Hélder Oliveira, professor do Departamento de Ciência de Computadores da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) e investigador do Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência (INESC TEC), está à frente de um projeto europeu que vai desenvolver ferramentas e modelos computacionais baseados em Inteligência Artificial (IA) para otimizar a categorização de pacientes, aperfeiçoando diagnósticos e tratamentos. Totalmente focado em doenças do foro pulmonar, o Ai4Lungs é liderado pelo INESC TEC e conta com um financiamento de 6,9 milhões de euros, liderado pelo INESC TEC.

Neste projeto de grande envergadura, que se estenderá ao longo dos próximos três anos e meio, os investigadores vão integrar dados médicos, imagens e entradas inovadoras de estetoscópios digitais. Para tal. serão instalados dois pilotos, um deles em Portugal – no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/ Espinho (CHVNGE) -, que incluirá também a introdução de uma técnica de diagnóstico denominada biopsia líquida, desenvolvida pelo i3s (Instituto de Investigação e Inovação em Saúde) como primeira linha de diagnóstico.

O projeto Ai4Lungs surge como uma resposta inovadora e crucial para abordar os desafios associados à proliferação de doenças do foro respiratório, sejam elas relacionadas com cancro ou com doenças intersticiais e condições inflamatórias (pneumonia viral e bacteriana, incluindo COVID-19). O objetivo passa por facilitar o processo clínico de pacientes com algum sintoma de doença respiratória, reduzindo custos e otimizando a alocação de recursos.

Apoiar desde o diagnóstico até ao tratamento

Ao desenvolver novas ferramentas de inteligência artificial, recorrendo a diferentes tipos de dados recolhidos na prática clínica, tais como auscultação pulmonar, raio-X, TAC, análises clínicas, dados demográficos e clínicos, por exemplo, o projeto será fundamental para apoiar os médicos durante o diagnóstico e tratamento do doente, de modo a tentar guiá-lo neste processo que muitas vezes pode ser moroso e com a necessidade de vários exames.

“Este é um projeto virado para o pulmão como um todo”, explica Hélder Oliveira, sublinhando que “a ideia é que a partir do momento em que um doente tem alguma consulta, o sistema consiga apoiar todo o processo de estratificação e perceber o que é a doença e se é necessário fazer mais exames para a diagnosticar”.

Em termos práticos, o projeto atua em duas frentes. Por um lado, desenvolvendo tecnologias com vista à melhoria dos dispositivos que são usados no diagnóstico e, por outro, integrando todas as novas ferramentas numa única plataforma capaz de acompanhar toda a decisão clínica com o objetivo de tornar o processo mais rápido e menos exaustivo a nível de custos e de exames complementares.

“Esta plataforma, a que chamamos de “digital-twin”, vai ter acesso aos dados dos hospitais do projeto e replicar todo o processo clínico em paralelo, sugerindo recomendações aos médicos sem intervir com a normal prática clínica”, adianta Duarte Dias, investigador do INESC TEC. A inovação, garante, prende-se com a agregação de várias tecnologias que até aqui eram trabalhadas de forma individual.

Duas tecnologias da U.Porto em destaque

O Ai4Lungs vai ainda mais longe ao pretender utilizar duas tecnologias que nunca foram utilizadas em projetos deste género. Uma é a auscultação digital, que é feita pelo INESC TEC, e a outra consiste na introdução da biópsia líquida do i3s nestes sistemas de suporte à decisão.

Segundo Hélder Oliveira, em casos de cancro, por exemplo, “muitas vezes a biopsia líquida é utilizada quase sempre em cancro mais avançados e nós queremos introduzi-la na frente de ataque para perceber o tipo de cancro, em vez de se optar por dezenas de exames”.

“Como o pulmão tem diferentes especialidades, às vezes perde-se muito tempo a fazer o diagnóstico de um paciente e são feitos muitos exames que nem sempre eram necessários. Com este projeto tentaremos colmatar o uso de exames desnecessários e, ao mesmo tempo, diminuir o tempo desde que o paciente chega à consulta até ao momento em que sabemos o que ele tem”, adianta Duarte Dias.

Já habituado a trabalhar com biópsia líquida, o CHVNGE surge, assim, como um parceiro de extrema importância onde será possível testar o funcionamento da plataforma de apoio à decisão, assim como o Mor Research, Rabin Medical Center, em Israel.

“Existem vários sistemas que dão apoio aos médicos a vários níveis, e o próprio INESC TEC tem vindo a desenvolver várias tecnologias neste sentido a nível do raio-X e TAC pulmonar”, asseguram os investigadores. O que não existe, referem, “é uma visão destes sistemas direcionada para a estratificação como um todo, nem a integração destes vários sistemas. Esta nova contribuição do projeto em conjunto com todo o conceito de “digital-twin” é a grande inovação que pretendemos desenvolver”.

O projeto, descreve o INESC TEC em comunicado, conta com mais 17 entidades parceiras, duas delas portuguesas: o CHVNGE e o I3s. O AI4Lungs teve início a 1 de janeiro, estendendo-se durante 42 meses.