Os investigadores do Departamento de Ciências do Comportamento do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) da Universidade do Porto, Karine Silva e Sofia Lopes, publicaram recentemente um estudo na revista Environmental Psychology que corrobora a hipótese de o contacto com a natureza, nomeadamente através de passeios de 50 a 90 minutos em espaços verdes urbanos, poder reduzir significativamente os níveis de ruminação mental em indivíduos saudáveis constituindo-se desta forma como um fator protetor no desenvolvimento de doença mental.

A ruminação mental, definida como um padrão de pensamentos autocentrado, negativo e repetitivo, constitui uma estratégia de regulação emocional desadaptativa face a situações adversas, sendo um forte fator de risco para o desenvolvimento e manutenção de diferentes perturbações psicológicas (como a depressão e a ansiedade).

Estudos mostram que este processo danifica a capacidade de reflexão e resolução de problemas, mas também pode sustentar respostas inflamatórias face ao stress. Desta forma, tem vindo a ser sublinhada a importância de se investigar estratégias que auxiliem na redução de processos ruminativos.

Ora, tal torna-se particularmente relevante num país como Portugal em que o registo de utentes com perturbações mentais nos cuidados de saúde primários tem vindo a aumentar desde 2011 (no que diz respeito às perturbações de ansiedade, às perturbações depressivas e às demências). E ainda mais urgente no quadro pandémico atual em que há fortes preocupações ao nível da saúde mental.

Como as experiências “awe” podem ajudar…

Foi neste contexto que as investigadoras da U.Porto, juntamente com Mariely Lima, da Escola Superior de Saúde da Universidade de Aveiro (UA), procuraram analisar o mecanismo por detrás do processo pelo qual o contacto com a natureza poderá afetar o pensamento ruminativo. Para tal, testaram um modelo de mediação em série através do qual o contacto com a natureza induz no indivíduo experiências de “awe” – termo inglês relacionado com o que inspira reverência e admiração – acompanhadas de pensamentos de foco externo, promovendo uma alteração positiva no estado de humor e interrompendo desta forma o ciclo ruminativo ou o denominado pensamento negativo.

Para o estudo foram recrutados adultos saudáveis distribuídos aleatoriamente por duas condições experimentais: uma envolvendo uma caminhada guiada de 30 minutos pelos jardins do palácio de cristal; e outra envolvendo uma caminhada equivalente pelas ruas adjacentes ao ICBAS num trajeto desprovido de elementos naturais. Através de escalas psicométricas, foram realizadas medições dos níveis de ruminação mental e estado de humor dos participantes, antes e após a caminhada.

As conclusões não deixam dúvidas. A caminhada pela natureza, além de induzir experiências de “awe”, pensamentos de foco externo, e uma melhoria do estado de humor dos participantes, reduziu significativamente o pensamento ruminativo. Já a caminhada pelas ruas adjacentes ao ICBAS não promoveu qualquer alteração significativa nos níveis de ruminação, tendo-se até verificado uma tendência para o seu aumento.

Além disso, esta caminhada gerou também um agravamento do estado de humor dos participantes. Finalmente, os resultados mostraram que a redução do pensamento ruminativo pode ocorrer sem envolver estados de “awe” e passando apenas pela redução do estado de humor negativo.

“Caminhadas verdes” são o melhor remédio

Esta investigação chama a atenção para o facto de uma simples caminhada de 30 minutos num parque urbano constituir uma estratégia relevante para a promoção de saúde mental. Também relevante, nomeadamente do ponto de vista da intervenção clínica, é o facto de a caminhada no parque ter beneficiado os participantes, para além do próprio exercício, apoiando as recomendações para “caminhadas verdes”.

Para o futuro, as investigadoras acreditam que será importante promover investimentos viáveis no acesso a ambientes naturais já que trazem benefícios importantes para o capital mental das cidades e das nações. Além disso, o estudo apoia a ideia de se reforçar o ensino aos cidadãos sobre os benefícios de se envolverem com espaços verdes para a sua saúde mental, podendo revelar-se particularmente frutíferos tanto a partir da promoção da saúde como das perspetivas ecológicas.

Por fim, embora muitos indivíduos intuitivamente acreditem que a natureza é benéfica para a sua saúde mental, a literatura indica que as pessoas subestimam o grau em que mesmo o contacto breve com a natureza pode beneficiar o seu bem-estar. A este respeito, os professores e os prestadores de cuidados primários podem estar idealmente posicionados para serem líderes na divulgação de resultados da investigação em Psicologia do Ambiente.

Reconhecer tais descobertas pode motivar as pessoas a tomar medidas na promoção e restauro da saúde através do uso ativo (e proteção) dos ambientes naturais, contribuindo assim para a ligação humana com a natureza.