E se a luz emitida por organismos marinhos puder ser a chave para atacar as células cancerígenas? Uma equipa de investigadores da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) está a inspirar-se nestes animais para criar novas moléculas com capacidade para destruir tumores.

“A Coelenterazina faz com que esses organismos emitam luz num processo semelhante ao que estamos mais habituados a ver em pirilampos, devido a uma reação química em que a energia é produzida na forma de luz”, explica Luís Pinto da Silva, investigador no Departamento de Geociências, Ambiente e Ordenamento do Território (DGAOT), na FCUP e no Centro de Investigação em Química da Universidade do Porto (CIQUP).

Os investigadores modificaram a Coelenterazina, natural e não tóxica, produzida atualmente em laboratório, para funcionar como fármaco. “Em vez de gerar luz, esta reação química traduz-se em espécies reativas de oxigénio responsáveis por destruir tumores”, acrescenta o investigador. Este potencial fármaco já mostrou bons resultados em ensaios laboratoriais na Faculdade de Farmácia da U.Porto (FFUP) com células tumorais de neuroblastoma, cancro da mama, da próstata e do cólon.

O que vai fazer esta molécula modificada nas células? Estas moléculas ativam-se quando em contacto com marcadores tumorais, como por exemplo o anião superóxido, um oxidante com uma forte expressão nas células cancerígenas. Em reação química é produzido o oxigénio singleto, mais forte do que o anião superóxido e que vai destruir o tumor.

Joaquim Esteves da Silva e Luís Pinto da Silva são os investigadores da FCUP que lideram o projeto Chemi-Tumor. (Foto: FCUP)

Tornar a terapia fotodinâmica acessível a mais pacientes

Os cientistas da FCUP acreditam que, desta forma, será possível superar as limitações da terapia fotodinâmica (PDT), um processo não invasivo que elimina células doentes através de luz de baixa intensidade.

Tradicionalmente, na PDT, só é possível tratar pequenos tumores localizados e muito próximos da superfície da pele, porque a luz ultravioleta só pode penetrar até um centímetro de pele. “Como a luz só pode ser usada à superfície, não dá para casos de cancros mais avançados e metastizados”, explica Joaquim Esteves da Silva, docente e investigador do DGAOT. Desta forma, esta terapia poderá ficar acessível a um maior número de pacientes com cancro.

O projeto “Chemi-Tumor”, que contou com o apoio do programa HiTech One, da HiSeedTech,  foi recentemente financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia para os próximos três anos e há também um pedido de patente em análise.

Depois de terem concluído com sucesso os primeiros passos – design e síntese das moléculas e avaliação in vitro, seguem-se novos desafios.  

Os próximos passos são otimizar estas moléculas e comprovar os resultados com testes em ratinhos com vários tipos de cancro. Além disso, os investigadores estão a estudar soluções possíveis para a criação de um potencial fármaco. Esta é uma ambição que depende de parcerias com empresas e de “avultados investimentos”. No entanto, está, para já, no horizonte a criação de uma startup para o desenvolvimento de ensaios clínicos.

Por detrás deste projeto estão também a investigadora Carla Magalhães, estudante de doutoramento em Química da FCUP, Patrícia González-Berdullas, colaboradora do CIQUP, e o docente e investigador José Enrique Rodriguez Borge, do Departamento de Química e Bioquímica.