Contam-se pelos dedos de uma mão os casos graves de infeção relatados em Portugal, mas a verdade é que somos o país do mundo com o maior número de alergias por habitante, devido ao grande contacto com Anisakis spp. Estes vermes são parasitas marinhos muito associados ao sushi, prato cada vez mais apreciado pelos portugueses.

“Este verme muito frequentemente enrolado no meio do músculo e à volta das vísceras do peixe. Se, ao arranjarem o peixe em casa, virem muitos vermes à volta das vísceras, o melhor é descartá-lo”, aconselha Maria João Santos, professora do Departamento de Biologia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto e investigadora do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR).

Estes parasitas são delgados e transparentes e são mais fáceis de detetar quando se encontram enrolados, formando uma pequena mancha amarelada ou esbranquiçada, que se destaca no meio do músculo. “No Japão, como o problema das infeções é muito grave — há muitos casos detetados por ano — os cozinheiros fazem um curso de cerca de sete anos, onde são acompanhados por chefs mais experientes que lhes ensinam todos os cuidados a ter com o peixe”. Temo que os cuidados em Portugal não sejam tão apertados”, alerta a docente, que vem estudando o Anisakis spp a partir do Laboratório de Patologia Animal da FCUP.

Em alternativa, sugere Maria João Santos, é sempre preferível utilizar peixe congelado no sushi. “Um dos cuidados a ter poderá ser congelar o peixe a -20ºC durante 24 horas para matar os vermes”, explica. Desta forma é possível evitar uma infeção grave no estômago ou intestinal, mas não uma alergia, “porque, mesmo mortos, os parasitas podem causar reações alérgicas”.

Quem comprar sushi já preparado no supermercado, por exemplo, pode optar por congelá-lo antes do consumo. Se o congelador não atingir mesmo os – 20ºC, será importante prolongar o tempo de congelação por mais alguns dias, por questões de segurança.

Como evitar que o parasita chegue ao consumidor

Na FCUP, recentemente, realizou-se um inquérito sobre a segurança do peixe cru ou mal-cozinhado, num projeto conjunto com a Universidade Estadual de Goiás, no Brasil. Os dados estão a ser analisados pelos investigadores e por uma bolseira da European Food Safety Authority para “determinar o potencial de risco de infeção, neste caso da população da Universidade do Porto, tendo em conta fatores como a espécie de peixe, a frequência do consumo, ou até, o conhecimento que têm do verme”.

Para a equipa de Maria João Santos, é fundamental perceber, em todas as etapas da comercialização do pescado, desde a pesca até ao consumidor, o que é possível fazer para evitar que o parasita chegue até ao consumidor.

Por exemplo, na restauração, uma das ações poderia passar por deixar, junto dos restaurantes asiáticos, algumas recomendações, com base na investigação. É o caso das espécies de peixe escolhidas como ingredientes do sushi. Como nem todas estão contaminadas do mesmo modo, seria preferível escolher sempre as espécies mais saudáveis, e por isso mais seguras para o sushi.

“Sabe-se que o salmão, por exemplo, pode ter alguns parasitas, mas há espécies mais “limpas” como o ruivo, ou até alguns peixes criados em aquacultura, que podem ser utilizadas com maior segurança”, exemplifica Maria João Santos.

“A nossa ideia era fazer inquéritos também nos restaurantes asiáticos, para ver que cuidados eles têm com o peixe, que espécies usam com maior frequência, e chegámos já a fazer algumas visitas, mas a maior parte deles não percebeu que éramos da Faculdade de Ciências e retraíram-se, pois pensaram que éramos da ASAE”, conta. “Creio que o problema da língua foi também uma limitação nesta tarefa, e no estabelecimento de comunicação, pois muitos proprietários são asiáticos e não dominam bem o Português”, acrescenta.

O consumo de sushi ou, noutras circunstâncias, de peixe cru ou mal cozinhado, sem os cuidados descritos, pode causar infeção grave, a anisaquíase. Esta zoonose provoca fortes dores abdominais, vómitos e diarreia, urticária, e, por vezes até reação anafilática.

“O problema do diagnóstico destas infeções é que os sintomas passam muitas vezes despercebidos por serem confundidos com os de outras doenças”, alerta Maria João Santos. “Como até há pouco tempo não havia nenhum caso grave relatado em Portugal, e não temos grande hábito de comer peixe cru, pensava-se que nós não tínhamos esta doença.

“É preciso ensinar as pessoas, em particular os cozinheiros e os funcionários das peixarias, que nos arranjam o peixe todos os dias, a conhecer o verme, e no caso de ser detetado em grande número descartar imediatamente esse peixe, a bem da segurança alimentar”, remata Maria João Santos.