Uma equipa de astrónomos, maioritariamente composta por investigadores do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA), na Universidade do Porto, encontrou indícios de que as gigantes vermelhas – estrelas moribundas, nos estágios finais da evolução estelar, que esgotaram o hidrogénio nos seus núcleos – têm “falhas” – variações estruturais abruptas – no seu núcleo. O trabalho acaba de ser publicado na prestigiada revista científica Nature Communications.

Infelizmente, é impossível olhar diretamente para o interior de uma estrela. No entanto, uma técnica chamada asterossismologia, que mede oscilações semelhantes a “terramotos” nas estrelas, permite-nos vislumbrar indiretamente o interior estelar. As “falhas” detetadas neste estudo afetam  a frequência e o trajeto das ondas sonoras e de gravidade, que dão origem às  oscilações observadas.

“A propagação de ondas  no interior das estrelas dá origem a minúsculas variações do brilho das mesmas, que podem ser detetadas por instrumentos no espaço. Estas ondas revelam as condições do meio por onde se propagam e, desta forma, fornecem informação acerca das propriedades físicas do interior das estrelas”, esclarece a investigadora do IA/U.Porto, Margarida Cunha.

O estudo agora publicado apresenta a primeira caracterização das descontinuidades estruturais presentes no núcleo de estrelas gigantes vermelhas.” Uma descoberta que nos “permite, pela primeira vez, sondar com precisão os processos físicos que ocorrem nessa zona”, explica o primeiro autor do artigo, Mathieu Vrard, que iniciou este trabalho no IA, mas que atualmente trabalha na Ohio State University,

A equipa usou dados do telescópio espacial Kepler (NASA) para detetar e estudar ondas que se propagam até às camadas mais profundas de estrelas velhas.  “Ao analisar estas variações, podemos inferir, não só  as propriedades globais da estrela, mas também informação precisa acerca da estrutura destes astros”, detalha o investigador.

Duas teorias em aberto

As gigantes vermelhas de baixa massa, após iniciarem a fusão de hélio nos seus núcleos, são frequentemente usadas em estudos para determinar distâncias e densidade galáctica, bem como para compreender melhor os processos físicos que ditam a evolução química das estrelas. Por isso, é vital que os investigadores criem modelos precisos destas estrelas. Para isso precisam de compreender a causa destas descontinuidades.

Nesta investigação, a equipa analisou uma amostra de 359 gigantes vermelhas, com massas abaixo de um determinado valor, para medir as suas oscilações individuais e várias propriedades dessas estrelas. No final descobriram que quase 7% destas estrelas apresentam descontinuidades estruturais.

Esquema da evolução de uma estrela, desde a sequência principal até à fase de gigante vermelha. (Imagem: Thomas Kallinger, U. of British Columbia and U. of Vienna)

Há duas teorias que tentam explicar como é que estas perturbações ocorrem. A primeira afirma que as “falhas” estão presentes ao longo da evolução da estrela, mas, regra geral, são pouco intensas e ficam abaixo do limite a partir do qual os investigadores as catalogariam como verdadeiras descontinuidades.

A segunda sugere que estas irregularidades são “suavizadas” por um processo físico desconhecido, que mais tarde dá origem a mudanças na estrutura do núcleo da estrela.

Este estudo não favorece a primeira hipótese, mas são precisos mais dados para que os investigadores possam confirmar com segurança a segunda. “Este trabalho mostra os limites dos nossos modelos atuais, e dá-nos pistas para encontrarmos formas de os melhorar”, conclui Diego Bossini (IA/U.Porto).