O investigador Miguel Carneiro, do CIBIO-InBIO, Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéricos da Universidade do Porto, acaba de conquistar uma das prestigiadas bolsas ERC ‘Consolidator Grant’, no valor de 2 milhões de euros cada, atribuídas este ano pelo Conselho Europeu de Investigação (ERC). O financiamento vai permitir desenvolver o projeto EYESPOT, cujo objetivo é estudar a base genética e celular das cores estruturais em aves.

A coloração é percecionada, na maioria dos casos, como resultado de pigmentos ou corantes que absorbem determinados comprimentos de onda associados à luz. Mas, na natureza, existe um tipo de coloração diferente – coloração estrutural – que gera alguns dos efeitos visuais mais impressionantes que se conhecem e que são produzidos através de superfícies microscópicas suficientemente finas para interferir com a luz visível.

“Um dos exemplos é a cauda do pavão que contém os mesmos pigmentos castanhos e negros existentes no cabelo e pele do ser humano. No entanto, por intermédio de nanoestruturas, é capaz de produzir um conjunto de cores vasto, como azul, roxo, turquesa, frequentemente, num fundo iridescente”, explica Miguel Carneiro.

O projeto EYESPOT vai investigar precisamente os mecanismos biológicos e moleculares subjacentes à formação destas estruturas microscópias nalgumas espécies de aves. Mais concretamente, o objetivo do investigador do CIBIO-InBIO passa por “decifrar a base genética e celular das cores estruturais em aves, explorando a extraordinária diversidade de mutantes de cor que surgiram da reprodução em cativeiro de pavões”.

Através de uma abordagem inovadora e multidisciplinar – que integra técnicas e conhecimentos de áreas tão diversas como a genética e a genómica, a biologia celular e molecular ou a  fotónica – Miguel Carneiro pretende dar resposta àquela que permanece como “uma questão fundamental da biologia evolutiva”.

“No final deste projeto esperamos estar um pouco mais perto de compreender o porquê de tantos animais terem evoluído cores estruturais de forma independente” vaticina o investigador.

O projeto premiado vai tentar compreender os mecanismos por detrás da diversidade de cores dos pavões e de outras aves. (Foto: DR)

Uma bolsa com sabor especial

Relativamente à bolsa agora atribuída pelo ERC, Miguel Carneiro considera-la “extremamente importante para implementar abordagens mais abrangentes e multidisciplinares, impossíveis de concretizar com os modelos de financiamento tradicionais”.

“Isto permitirá não só a compra de reagentes e equipamento, mas também a contratação de múltiplos colaboradores que englobam as diferentes áreas científicas do projeto, desde estudantes, investigadores de pós-doutoramento e técnicos de laboratório”, explica o investigador.

Por outro lado, finaliza Miguel Carneiro, “a relevância das bolsas ERC não se restringe à parte financeira, mas também pretendem premiar a carreira de um investigador, o que é naturalmente gratificante”.

Recorde-se que, em junho passado, o investigador da U.Porto já tinha estado em destaque por um estudo que descreve pela primeira vez o gene responsável pelas diferenças de cor entre machos e fêmeas nas aves. O trabalho liderado por Miguel Carneiro foi mesmo escolhido para ser a capa da edição de 12 de junho de 2020 da revista Science, algo que aconteceu pela primeira vez com um artigo assinado por autores correspondentes da U.Porto.

Miguel Carneiro é apenas o terceiro investigador da U.Porto – e o segundo do CIBIO-InBIO – a conquistar uma Consolidator Grant do ERC. (Foto: DR)

655 milhões para 23 países…

Ao todo, o Conselho Europeu de Investigação atribuiu este ano 327 Consolidator  Grants, o que representa um financiamento total de cerca de 655 milhões de euros, a distribuir por cientistas e académicos de topo” (doutorados e com sete a 12 anos de experiência) de 39 nacionalidades em instituições de 23 países europeus.

A Alemanha e o Reino Unido foram os países que mais bolsas atraíram – cada um com 50 – para aos seus centros de investigação. Seguem-se a França (34) e os Países Baixos (29). Ao todo foram distinguidos onze investigadores portugueses, ainda que apenas seis estejam ligados a instituições científicas nacionais.

Desde a criação destas bolsas (Consolidator Grants), em 2007 o ERC já financiou projetos de 40 cientistas portugueses ou estrangeiros a trabalhar em Portugal. Entre eles incluem-se os também investigadores da U.Porto Helder Maiato, do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (I3S), e Riva Covas, do CIBIO-InBIO, distinguido em 2015 e em 2019, respetivamente.