Mais de três anos após a conquista do “Student Payload NanoLab Competition”, promovida pelo programa MIT Portugal, a experiência científica da equipa MiFiRE (“Microgravity Fine Regolith Experiment”), constituída maioritariamente por estudantes da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, esteve a bordo de um foguetão da Blue Origin, empresa de Jeff Bezos.
Depois do adiamento de um dia, o foguetão New Shepard arrancou à hora prevista desta terça-feira, da base de Corn Ranch, no Texas, Estados Unidos. A bordo do NS24, juntamente com mais 32, seguiu a experiência portuguesa, que pretende compreender como se formam os corpos rochosos, como asteroides e planetas, no nosso sistema solar.
A MiFiRE resulta de um trabalho conjunto entre Rui Moura, investigador do Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência (INESC TEC) e agora também da Universidade de Aveiro, um grupo do INESC TEC, e os estudantes do Mestrado em Geologia, Vítor Martins e Ivan Sá, Maria Cristina Marques, do Mestrado em Geomateriais e Recursos Geológicos e Ana Caldeira, antiga estudante da licenciatura em Geologia e que está agora a frequentar o Mestrado em Engenharia Geológica na Universidade de Aveiro.
A experiência que teve data de lançamento em 2021, entretanto adiado, já tinha sido lançada ao espaço no dia 12 de setembro de 2022, na missão não-tripulada NS-23. No entanto, ocorreu um incidente que levou à explosão do foguetão. Apesar disso, a cápsula regressou à Terra em segurança, salvando-se a sua carga. À terceira foi mesmo de vez e a equipa do MiFiRE viu o seu “pedaço” de lua descolar e aterrar com sucesso.
Uma experiência gravada em pleno voo
A experiência foi inspirada pela formação e contacto que Rui Moura, que até agosto de 2023 integrou o corpo docente da FCUP, tem levado a cabo nos EUA desde 2016, quando se tornou o primeiro português a integrar o projeto PoSSUM – Polar Suborbital Science in the Upper Mesosphere, para treino de astronautas suborbitais. Durante a sua formação nos EUA, reuniu cerca de 1,5 kg de um “solo” simulante lunar, fabricado para projetos da NASA a partir de solos terrestres e com características semelhantes ao rególito da Lua, sendo que esse material, designado por JSC-1, já praticamente não existe.
Este solo é um dos elementos que integra a experiência. Numa caixa própria, construída em policarbonato, foram colocadas cerca de 100 gramas deste solo e juntam-se um cubo de 1 centímetro quadrado de rocha silicatada e um cubo de 1 centímetro quadrado de meteorito metálico. Através de um sistema com eletrónica desenvolvida no INESC TEC, a experiência foi gravada em pleno voo de modo a monitorizar a forma como flutuam e se agregam as partículas em microgravidade. Uma placa de controlo ligada a uma câmara a qual, baseada na leitura de um acelerómetro, permitiu todo o registo, de forma sincronizada, assim que ela atingiu a fase de voo em microgravidade.
Novas oportunidades para a ciência
Esta experiência científica não termina com a viagem e promete dar muito material de estudo para a equipa da MiFIRE e, quem sabe, para trabalhos colaborativos de ciência com os estudantes. O objetivo da equipa é agora, com os fotogramas do vídeo (120 fotogramas por segundo), analisar, através de um software, como é que as partículas se deslocam e se existe algum padrão.
O tipo de microgravidade (gravidade zero) que se encontra nestes voos suborbitais (com uma altitude superior a 100 km acima do nível do mar) constitui um dos modos ideais para se testar este tipo de experiências. “Pessoalmente, e em nome do grupo de jovens investigadores do MiFIRE, estamos bastante felizes por termos finalmente conseguido lançar o nosso payload [carga] neste voo suborbital”, frisou Rui Moura após o voo, em declarações ao jornal Público. E fica a esperança, agora que se concretizou o voo, de que a experiência ajude a “abrir as portas para mais experiências científicas portuguesas a voar nestas plataformas de microgravidade suborbitais”.