Num estudo publicado recentemente na prestigiada revista Nature, uma equipa internacional, com forte participação de investigadores do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA), da Universidade do Porto e da Universidade de Lisboa, conseguiu caracterizar a atmosfera do exoplaneta WASP-76b, tendo detetado o que se  julga ser uma chuva de ferro. A deteção só foi possível graças ao poder coletor do Very Large Telescope  (VLT) do Observatório Europeu do Sul (ESO), combinado com a extraordinária resolução do espectrógrafo ESPRESSO.

A chuva de ferro identificada pelos investigadores só é possível porque o WASP-76b, um exoplaneta a cerca de 390 anos-luz de distância da Terra, tem rotação síncrona. Ou seja, demora tanto tempo a completar uma rotação como a dar uma volta em torno da sua estrela. Desta forma, assim como a Lua em relação à Terra, mostra sempre a mesma face para a estrela.

Isto, em conjunto com a pequena distância que separa o planeta da sua estrela (o WASP-76b dá uma volta à sua estrela a cada 1,8 dias!), faz com que o lado diurno do planeta receba milhares de vezes mais radiação da sua estrela do que a Terra recebe do Sol, tornando-se tão quente que as moléculas se separam em átomos, com os metais, tais como o ferro, a evaporam-se para a atmosfera.

“As nossas observações evidenciam para que a temperatura do planeta pode subir até aos 2400 ºC do lado de dia, que é suficientemente alta para vaporizar metais como o ferro. Depois os ventos fortes transportam este vapor de ferro para o lado noturno, onde a temperatura é menor, cerca de 1500 ºC e este vapor pode então condensar em gotas de ferro”, explica Sérgio Sousa, investigador do IA/U.Porto e membro da equipa científica do ESPRESSO.

Olivier Demangeon (IA & DFA-FCUP) acrescenta ainda que: “o que começou como um estudo clássico do bem conhecido efeito de Rossiter-McLaughlin, acabou numa descoberta incrível, graças à extrema sensibilidade e precisão do ESPRESSO”.

Um ESPRESSO de conhecimento

Este resultado foi obtido em setembro de 2018, a partir das primeiras observações científicas do ESPRESSO, pelo consórcio responsável pelo desenvolvimento e construção deste espectrógrafo concebido para procurar planetas do tipo terrestre em torno de estrelas do tipo solar. Dele fazem parte instituições académicas e científicas de Portugal, Itália, Suíça e Espanha, bem como membros do Observatório Europeu do Sul. Os parceiros portugueses são o IA e a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUP).

O ESPRESSO é o resultado da estratégia do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço na construção de instrumentos para os grandes observatórios do ESO e para as missões espaciais da Agência Espacial Europeia (ESA), que começa agora a dar frutos. Esta estratégia inclui, por exemplo, a recém-lançada missão espacial CHEOPS (ESA) e irá continuar durante os próximos anos com o lançamento do telescópio espacial PLATO (ESA), ou a instalação do espectrógrafo HIRES no maior telescópio da próxima geração, o ELT (ESO)”, refere Nuno Cardoso Santos, investigador do IA e professor no Departamento de Física e Astronomia da Faculdade de Ciências da U.Porto (DFAFCUP).

Segundo Alexandre Cabral, investigador do IA e da FCUL, “o ESPRESSO é neste momento o espectrógrafo mais avançado no estudo de exoplanetas”. O cientista lembra ainda que “este resultado científico resulta de um trabalho de quase 10 anos a desenhar, integrar e testar um instrumento criado na europa e instalado no observatório do Paranal, em pleno deserto de Atacama, sendo uma clara demonstração da capacidade que a instrumentação em astronomia tem em Portugal.”

Por fim, Pedro Figueira, colaborador do IA e cientista do instrumento no ESO (Chile), define o EXPRESSO como uma “máquina perfeita para estudar atmosferas exoplanetárias,”.

Sobre o IA

Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) é a maior unidade de investigação na área das Ciências do Espaço em Portugal, integrando investigadores da Universidade do Porto e da Universidade de Lisboa, e englobando a maioria da produção científica nacional na área. Foi avaliado como “Excelente” na última avaliação que a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) encomendou à European Science Foundation (ESF).

A atividade do IA é financiada por fundos nacionais e internacionais, incluindo pela FCT/MCES (UID/FIS/04434/2019).