Diz-se que o primeiro passo para a inovação é a observação da realidade e entender o que faz falta. João Fonseca é o rosto de um conjunto de professores da Universidade do Porto que, olhando para o ecossistema da Saúde, identificou a necessidade de um curso que aliasse a saúde às tecnologias digitais e à inovação. E foi assim que nasceu a Licenciatura em Saúde Digital e Inovação Biomédica, de que é diretor. Prestes a arrancar, já no ano letivo de 2024/2025, trata-se tão somente do segundo curso pré-graduado a ver a luz do dia ao fim de dois séculos da Faculdade de Medicina da U.Porto (FMUP).

Este desafio só foi possível com uma forte equipa. Para além de contar com a retaguarda da FMUP, esta nova Licenciatura beneficia da parceria com outras instituições da Academia, sendo de destacar o papel desempenhado por um importante conjunto de docentes da Faculdade de Farmácia (FFUP) e da Faculdade de Ciências (FCUP) da U.Porto. A estes juntam-se docentes do Departamento de Engenharia Informática do ISEP e da ESEP, bem como investigadores dos Laboratórios associados do perímetro da U.Porto– INESC TEC, i3S e RiSE. Juntos, prometem “formar profissionais com um novo perfil e competências híbridas, fundamentais para operar as necessárias mudanças de paradigma e ajudar a construir a saúde do futuro”.

Licenciado em Medicina, em 1994, João Fonseca concluiu o seu doutoramento, em 2007, e a sua Agregação, em 2015, sempre na FMUP.

Aos novos projetos que abraça de forma entusiástica, João Fonseca alia a docência nesta Faculdade, como Professor Catedrático, e a direção do Departamento de Medicina da Comunidade, Informação e Decisão em Saúde (MEDICIDS). É também investigador do CINTESIS, integrando o Laboratório Associado RISE – Rede de Investigação em Saúde.

Fundador da MEDIDA, uma spin-off da Universidade do Porto, o médico imunoalergologista está à frente da Unidade de Imunoalergologia do Hospital e do Instituto CUF Porto. Como clínico, as suas principais áreas de interesse são a asma e a rinite, a função pulmonar e a inflamação das vias aéreas. Como investigador, tem trabalhado sobretudo nas áreas da Saúde Digital, Inovação Centrada no Doente, Avaliação e Implementação de Tecnologias de Saúde.

Fundou e é Presidente da Associação para a Inovação em Medicina, foi codiretor do Programa Harvard Medical School Portugal e membro da Comissão de Avaliação de Tecnologias de Saúde do INFARMED (Agência Portuguesa do Medicamento).

Assinou mais de 250 publicações, com mais de 8300 citações, e cerca de três dezenas de projetos de investigação, nomeadamente o mINSPIRER – mHealth to measure and improve adherence to medication in chronic obstructive respiratory diseases, o AIRDOC: Smart Mobile Application for Individualized Support and Monitoring of the Respiratory Function and Sounds of Chronic Obstructive Patients e o CARAT – Questionário de controlo da Rinite Alérgica e Asma.

(Foto: DR)

Idade: 54 anos

Naturalidade: Porto

– Do que mais gosta na Universidade do Porto?

A capacidade que tem em contribuir para o desenvolvimento dos estudantes, dos colaboradores, da região e da sociedade. 

– Do que menos gosta na Universidade do Porto?

A burocracia e falta de inovação nos processos e na gestão. Admito que parte seja consequência de ter pouca independência e de ter de padecer dos problemas das instituições públicas (apesar de ser uma fundação). Mas tanto ou mais é falta de arrojo. O conservadorismo do “sempre fizemos assim”.

– Uma ideia para melhorar a Universidade do Porto?

Tornar menos vertical e centralizada a organização e os processos de decisão. Mais importante ainda seria avançar com o esforço, sem dúvida titânico, de ter métricas disseminadas e sistemáticas. Talvez até a começar pelas finanças com uma contabilidade progressivamente analítica, dos cursos aos departamentos, UO e a todo o perímetro UP.

– Como prefere passar os tempos livres?

No campo, com a família ou a tentar tocar guitarra.

– Um livro preferido?

Talvez um bem curto e, infelizmente, de novo muito atual com os populismos: “Animal Farm”, de George Orwell.

– Um disco/músico preferido?

Varia muitíssimo. Neste momento, voltaria a ter como escolha para disco preferido “Dark Side of the Moon”, dos Pink Floyd, e para grupo musical preferido, os “Tool”.

– Um prato preferido?

O prato preferido, então, varia todos os dias!  Hoje, estaria bem filetes de sardinha com arroz de tomate e feijão.

– Um filme preferido?

As preferências de filmes variam um pouco menos. “Interstellar”, de Christopher Nolan, ou quase todos os filmes de Tarantino. 

– Uma viagem de sonho?

Dois meses na Austrália e Nova Zelândia.

– Um objetivo de vida?

Isto de perguntar um só não tem piada. Gostaria de ser como a água, que vai fluindo por onde o terreno quer e precisa. No fundo, ser útil. Acho um bom objetivo de vida. Principalmente, quando já fiz mais do que alguma vez imaginava quando entrei como aluno na FMUP. 

– Uma inspiração?

A floresta. A sua evolução constante, mas tranquila, a sua complexidade e fertilidade são muito inspiradoras para mim.

– O projeto da sua vida?

Nesta pergunta não é sequer um, é “o” projeto de vida! O projeto é ter sempre projetos apaixonantes. E nas paixões, quase sempre a mais recente sente-se como a maior. E no caso, sem dúvida que colaborar na criação e ser o diretor da Licenciatura em Saúde Digital e Inovação Biomédica é um projeto desafiante e apaixonante. É uma responsabilidade, quando ao fim de 200 anos a Faculdade de Medicina inicia um 2.º curso pré-graduado. 

– Porquê uma licenciatura em Saúde Digital e Inovação Biomédica?

Porque fazem falta novos profissionais, intrinsecamente multidisciplinares, que adquiram competências e vivências de saúde, digital e inovação. Este é o tripé chave para encontrar soluções para os desafios que a Saúde enfrenta em todo o mundo. As dificuldades do setor da saúde irão agravar-se e muito e, sem aquele tripé, a que podemos adicionar os dados para as gestões (clínica, de dados/informação, económica, de projeto, de inovação), não será possível inovar o suficiente para as resolver ou pelo menos minorar. É esta a ambição, formar campeões da inovação em saúde, capazes de fazer pontes entre os múltiplos atores dos vários subsetores da saúde, de conhecer realmente o funcionamento dos serviços de saúde, de modo a liderar a construção de soluções. Um enorme desafio para as várias instituições académicas e para as quase 50 dezenas de parceiros de todo o setor da saúde que estão envolvidos nesta nova e inovadora licenciatura a que damos a abreviatura carinhosa de SauD InoB, com pronúncia do Norte, claro.