É em tamanho muito semelhante à Terra, mas tem duas vezes e meia a massa do nosso planeta, o que o torna afinal muito mais denso e, na sua composição global, mais parecido com Mercúrio. Um planeta descoberto à distância de 340 anos-luz poderá esclarecer as peculiaridades do planeta mais perto do Sol, segundo um artigo publicado na última edição da revista Nature Astronomy e da autoria de uma equipa internacional da qual fazem parte nove investigadores do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA).
O planeta K2-229 b atraiu a atenção da equipa pelo tamanho muito semelhante ao da Terra. Porém, o seu núcleo metálico deverá perfazer 68% da massa, comparado com menos de um terço no caso da Terra. Este resultado não seria expectável tendo em conta a composição química da estrela-mãe, comenta Vardan Adibekyan (IA e Universidade do Porto), um dos autores do estudo e que contribuiu para a caracterização química da estrela K2-229. Esta estrela é um pouco mais nova e menos massiva que o nosso Sol e tem uma proporção ligeiramente menor de outros elementos químicos mais pesados que o hidrogénio e o hélio. Esta incongruência entre estrela e planeta é a primeira detetada num sistema extrassolar, mas mesmo à nossa porta, em Mercúrio, verifica-se algo semelhante.
A Terra, Marte e Vénus, assim como o Sol, partilham a mesma abundância relativa de certos elementos químicos, como o ferro, o magnésio ou o silício, diz Vardan Adibekyan. “Mercúrio é diferente e pensa-se que algum processo externo tenha alterado significativamente a sua composição. Agora encontrámos um planeta que apresenta a mesma particularidade, a de ter uma composição diferente da que seria de esperar a partir da composição da sua estrela-mãe.” A equipa espera que a descoberta de outros planetas do mesmo género possa ajudar a perceber melhor como é que planetas como Mercúrio se formaram e evoluíram. Poderá até complementar os dados de missões a este corpo no limite interior do Sistema Solar, como a Messenger e a futura BepiColombo, que será lançada neste ano.
Para Susana Barros (IA e Universidade do Porto), coautora do artigo e que contribuiu para a deteção e caracterização do planeta K2-229 b, ele faz parte de uma classe de planetas muito interessante. “É do tipo terrestre mas orbita extremamente perto da sua estrela, algo surpreendente, já que não existem no Sistema Solar. Este é outro excelente exemplo de como a descoberta de planetas extrasolares pode ajudar a compreender a formação do nosso Sistema Solar.”
De facto, as semelhanças com Mercúrio terminam aqui. K2-229 b orbita muito mais próximo da sua estrela, completando uma volta em apenas 14 horas (um ano em Mercúrio dura 88 dias terrestres). Já a sua temperatura durante o dia é mais de quatro vezes superior à da face diurna do planeta mais pequeno do Sistema Solar, podendo atingir os 2000 graus Celsius, o suficiente para fundir ferro.
No sistema K2-229 foram identificados dois outros planetas, K2-229 c e K2-229 d. Este sistema planetário foi detetado através dos dados do telescópio espacial Kepler, da NASA, e confirmado e caracterizado com o espectrógrafo HARPS, do ESO.