Em Portugal, mais de 50% da população tem excesso de peso. Números que não diferem muito entre homens e mulheres (em 2019, 58.6% homens e 49.8% mulheres, segundo dados do INE). No entanto, são as mulheres quem mais procura ajuda (cerca de 80% dos pacientes), sendo uma das razões a fertilidade.

“Sabemos que a obesidade diminui a fertilidade, e que muitas vezes o tratamento da infertilidade passa pela perda de peso. Por isso, temos mulheres em consulta, com idades a rondar os 30 anos que procuram tratamento por questões de infertilidade, ou porque sabem que uma gravidez na presença de obesidade acarreta risco de complicações para a mãe e para a criança. Portanto, temos cada vez mais mulheres que passam por uma gravidez depois de uma cirurgia bariátrica”,  explica a médica endocrinologista Mariana Monteiro, docente do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto (ICBAS) e responsável pela Unidade Multidisciplinar de Investigação Biomédica (UMIB).

As cirurgias bariátricas,  observa a docente, trazem grandes benefícios na resolução de complicações da obesidade durante a gravidez – nomeadamente contribuindo para a diminuição do risco de hipertensão e diabetes. No entanto, “o resultado desta cirurgia, apesar de vantajoso para uma gravidez, não é inócuo, verificando-se um risco aumentado de diminuição do crescimento fetal ou anemia materna”.

“Ora, se uma mulher, apesar de ter sido operada, continuar com obesidade antes da gravidez, incorre em dois riscos: o da obesidade e o decorrente da cirurgia. Por esse motivo é tão importante ter em conta o Índice de Massa Corporal (IMC) pré concecional, tentar otimizar a perda de peso antes da gravidez e a necessidade de um acompanhamento reforçado durante a mesma”, refere Diana Rodrigues Martins médica obstetra no Centro Materno-Infantil do Norte (CMIN), docente do ICBAS e responsável pelo estudo agora divulgado na revista Obesity Research & Clinical Practice.

Diana Rodrigues Martins apresentou o trabalho no Congresso Português de Obesidade. (Foto: DR)

Intervenção “caso a caso”

Foi para acompanhar estas mulheres, atualmente cerca de 30 por ano, que o CMIN, pelas mãos de Diana Rodrigues Martins, criou em 2019 a Consulta de Medicina Materno Fetal – Obesidade e Gravidez. Esta consulta conta com uma equipa multidisciplinar “com especialidade de obstetrícia, nutrição, endocrinologia, psicologia, além de uma equipa de enfermagem que garante o apoio e vigilância destas gravidezes, uma vez que a cirurgia bariátrica acarreta várias particularidades do ponto de vista de acompanhamento”, explica a médica obstetra.

Para Mariana Monteiro, é fundamental a vigilância apertada e acompanhamento multidisciplinar de mulheres após terem sido submetidas a cirurgia bariátrica: “a avaliação pré concecional destas mulheres e um acompanhamento dirigido que tenha em consideração as necessidades nutricionais antes e durante a gravidez, mas também que tenha em linha de conta o IMC na pré conceção e na gravidez é muito importante. A nossa intervenção tem que ser adequada caso a caso”, refere a responsável da UMIB.

“A saúde com que uma mulher engravida determina a saúde do seu filho”

O Dia Mundial da Obesidade (4 de março) foi instaurado pela Federação Mundial da Obesidade, com o objetivo de consciencializar a sociedade sobre a doença, promovendo a mobilização e ação conjunta para a elaboração e implementação de políticas públicas que contribuam para a sua redução.

No mês em que se comemora o Dia Internacional da Mulher (8 de março) o ICBAS alerta também para o risco da doença do século XXI na gravidez e na saúde da mulher, realçando a necessidade de apostar na prevenção e na literacia em saúde.

Nas palavras de Diana Rodrigues Martins, médica e docente do ICBAS, “a saúde de um indivíduo começa nos primeiros 1.000 dias de vida, ainda no útero da mulher. O metabolismo e a saúde endócrina da mulher vão programar o metabolismo da criança e do adulto. Por isso, a saúde com que uma mulher engravida determina a saúde do seu filho, que começa na pré-conceção.”