Uma equipa internacional de cientistas, na qual se inclui Martim Melo, do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (CIBIO-InBIO), da Universidade do Porto, e do Museu de História Natural e da Ciência da U.Porto (MHNC-UP), publicou recentemente um estudo na prestigiada revista Nature, no qual faz, pela primeira vez, a demonstração empírica da Teoria da Biogeografia das Ilhas, utilizando uma base de dados a nível mundial.

Proposta por Robert MacArthur e Edward Wilson nos anos 60, a Teoria da Biogeografia de Ilhas é comummente utilizada para explicar a diversidade de espécies observada nas ilhas. Na prática, a teoria postula que em ilhas maiores vão existir mais espécies pois quanto maior a área menor as taxas de extinção. Já nas ilhas mais isoladas, as taxas de uma colonização são menores, resultando numa menor biodiversidade.

MacArthur e Wilson também reconheceram que a evolução dentro de arquipélagos leva à formação de novas espécies, mas nunca a conseguiram incluir no seu modelo. De resto, muitos estudos testaram a Teoria da Biogeografia das Ilhas a pequenas escalas, mas, até hoje, nenhum deles o tinha tentado fazer a uma escala global.

… até agora

No estudo agora publicado, foram reunidos dados moleculares de centenas de espécies de aves de 41 arquipélagos a nível mundial. Estes dados permitem estimar não só taxas de colonização e extinção, mas também taxas de especiação (formação de espécies).

Para analisar estes dados, a equipa utilizou um modelo estatístico inovador, desenvolvido pelo investigador português- e primeiro autor do estudo – Luis Valente, do Naturalis Biodiversity Center (Países Baixos). O resultado foi surpreendente: o modelo que melhor prevê o número de espécies em ilhas é mesmo o modelo original de MacArthur e Wilson.

Simultaneamente, foi possível chegar a outra constatação fascinante. Embora seja dada muita atenção às divergências evolutivas que ocorrem em ilhas, como no caso dos tentilhões de Darwin nas Galápagos, a grande maioria das espécies de aves nas ilhas constituem ramos evolutivos únicos, como resultado de colonizações independentes de espécies provenientes dos continentes.

Martim Melo (à esq.) e Luis Valente foram dois dos investigadores responsáveis pelo estudo agora publicado. (Foto: Amancio Motove Etingue)

Um avanço essencial para o conhecimento da biodiversidade

“É a primeira vez que se inclui a evolução no modelo. O nosso uso de dados moleculares permitiu colmatar essa falha. A formação de espécies em arquipélagos depende simultaneamente da área e do isolamento: quanto maior e mais isolada for uma ilha, maior o número de espécies que se irão aí formar”, refere Martim Melo.

Ainda segundo o investigador e coordenador de exploração no MHNC-UP, “o artigo não só comprova a teoria da biogeografia das ilhas para as aves, como define a forma das relações exatas entre os fatores físicos (área, isolamento) e os determinantes do número de espécies (colonização, extinção, especiação)”, acrescenta.

Este estudo constitui assim um avanço essencial para o conhecimento dos principais processos que explicam a biodiversidade global. Contudo, falta ainda compreender porque surgiram mais espécies em determinados grupos de animais e de plantas e de que forma a crescente perda e fragmentação de habitats irá afetar a biodiversidade.

Para a compreensão dos efeitos da fragmentação de habitats, Martim Melo salienta que “as ilhas continentais, ilhas previamente ligadas a um continente, mas separadas deste pela subida do nível do mar, constituem modelos mais próximos e por isso potencialmente mais informativos”. E é por essa razão que neste momento se encontra com Luis Valente na ilha de Bioko (Guiné Equatorial) “a realizar trabalho de campo nesse sentido”.