Depois de uma criteriosa avaliação das 16 candidaturas recebidas, já são conhecidos os seis projetos vencedores da edição 2023 do IJUP Empresas, o programa da Universidade do Porto que desafia cientistas, estudantes e empresas nacionais a colaborar em projetos de investigação exploratória com caráter pluridisciplinar.

Entre as empresas parceiras do programa, coube à Galp selecionar três ideias inovadoras, todas elas assinadas por investigadores da Faculdade de Engenharia da U.Porto (FEUP).

O projeto Captura e recuperação de CO2 diretamente do ar procura responder à necessidade urgente de implementar processos capazes de mitigar os efeitos nefastos que o aumento da concentração de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera tem no equilíbrio dos ecossistemas terrestres e, nomeadamente, no aquecimento global. Este foi o ponto de partida para uma equipa liderada  pelo investigador Adélio Mendes começar a pensar, e trabalhar, numa solução.

“O principal objetivo é desenvolver uma tecnologia de captura de CO2 diretamente do ar com sustentabilidade económica, social e ambiental”, referem os investigadores. Isso será feito usando uma “solução alcalina de KOH e a recuperação eletroquímica do CO2 dos carbonatos formados”, explica a equipa, da fazem também parte Bernardo Soares, Felipe Afonso e Cátia Azenha, todos da FEUP.

Além das vantagens óbvias da remoção sustentável do dióxido de carbono atmosférico, o projeto garantirá uma “muito mais fácil implementação e de geração de emprego e de riqueza nacionais”.

Esta solução cativou o interesse da Galp, que vai financiar o projeto com 5.000 euros. Esse montante vai permitir a “antecipação da investigação e execução experimental”. A expectativa de colaboração com a Galp é grande, uma vez que “é a empresa de referência em Portugal de combustíveis fósseis”, antecipam os cientistas envolvidos.

Descarbonizar o setor marítimo

Também da FEUP, e também selecionado pela Galp, foi o projeto S.O.S. Hydro MarScale-up of a NaBH4-H2 off-grid system for maritime applications: design and experimental studies, dinamizado pelos investigadores Alexandra Pinto, Héctor Giménez, Sahar Abdolbaghi, Diogo Silva e Hélder Nunes.

O foco deste projeto, à semelhança do anterior, está nos combustíveis fósseis e em criar alternativas mais sustentáveis. Neste caso, mais voltado para o setor marítimo, um dos mais difíceis de eletrificar e descarbonizar: “Num mundo onde existe urgência em substituir o uso excessivo de combustíveis fósseis para a produção de energia, a falta de soluções viáveis no setor marítimo tem atrasado o processo de descarbonização”, referem os investigadores.

Apesar de o hidrogénio ser visto como um vetor energético facilitador neste processo, a sua produção e armazenamento em tanques não é prática. O S.O.S. Hydro Mar pretende desenvolver um sistema de produção e armazenamento simultâneo de hidrogénio, para “fornecimento a células de combustível PEM, uma tecnologia “off-grid” capaz de providenciar energia sustentável em aplicações marítimas”, explicam.

O sistema permite a produção de H2 “off-grid” e “on-board” e de utilização sob demanda imediata de hidrogénio, o que o torna ideal para aplicações marítimas, em particular as embarcações de pesca e recreativas.

Com a ajuda dos 5.000 euros investidos pela Galp, a equipa de investigação espera “fazer o aumento da escala do sistema de produção e armazenamento de hidrogénio, ou seja, aproximar o sistema a um primeiro protótipo e experimentação em escala real”. A equipa acredita que o apoio da empresa é um “passo essencial na transição energética”.

Gerar energia sem fios

A Galp escolheu ainda o projeto “Electrifying the future”, cujo principal objetivo é aproveitar todo o potencial do lítio, nomeadamente para gerar energia sem fios.

Os investigadores, todos da FEUP, explicam que isso será feito “desenvolvendo as propriedades eletrostáticas de eletrólitos ferroeletricos à base the ião Li+, para recolha e armazenamento de energia sem fios ou “wireless”. Ou seja, o projeto visa criar baterias de estado sólido, tendo por base o conceito de baterias “electrodeless”, o que alinha as expectativas da investigação com os das “agendas globais para um futuro descarbonizado”, explicam os cientistas.

Quanto ao valor atribuído – 5.000 euros -,, a equipa espera que daqui surja uma “sinergia que permita continuar com o estudo de novos materiais para o armazenamento de energias verdes”, uma vez que a empresa tem vindo a apostar na descarbonização da sua indústria. Assim, o grupo de cientistas acredita que pode trazer uma linha de investigação verdadeiramente “disruptiva para wireless-harvesting/storage para o futuro do nosso país”, concluem.

