A modulação da microbiota intestinal (também conhecida como flora intestinal) pode ser a chave para prevenir e tratar a obesidade moderada e a diabetes tipo 2. De acordo com investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), a realização de cirurgia metabólica está associada a alterações significativas na microbiota do intestino, bem como à melhoria de uma série de parâmetros relacionados com aquelas doenças. A descoberta é avançada num artigo publicado no jornal científico Diabetology & Metabolic Syndrome.

A equipa da FMUP realizou um ensaio clínico no qual comparou doentes submetidos a cirurgia metabólica, mais concretamente a uma cirurgia de bypass gástrico (cirurgia que reduz o tamanho do estômago e o liga ao jejuno, no intestino delgado), com doentes submetidos apenas a tratamento médico convencional (ou standard), com fármacos.

Todos os doentes incluídos neste ensaio tinham obesidade moderada (índice de massa corporal entre ≥ 30 e < 35 kg/m2) e diagnóstico prévio de diabetes tipo 2.  Os participantes foram acompanhados ao longo de vários meses, tendo sido avaliados por especialistas em Endocrinologia e em Nutrição.

Além de medições antropométricas (como peso, massa gorda e circunferência da cintura), foram realizadas análises ao sangue para medir a glicose e o perfil lipídico (que inclui o colesterol e os triglicerídeos) e análises à microbiota intestinal a partir de amostras das fezes.

“Este foi o primeiro ensaio clínico controlado e randomizado a estudar as alterações clínicas e na microbiota em doentes com obesidade e com diabetes após cirurgia de bypass, em comparação com o tratamento médico standard”, refere Eva Lau, investigadora da FMUP/CINTESIS e primeira autora do estudo.

Eva Lau é a primeira autora do estudo agora publicado. (Foto: DR

Cirurgia pode levar à remissão da diabetes ao fim de um ano

Segundo os autores, os doentes submetidos a cirurgia metabólica registaram melhorias em vários parâmetros antropométricos, metabólicos e inflamatórios analisados ao longo de um ano.

“Em apenas três meses, observamos diferenças significativas no índice de massa corporal e na circunferência da cintura. Após seis meses, essas diferenças eram ainda maiores, juntando-se uma melhoria na resistência à insulina e no perfil lipídico. Ao fim de 12 meses, os doentes do braço cirúrgico tiveram uma melhoria ou mesmo uma remissão da sua diabetes”, avança Eva Lau.

Os investigadores verificaram ainda que esta melhoria no estado dos doentes estava associada a uma melhoria da microbiota intestinal, que se tornou “mais rica”, isto é, com mais diversidade de bactérias favoráveis (Proteobactérias) e menor número de bactérias consideradas pró-inflamatórias (Firmicutes).

“Estes resultados sugerem que as alterações anatómicas e sistémicas ocorridas com a cirurgia restauram a riqueza da microbiota e, deste modo, melhoram o perfil metabólico”, dizem.

Do mesmo modo, sugerem que “o tratamento médico standard não altera a microbiota, justificando-se, provavelmente, uma estratégia complementar com prebióticos e probióticos para melhorar o controlo glicémico”.

Coordenado por Paula Freitas, professora da FMUP, e Edi Prifti, do Instituto de Cardiometabolismo e Nutrição, em Paris, este estudo contou com a participação de diversos investigadores da FMUP, CINTESIS, I3S – Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da U.Porto, Centro Hospitalar Universitário de São João, entre outros.