João Lobo, professor convidado do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) da Universidade do Porto e médico interno de Anatomia Patológica do Instituto de Oncologia do Porto (IPO Porto), participou num estudo internacional que teve como objetivo avaliar a prevalência da imunoexpressão do biomarcador GATA3, especificamente no cancro da próstata metastático.
O trabalho foi desenvolvido pelo clínico português durante o estágio em Uropatologia nos Estados Unidos da América, na Universidade de Alabama em Birmingham, onde teve “o privilégio de ver casos com os especialistas de renome internacional em Uropatologia, George Netto e Cristina Magi-Galluzzi”.
O trabalho liderado por Cristina Magi-Galluzzi visou reunir uma série de 163 cancros da próstata metastáticos provenientes de três centros diferentes: da Universidade do Alabama em Birmingham, da Universidade de São Rafael em Milão e do Serviço de Anatomia Patológica do IPO Porto.
A partir da análise realizada, verificou-se que a expressão forte do biomarcador – GATA3 – se manifestou em quatro tumores (2,5%): duas metástases no fígado, uma no osso e uma num gânglio linfático não regional. Todos estes tumores eram pouco diferenciados, refletindo-se no seu diagnóstico como um Grupo de Graduação 5.
O cancro da próstata é o cancro mais prevalente no homem em todo o Mundo. Clinicamente, há uma necessidade de realizar um bom diagnóstico diferencial entre cancro da próstata e cancro da bexiga em homens de idade avançada que se apresentem com sintomas sugestivos de uma neoplasia do trato urogenital. Isto reveste-se de enormes implicações clínicas, dado que o prognóstico e a terapêutica a realizar são muito diferentes.
Contudo, a distinção entre estas entidades nem sempre é linear, pois a apresentação clínica e os resultados imagiológicos podem ser algo sobreponíveis. De igual forma, no exame histológico, a distinção entre estes tumores pode ser desafiante, tal como se pode tornar mais problemático no contexto de metástases, em tumores pouco diferenciados. Os médicos anatomopatologistas recorrem, na sua rotina diária, a painéis de imunohistoquímica para diferenciar estas entidades.
A Sociedade Internacional de Patologia Urológica (ISUP) recomenda a realização de um painel de imunohistoquímico alargado. Um dos marcadores deste painel é o GATA3, que é um fator de transcrição envolvido na diferenciação de vários tecidos, em particular do urotélio, o epitélio (ou a camada tecidual) especializado que recobre a bexiga. Por essa razão, é usado na rotina diagnóstica em anatomia patológica como um biomarcador de cancro urotelial da bexiga. Contudo, a expressão aberrante de GATA3 noutros tumores tem vindo a ser crescentemente demonstrada, pelo que este marcador poderá não ser tão específico como se previa.
Desta forma, o trabalho veio chamar a atenção para a necessidade de utilizar um painel de diagnóstico diferencial amplo, combinando vários marcadores de cancro da próstata (como o PSA, PSAP, NKX3.1) com marcadores de cancro da bexiga (como o p63, uroplakin II e GATA3).
A utilização isolada do GATA3 para esclarecimento diagnóstico não é aconselhada, dado que este marcador pode ser expresso aberrantemente no cancro da próstata, levando a um falso diagnóstico de cancro da bexiga, com implicações no tratamento dos doentes.
De futuro, o investigador refere que “será necessário continuar a apostar em desenvolver biomarcadores robustos, altamente sensíveis e específicos para o diagnóstico de cancros geniturinários, em particular detetáveis de modo não invasivo em amostras de sangue ou urina!”.
O contributo da anatomia patológica enquanto especialidade médica é fundamental para este trabalho de descoberta e validação de biomarcadores, permitindo desta forma oferecer os melhores cuidados aos doentes.
Sobre João Lobo
Formado em Medicina e doutorado em Patologia e Genética Molecular pelo ICBAS, João Lobo é docente convidado do Instituto e médico interno no IPO Porto.
Ao longo do seu percurso académico, recebeu vários prémios, incluindo o Prémio Professor Armando Moreno e o Prémio Patrono Rotativo – Professor Carlos Vasconcelos. Já a nível profissional, conquistou, entre outros, o “Tom Voûte Young Investigator Award 2019”, o “Prémio Banco Carregosa / SRNOM”; o “Prémio MSD de Investigação e Saúde, o “Prémio Rui Osório de Castro / Millennium BCP e o “Cancers 2022 PhD Thesis Award”.
Atualmente, é Investigador Júnior do grupo de investigação em Epigenética e Biologia do Cancro (GEBC) do IPO-PORTO, liderando a linha de investigação na área dos tumores do testículo. É autor de 114 artigos científicos em revistas internacionais e de oito capítulos de livro.
Para além disso, é vice-presidente do Grupo Young Investigators do Consórcio de tumores de células germinativas MaGIC – “Malignant Germ Cell International Consortium”, membro do Grupo Young Academic Urologists – Penile and Testis Cancer Group da European Society of Urology, e membro dos Alumni da Sociedade Europeia de Patologia. Entre 2022 e 2023, integrou a Direção da Associação Portuguesa de Investigação em Cancro (ASPIC).