A Fetaldisc, uma startup portuguesa constituída por investigadores do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S) com o objetivo de tratar a dor lombar, vai receber 75 mil euros no âmbito do programa «Women TechEU», uma iniciativa da Comissão Europeia que visa promover o empreendedorismo feminino na área da tecnologia.

A equipa liderada pela investigadora Joana Caldeira, do i3S/INEB, é responsável pelo desenvolvimento do primeiro biomaterial fetal injetável para regenerar o disco intervertebral. O trabalho, do qual já resultou um pedido de patente, foi desenvolvido no grupo «Microenvironments for New Therapies», no i3S, e no laboratório de Medicina Regenerativa, do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS).

Durante o processo de investigação, a equipa utilizou desperdícios da indústria pecuária, que normalmente são incinerados, e conseguiu identificar a existência de componentes pro-regenerativos nos discos intervertebrais fetais.

Mais recentemente, explica Joana Caldeira, “demonstrámos que, após processamento em laboratório, estes tecidos têm um maior potencial regenerativo, ou seja, verificamos um “reaparecimento” das proteínas típicas de um ambiente saudável em células de disco cultivadas nos biomateriais fetais de bovino”.

Além disso, acrescenta a investigadora, “o biomaterial que desenvolvemos tem também a capacidade de inibir a formação de novos vasos sanguíneos, um processo a que se chama angiogénese e que está relacionado com a intensidade da dor, mobilidade e qualidade de vida dos doentes”.

A tecnologia utilizada, concretiza Joana Caldeira, “tem por base o processamento do tecido fetal de modo a eliminar as células nele existentes, mantendo a maioria dos restantes componentes bioquímicos e estruturais característicos das fases de desenvolvimento embrionário”.

Numa fase seguinte, “procedemos à liofilização (desidratação a baixas temperaturas), para obter um elevado tempo de vida útil do material em questão e economizar no processo de armazenamento, para que possa ser posteriormente injetado na forma de partículas em suspensão”.

Um tratamento mais eficaz

Com um material injetável, sublinha a investigadora, “elimina-se a necessidade de cirurgias invasivas a pacientes com dor lombar e diminui-se o tempo de intervenção, de recuperação e de hospitalização”. Este biomaterial tem também a «vantagem de poder ser produzido de uma forma simples, segura, acessível e passível de ser escalonável”.

Quanto ao sucesso deste procedimento, Joana Caldeira explica que “quanto mais cedo for realizada a intervenção, maior se espera que seja o seu potencial, podendo nomeadamente proporcionar um efeito preventivo”.

A equipa antevê ainda que este biomaterial possa ter uma aplicação mais abrangente em doenças degenerativas da cartilagem que afetam outras articulações nomeadamente do joelho, anca e ombro entre outros.

Para já, o financiamento atribuído no âmbito do programa «Women TechEU» permitirá  validar o produto em ensaios pré-clínicos e consolidar o modelo de negócio, de modo a facilitar a sua comercialização.

Para além de Joana Caldeira, a equipa da Fetaldisc é constituída também pelas investigadoras Morena Fiordalisi, estudante de doutoramento do programa doutoral Biotechealth, do ICBAS e da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto (FMUP), Raquel Gonçalves, investigadora no i3S e professora no ICBAS, e por Hugo Prazeres, coordenador do Gabinete de Inovação do i3S.

Dor lombar

Apesar de não ser mortal, a dor lombar tem um grande impacto socioeconómico, constituindo a principal causa de incapacidade em Portugal e a principal responsável pela perda de anos de vida útil. Este tipo de dor é frequentemente causada pela degeneração do disco intervertebral que ocorre com o envelhecimento.

As opções de tratamento existentes passam por fisioterapia, medicamentos para controlar a inflamação e a dor ou por cirurgias bastante invasivas, mas, em grande parte dos casos, não existem soluções a longo prazo.