu lado positivo, mas também procuro sempre melhorar e estar em constante processo de mudança e desenvolvimento para que possa ser útil e a ajudar a criar mudança num projeto em que acredito.
De que mais gostas? E menos?
O que gosto mais é de sentir que tenho um lugar à mesa… Que a minha área e o conhecimento que tenho vindo a nutrir desde que entrei na U.Porto é aceite como tão útil quanto eu sei que ele pode ser. O investimento nas Ciências Sociais e o trabalho multidisciplinar já está enraizado na cultura dos países por onde passei e isso é uma realidade totalmente diferente daquela que tive em Portugal. Quando saí do país, acho que não tinha noção de tudo aquilo que era capaz de fazer com um curso de Criminologia porque as saídas profissionais eram muito menores, em quantidade mas também na sua variedade. Em Londres, o facto de eu ser criminólogo é visto como uma mais-valia numa entrevista de emprego, e isto é algo que me motiva a dar mais à organização que me contrata e me permite crescer dentro da mesma.
O que gosto menos é obviamente o isolamento das pessoas com quem cresci e com quem estudei, mas também o sentimento de que não estou a contribuir para o desenvolvimento do meu próprio país, algo que espero poder mudar no futuro. O tipo de visão social que alguém da minha área tem permite contribuir, de forma efetiva, para a redução de maus tratos infantis, um melhor serviço prestado a vítimas de violência doméstica e até uma reflexão sobre como melhorar o nosso sistema de Justiça, seja no que diz respeito à delinquência juvenil ou à sobrelotação dos Tribunais por via de litígio… mas tudo isto e muito mais só é possível se o espaço para este contributo for criado, mas mais importante ainda, aceite.
Principais experiências a nível profissional e pessoal?
Estou muito contente com a minha evolução profissional aqui. Primeiro, já recebi bastante formação e treino para complementar o conhecimento teórico que tenho dos estudos universitários. A nível de cargos, comecei por desempenhar um cargo em que fazia trabalho de campo numa área específica de Londres onde fiz trabalho de prevenção, levando debates e curtas intervenções a crianças e jovens sobre vários temas, por exemplo Crimes de Ódio, Violência Sexual ou até Desenvolvimento Pessoal de Resiliência. Este trabalho foi, para mim, fulcral para perceber como é que o conhecimento que obtive na U.Porto pode ter impacto direto em reduzir as chances de jovens serem vitimas ou ofensores de crimes.
Atualmente, integro a Equipa de Triagem, também no serviço de Crianças e Jovens onde lido, diretamente, com jovens vítimas de diversos tipos de crimes e onde presto apoio emocional e apoio prático antes de passar os casos para os Gestores de Casos. Daqui a um mês, vou integrar uma equipa de Gestores de Casos Complexos no Serviço de Adultos onde vou cumprir um dos meus grandes objetivos: prestar apoio direto a vítimas individuais e acompanhá-las durante todo o processo de lidar e ultrapassar a experiência de vitimação. O facto de em apenas um ano ter conseguido trabalhar em três cargos e conseguir aprender tanto em cada um deles, tem sido, para mim, uma prova de que tomei a decisão certa, principalmente pelo nível acrescido de responsabilidade que me está a ser confiado.
A nível pessoal, tenho estado ligado a projetos de voluntariado. Faço parte de um grupo que tenta criar uma comunidade em Londres como “Informada em Trauma” (Trauma-Informed Communities), um paradigma que espero que chegue a Portugal. O objetivo é perceber o comportamento ou a comunicação e entender as raízes do desvio ou mesmo de doença mental e física como decorrente de trauma, o que leva a pedir uma melhor intervenção com crianças e jovens que possam estar expostos a eventos traumáticos ou de vitimação. Este tipo de projeto tem tido resultados fantásticos em cidades americanas e no País de Gales. Estou a aprender muito para poder ajudar a criar mudança efetiva, não a nível individual, mas a um nível macro, de uma comunidade inteira e de um grupo inteiro de profissionais.
De que sentes mais falta? Pensas voltar a Portugal?
Sim penso voltar. O meu objetivo sempre for adquirir conhecimento e aprender mais sobre como usar a Criminologia de forma prática, para que possa voltar a Portugal e usar todas estas ferramentas e habilidades no meu próprio país. Este pensamento pode mudar, ou não, mas valorizo muito a minha família e as relações pessoais que construí ao longo da minha vida “por aí” e, até agora, sempre vi esta migração como algo temporário.