Do grupo de cientistas fazem parte Helena Braga, os estudantes  Ilídio Costa e António Vale e a investigadora Beatriz Arouca Mais, candidata a doutoramento na FEUP.

João Ribeiro, da Galp, afirma que todos os projetos concorrentes eram “de alta qualidade” e a vê o apoio aos três escolhidos como o “início de uma relação continuada tanto com os jovens investigadores como com os investigadores mais experientes que, generosamente, irão acompanhar os mais novos nestes temas relevantes para a Galp”, conclui.

Inovar a indústria alimentar

O grupo ITAU (Instituto Técnico de Alimentação Humana, S.A), que se aliou pela segunda vez ao IJUP Empresas, escolheu financiar o “Desenvolvimento de refeições de textura modificada, moldadas, para aplicação na indústria alimentar”, um projeto com origem  na Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da U.Porto (FCNAUP) e cuja equipa integra os investigadores Duarte Torres, Diogo Freitas e Ana Micaela Ferreira, todos da FCNAUP, e  Raquel Rodrigues, estudante na Faculdade de Farmácia da U.Porto (FFUP).

Nos dias que correm, as refeições moldadas podem desempenhar um papel importante na indústria de serviços alimentares, com o objetivo de “reduzir os elevados níveis de baixa satisfação, o desperdício alimentar e a subnutrição associados às refeições servidas”, explicam os investigadores.

Assim, o objetivo da equipa é “desenvolver receitas de textura modificada (TMR) que, quando combinadas, resultam em refeições de textura modificada (TMM), e estudar o efeito da congelação nas suas propriedades físicas e de textura”. Preferencialmente, e para melhorar o aspeto visual das refeições, serão desenvolvidas receitas com características que possibilitem o seu molde”, contam. Estas refeições também “serão testadas para serem congeladas e regeneradas mantendo as suas qualidades texturais, físicas, sensoriais e nutricionais”, contam os investigadores.

O financiamento atribuído pelo ITAU possibilitará a aquisição de equipamentos, necessários para atingir os objetivos do trabalho. Além disso, a equipa espera ter “acesso às unidades de produção para realização de visitas, identificação de necessidades específicas da empresa e também acompanhamento do projeto”.

“Esperamos que este projeto nos ajude a melhorar o serviço por nós prestado numa área tão sensível como é a das refeições de textura modificada”, refere Carmen Costa, do grupo ITAU.

Esta não é a primeira vez que colaboram com investigadores da FCNAUP e a empresa espera que se “continuem a reforçar laços de um trabalho em equipa que se quer cada vez mais forte entre as empresas e as entidades dos sistemas científico e tecnológico”, acrescenta.

Avançar na alimentação de animais de companhia idosos

Ainda na área da alimentação, desta vez de animais, surge o projeto “Nanotech supplementation natural compounds-based to improve the well-being of elderly pets”, que vai ser apoiado pela SOJA DE PORTUGAL.

Uma vez que os animais de estimação, hoje em dia, vivem mais anos, vão desenvolvendo mais problemas de saúde como por exemplo demência, algo bastante difícil de lidar para os donos, tornando o cuidado aos animais mais desafiante. Assim, a equipa de investigadores composta por Joana Loureiro, Maria do Carmo Pereira, João Pedro Cerqueira Pereira e Ângela Raquel Brandão Ferreira, todos da FEUP, começou a trabalhar em complementar as atuais rações com compostos naturais que contribuam para melhorias cognitivas nos animais de companhia idosos.

“Uma vez que estes compostos apresentam baixa atividade biológica, serão encapsulados em nanopartículas biocompatíveis”. Além da relação com a parte cognitiva do animal, os compostos também podem prevenir outras “doenças relacionadas com a idade, incluindo cancro e hipertensão”, contam os investigadores.

Esta será uma abordagem de “baixo custo, uma vez que o material utilizado na produção das nanopartículas será barato”. Ou seja, uma das principais mais valias do projeto é possibilitar que a maioria dos donos de animais de companhia tenham acesso a este “alimento hi-tech”, referem.

Os cientistas acreditam que a SOJA DE PORTUGAL é o “parceiro ideal para o desenvolvimento desta nova matéria prima”. Já Maria João Mota, representante da empresa, acrescenta que esta será uma parceria recíproca, permitindo que a SOJA DE PORTUGAL “aumente o seu conhecimento no que respeita à aplicação da nanotecnologia ao setor de nutrição de animais de estimação”.

A responsável da empresa nota ainda que esta abordagem permitirá proteger os ingredientes durante o processo de fabrico das dietas e durante o processo digestivo, potenciando os benefícios para os animais”.

