Ainda criança, sabia que queria ser cientista. Durante a escola primária era um consumidor ávido da Biblioteca Itinerária Calouste Gulbenkian, em Lisboa. As visitas regulares da carrinha eram sempre recebidas com grande excitação e os livros sobre dinossauros e astronomia eram devorados insaciavelmente. Mas foi um microscópio oferecido pelos pais que traçou definitivamente o destino de Carlos Conde. Tinha então nove anos e passava as tardes a observar tudo o que podia através daquelas objetivas rudimentares. Estava fascinado com o conceito de célula e com a existência de microrganismos como agentes causadores de doença. Sem grande surpresa, a predileção pela Química e pela Biologia acompanhou-o até à conclusão do ensino secundário.

Não foi difícil escolher o curso superior. Dois anos antes, em 1996, havia sido criada na Universidade do Minho a Licenciatura em Biologia Aplicada, cujo plano curricular incluía as disciplinas de Citologia, Microbiologia, Genética, Biologia Molecular, Engenharia Genética, Imunologia e Virologia Aplicada. Foi tudo o que bastou. A escolha estava feita e o plano (ingenuamente) definido: quando concluísse o curso, Carlos iria trabalhar para o Centers for Disease Control and Prevention (CDC) em Atlanta, algo que nunca se concretizou. Queria muito fazer investigação em doenças infeciosas, o que o levou ainda a ingressar em Medicina na FMUP. Acabou por desistir, desiludido com a monotonia de algumas disciplinas e o culto da memorização.

Curiosamente, o percurso académico de Carlos Conde levou-o para outras áreas do conhecimento. Um ano após a conclusão da licenciatura, iniciou o seu projeto de Doutoramento em Biologia Molecular, na Universidade do Minho, em colaboração com a Universidade de Poitiers, em França. O trabalho foi desenvolvido sob a orientação de Hernâni Gerós e conduziu à identificação e caracterização molecular de um novo mecanismo usado pelas células para captar glucose do meio circundante. Os resultados contribuíram também para perceber como é que as células conseguem sentir a disponibilidade de açúcar e, em função desta, regular várias vias bioquímicas. A relevância destas descobertas foi distinguida pela Embaixada de França e pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) com a atribuição do prémio de mérito científico «Celestino da Costa/Jean Perrin».

Com a conclusão do Doutoramento, em 2007, teve a oportunidade de começar a lecionar Biologia Molecular no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) da Universidade do Porto, onde é Professor Auxiliar convidado. É também ali que, diariamente, procura transmitir de «forma relaxada, mas apaixonada», as bases da Biologia Molecular a futuras gerações de bioquímicos e bioengenheiros.

A ligação de Carlos Conde à U.Porto está, de resto, associada a Claudio Sunkel, docente do ICBAS e uma referência mundial na área do ciclo celular e a quem atribui responsabilidade por hoje dedicar grande parte do seu tempo a tentar perceber como é que as células se dividem. Na verdade, foi numa palestra do também diretor do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde(i3S) que viu pela primeira vez em filme uma célula em mitose. Havia sido captada por um microscópio confocal e mostrava um processo em que os cromossomas interagiam com os microtúbulos e movimentavam-se como que se de uma coreografia se tratasse. Foi naquele momento que Carlos decidiu que queria dedicar o pós-doutoramento a dissecar os mecanismos moleculares que garantem a distribuição equitativa do material genético. Em 2015, obteve financiamento da FCT para liderar a sua equipa de investigação no i3S onde, em colaboração com outros grupos e de forma multidisciplinar, tenta perceber como determinadas falhas nesses mecanismos conduzem ao desenvolvimento de cancro. Nesse sentido, publicou recentemente na prestigiada revista científica Journal of Cell Biology um estudo onde identifica um novo mecanismo usado pelas células para impedir erros na divisão dos cromossomas.

Em 2019, foi também distinguido pela revista científica eLife com um «Ben Barres Spotlight Award» pela excelência da sua investigação. O investigador assume que tem como objetivo «gerar conhecimento científico fundamental que possa alicerçar o desenvolvimento de terapias mais seletivas e eficazes no combate ao cancro. Estaremos mais capacitados para eliminar células cancerígenas quão melhor percebermos a sua origem e evolução».

Naturalidade? Lisboa

Idade? 39 anos

– Do que mais gosta na Universidade do Porto?

Dos meus alunos. Leciono no ICBAS desde 2007 e poder partilhar conhecimento científico com uma turma que queira ouvir, pensar e discutir continua a ser das melhores sensações que tenho experienciado em todo o universo Universidade do Porto. Talvez tenha sorte, mas todos os anos tenho o privilégio de poder contactar com alunos fantásticos que fazem com que eu saia da sala de aula mais realizado do que quando entrei. Estendo igual aprazimento aos estudantes de Mestrado e Doutoramento que tenho (e aos que já tive) o prazer de orientar. A minha equipa é atualmente composta por quatro estudantes de Doutoramento absolutamente notáveis, cuja motivação e dedicação tem sido a base do nosso sucesso. O Nelson, a Margarida, a Ana e a Sofia fazem do nosso laboratório um local de discussão científica excitante, de camaradagem e de muita diversão.

– Do que menos gosta na Universidade do Porto?

Da precariedade em que mantém muitos dos seus docentes e investigadores. Tenho ainda a lamentar que muito do equipamento nos centros de investigação é agora obsoleto e em número manifestamente reduzido. Estas condições minimizam a nossa competitividade científica e atrasam o progresso do conhecimento.

– Uma ideia para melhorar a Universidade do Porto?

Acabar com a precariedade em que mantém muitos dos seus docentes e investigadores. Se a Universidade pretende providenciar um ensino de qualidade e desenvolver investigação de forma competitiva, tem de perceber que a precariedade não funciona. É igualmente necessário reequipar os centros de investigação.

– Como prefere passar os tempos livres?

A ver séries e filmes. Ultimamente tenho dedicado mais tempo a jogos de tabuleiros de estratégia.

– Um livro preferido?

«A leste do paraíso», de John Steinbeck.

– Um disco/músico preferido?

«Boxer», dos The National, e «OK Computer», dos Radiohead.

– Um prato preferido?

Cozido à Portuguesa.

– Um filme preferido?

Tenho dois: «Silêncio dos Inocentes», do Jonathan Demme e «12 Angry Men«, do Sidney Lumet.

– Uma viagem de sonho (realizada ou por realizar)?

Uma delas realizei recentemente. Tive o privilégio de poder visitar o Serengeti (África Oriental) e Ngorongoro (Tanzânia) Por realizar: Patagónia (Argentina e Chile).

– Um objetivo de vida?

Continuar a ser feliz e de forma alguma contribuir para que os que me rodeiam sejam infelizes.

– Uma inspiração? (pessoa, livro, situação…)

A “minha” querida Mariana.

– O projeto da sua vida…

Não posso dizer que tenha. Não sinto que viva com um propósito definido. Existo simplesmente, e espero continuar a fazer as coisas que me deixam feliz e realizado, sem que isso seja imposto pela concretização de objetivos auto-definidos.

– Uma ideia para promover a investigação da U.Porto a nível internacional?

A melhor promoção é a qualidade. A qualidade da investigação de uma Universidade não se consegue com precariedade. Uma ideia: abertura de concursos internacionais transparentes para posições de investigação com salário competitivo e condições de trabalho decentes. Se a Universidade do Porto atrair os melhores e valorizar os seus próprios investigadores, a qualidade da investigação fará a desejada promoção.