Um estudo do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto (ICBAS-UP), inserido no Projeto ATLANTIDA (financiado pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) através do Programa NORTE 2020), e recentemente publicado na revista Marine Pollution Bulletin, demonstrou que o uso de pesticidas provenientes da prática agrícola ainda tem um impacto negativo significativo no rio Ave.

Aquele que era, há cerca de 30 anos, um dos rios mais poluídos do país e da Europa, fruto das descargas da indústria têxtil característica daquela região, continua hoje a enfrentar problemas relacionados com a poluição provocada pela exploração agrícola localizada na sua bacia hidrográfica.

Para Maria João Rocha, a responsável pelo estudo, estes resultados são muito relevantes, no sentido em que se associa a poluição no Rio Ave à presença de indústrias, esquecendo-se muitas vezes que os efluentes que aí desaguam provêm também de zonas agrícolas.

“Apesar das concentrações atuais de pesticidas serem inferiores às registadas noutro estudo publicado em 2002, continuam a utilizar-se quantidades demasiado altas destes compostos na bacia do Ave. Verificámos que 38% dos compostos analisados mantêm-se acima das concentrações recomendadas pela legislação portuguesa. Além disto, foram ainda encontrados pesticidas não autorizados e/ou banidos na União Europeia devido à sua toxicidade e/ou carcinogenicidade”, aponta a docente do ICBAS .

Maria João Rocha é a investigadora responsável pelo estudo. (Foto: DR)

Este estudo, realizado ao longo de um ano, procedeu à colheita e análise de 56 pesticidas (fungicidas, herbicidas e inseticidas) em amostras de água e material particulado em suspensão em oito zonas chave (perto de efluentes do rio Ave, no seu estuário e junto à zona costeira).

Estes resultados são “preocupantes”, uma vez que colocam em risco a estabilidade deste ecossistema e, em última análise, podem constituir um problema de saúde pública. “Isto poderá suceder, quer por via do consumo de alimentos contaminados (vegetais e animais), quer pelo contacto físico com estas águas ou com os próprios pesticidas no momento da sua aplicação por agricultores”, refere a investigadora.

Para Maria João Rocha, este trabalho reflete a necessidade de se implementarem ações globais, “que passam pela identificação das fontes de contaminação, até ao fornecimento de informação detalhada sobre os componentes dos pesticidas a todos os seus utilizadores, desde agricultores, até aos que os usam esporadicamente nos seus jardins e/ou espaços públicos”.

Além disto, a forma de utilização e cuidados a ter no seu uso também são fulcrais, pois estes compostos também podem entrar no nosso organismo por contacto dérmico e inalação.

“Estas medidas, em conjunto com um aumento da vigilância local, são pontos de partida essenciais para se contribuir para despoluir esta região e melhorar a qualidade do ecossistema e da vida de animais e humanos, numa perspetiva ‘One Health”, nota Maria João Rocha, acrescentando que “a continuidade da monitorização de pesticidas no Ave poderá aferir do sucesso das políticas”.