Melhorar a alimentação na primeira infância

A SONAE MC também se aliou ao IJUP Empresas 2023 e escolheu o BABY-SCORE: Inovação Nutricional e Sustentável para Alimentação Infantil, um projeto multidisciplinar que junta os investigadores Zita Martins e Samuel Aguillar Tomaz (FCNAUP) a Susana Casal, Isabel Ferreira, Eulália Mendes, Ana Beatriz Novais, Raquel Santos, Ana Catarina da Rocha Santos, Ana Clara Pacheco Oliveira (FFUP).

A ideia surge com o objetivo de responder a um problema concreto: “ausência de orientações nutricionais adequadas para a primeira infância, particularmente na classificação de alimentos de forma a ser inequivocamente interpretada pelos consumidores”, apresentam os cientistas.

“Os atuais sistemas de pontuação não abordam de forma eficaz as necessidades nutricionais das crianças nessa faixa etária (em constante evolução), nem consideram as porções adequadas”, referem. Assim, o grupo vai apostar em rever as diretrizes nutricionais e criar um sistema de classificação nutricional “inovador e altamente personalizado para produtos de alimentação infantil”.

Este projeto vai abordar as necessidades nutricionais específicas das crianças até 1 ano de idade, tendo em conta as porções adequadas a cada fase como também as orientações pediátricas. A equipa acredita que o BABY SCORE trará benefícios não só para o mercado, mas também para a sociedade, “contribuindo para a promoção de hábitos alimentares mais saudáveis desde a infância e prevenindo problemas de saúde futuros”.

A equipa acrescenta ainda que isto é “especialmente importante num contexto em que a nutrição adequada e a sustentabilidade são desafios crescentes”.

As expectativas em relação à colaboração com a Sonae MC são “claras e específicas”, dizem. O grupo espera contacto próximo entre meio académico e meio empresarial, fornecendo todas as informações necessárias para “a criação e validação do algoritmo”, incluindo aqui dados sobre os seus produtos de alimentação infantil.

Em suma, espera-se que a empresa “valorize e adote o BABY SCORE como uma ferramenta de diferenciação, consolidando a sua imagem como líder e responsabilidade corporativa e atraindo consumidores preocupados com saúde e sustentabilidade”, concluem.

IJUP Empresas: uma iniciativa para continuar

Os vencedores desta edição do IJUP Empresas foram revelados no passado dia 27 de outubro, durante Encontro de Investigação e Inovação Abertas na U.Porto, organizado pela U.Porto Inovação no âmbito do Skills for a Next Generation U.Porto.

Durante a manhã, os participantes tiveram a oportunidade de assistir à intervenção de Elisa Keating, professora da Faculdade de Medicina da U.Porto (FMUP), que foi a primeira e principal responsável pelo IJUP Empresas nos primeiros anos da iniciativa lançada em 2011.

Ao longo das sete edições já realizadas, dezenas de projetos foram apoiados, tendo sido envolvidos centenas de estudantes, de 10 diferentes faculdades da Universidade do Porto e, por isso, diferentes áreas de investigação. “Tudo isto mostra que o IJUP Empresas mexe com a ciência, e é essa a intenção”, referiu Elisa Keating.

“Esta é uma iniciativa emblemática da Universidade do Porto. Estes projetos são, muitas vezes, o primeiro passo da relação da investigação com as empresas, que é um dos nossos objetivos. Por isso, esta é uma iniciativa que queremos continuar a acarinhar”, referiu por sua vez Pedro Rodrigues, Vice-Reitor da Universidade do Porto para a Inovação e Investigação, no momento do anúncio dos vencedores.

As empresas envolvidas nesta edição, à semelhança dos anos anteriores, reconhecem muito valor à iniciativa. “Vemos no IJUP Empresas a possibilidade de podermos “afinar” aquilo que é produzido pelos estudantes e investigadores para o que são as reais necessidades, de momento ou de futuro, das empresas contribuindo assim para que cada vez mais o que é produzido possa gerar valor no mercado”, salienta Carmen Costa, do ITAU, empresa que é parceira do IJUP Empresas pela segunda vez.

Os representantes da Galp são da mesma opinião, referindo-se ao IJUP Empresas como um “excelente programa pois conecta os investigadores em temas relevantes para as empresas, aproximando a academia e a indústria de forma multidisciplinar”, refere João Ribeiro.

“A aposta contínua da SOJA de Portugal em I&D+i inclui participação em programas como o IJUP Empresas, que nos têm permitido investigar temas relevantes para as várias áreas de negócio do grupo e, simultaneamente, reforçar a colaboração com a academia”, acrescenta Maria João Costa, da SOJA de Portugal.

A representante da empresa afirma que iniciativas como esta têm “um papel relevante na formação de jovens talentos, pois proporcionam uma primeira interação com a indústria”. E, com isso, facilita também a “futura integração dos jovens nas empresas”.