Atualmente, só resta a sul do Douro uma pequena população, em Portugal, constituída por menos de 40 lobos. (Foto: DR)

Um artigo publicado esta quinta-feira pela prestigiada revista Scientific Reports, conduzido pelos investigadores do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos da Universidade do Porto (CIBIO-InBIO) , revela que a população de lobo na Península Ibérica está fragmentada em múltiplas subpopulações, e que há pouca dispersão e grande diferenciação genética entre elas.

Dispersar e deixar descendência em territórios distantes é uma característica comum a muitos mamíferos carnívoros. Mas os lobos da Península Ibérica parecem ser pouco aventureiros e muito poucos são os indivíduos que abandonam a região onde nasceram. O resultado é um conjunto de pequenas populações mais isoladas e heterogéneas do que o esperado.

A equipa de investigação, que envolveu os investigadores do CIBIO-InBIO Pedro Silva, Francisco Álvares, Susana Lopes, Helena Rio-Maior, Nuno Ferrand e Raquel Godinho, e um grupo da Universidad de Oviedo (Espanha), chegou a esta conclusão através de um estudo que combinou análises ao ADN – estruturação das populações e os padrões de transferência de genes entre elas – e dados de seguimento de lobos através de dispositivos de localização, ao longo de duas décadas.

“Dada a história recente de fragmentação e declínio do lobo na Península Ibérica, esperávamos que possíveis sinais de estrutura populacional se reflectissem na genética”, explica o investigador do CIBIO-InBIO Pedro Silva, primeiro autor do estudo. E acrescenta: “Os resultados mostram níveis relativamente baixos de transferência de genes entre populações e curtas distâncias de dispersão”.

Através deste estudo, foi possível identificar onze grupos genéticos distintos em toda a área de distribuição desta espécie na Península Ibérica (cerca de 140 mil km2). Os dados de localização indicaram ainda que a grande maioria dos lobos destas populações passou todo o tempo de monitorização junto do grupo genético em que nasceu.

Do estudo à conservação do Lobo ibérico

Mas o que explica, então, este comportamento peculiar dos lobos em Portugal e Espanha? De acordo com os autores do estudo, “a dispersão pode estar a ser condicionada por uma interacção complexa de condições ecológicas e ambientais”, que vão desde a disponibilidade de presas ou a densidade populacional, até factores relacionados com a pressão humana.

No caso dos lobos da Península Ibérica, esta investigação levanta algumas hipóteses que carecem de estudos mais aprofundados para se transformarem em conclusões. “A disponibilidade de
alimento parece não explicar as descontinuidades genéticas identificadas. Contudo, encontrámos sobreposição entre os limites de alguns dos grupos identificados e a rede de rios da
região. Também o facto de várias espécies de pecuária serem relativamente abundantes na zona, pode explicar a manutenção de altas densidades populacionais de lobo com reduzida dispersão”, refere Raquel Godinho, autora correspondente.

A investigadora realça ainda que factores relacionados com a ação humana merecem uma atenção especial, uma vez que “as populações de lobo ibérico têm sido afetadas durante séculos pela perseguição humana e por mudanças de habitat de caracter antropogénico, e, ao contrário do resto da Europa, em alguns locais da Península Ibérica o lobo não está em expansão”.

Nas últimas décadas, as populações de lobo distribuídas a norte do rio Douro mantiveram-se conectadas enquanto que as populações a sul do rio tornaram-se cada vez mais fragmentadas e
isoladas. Atualmente, só resta a sul do Douro uma pequena população, em Portugal, constituída por menos de 40 indivíduos.

Sabendo-se que o isolamento pode interferir na viabilidade das populações, os resultados agora tornados públicos “abrem caminho para um debate sobre a importância de integrar
informações sobre a diversidade genética e a diferenciação populacional na definição de políticas de conservação e gestão do lobo na Península Ibérica”, conclui Pedro Silva.