Estudante na Faculdade de Medicina da U.Porto, Jorge Félix Cardoso é um dos mais jovens investigadores do CINTESIS. (Foto: DR)

Aos 23 anos, Jorge Félix Cardoso é um dos mais jovens investigadores do CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde. Estuda Medicina na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) e Filosofia Política na Universidade do Minho, escreve pontualmente para alguns órgãos de comunicação social e marca presença em inúmeras ações de cariz internacional relacionadas com saúde.

Determinado e empenhado em resolver problemas à escala nacional e internacional, Jorge acabou por “saltar” o último ano do curso de Filosofia, encontrando-se a fazer o Mestrado em Filosofia Política. A sua tese sobre Desigualdades em Saúde ambiciona adaptar as teorias da justiça ao domínio da saúde e, portanto, procura perceber até onde é obrigação do Estado intervir para corrigir desigualdades ao nível da saúde.

A nível internacional foi começando a ganhar experiência desde cedo. Em 2016 representou a Associação Nacional de Estudantes de Medicina (ANEM) no Encontro Regional Europeu de Estudantes de Medicina, na Grécia, e fez um workshop sobre Policy Writing e Advocacy, o que o consciencializou para o poder de representar as pessoas através do desenho de boas políticas de saúde. No ano passado, conseguiu integrar a delegação da Federação Internacional de Associações de Estudantes de Medicina (IFMSA) à Assembleia Mundial da Saúde (AMS), em maio, e à World Health Summit, em outubro, a representar 1,2 milhões de estudantes de Medicina de todo o Mundo. Mais recentemente, concorreu à delegação ao Conselho Executivo da Assembleia Mundial de Saúde, onde são traçadas as grandes linhas políticas da saúde a nível global.

Não se preocupa com o cargo que vai desempenhar no futuro, desde que tenha impacto na sociedade e sinta que está a contribuir para resolver algum dos assuntos que o preocupam, focando-se maioritariamente na saúde. Neste momento, preocupa-se com as questões à escala global relacionadas com o acesso desigual aos cuidados de saúde e aos medicamentos, com as más condições de vida que causam doença e sofrimento e com a sabida ligação entre a saúde e as alterações climáticas.

Jorge acredita que a forma como a sociedade está construída tem um impacto muito maior na saúde do que o cuidado pontual que os hospitais vão tendo, defendendo uma visão extra-hospitalar da mesma. Assim, orgulha-se da posição que a IFMSA tenta promover junto da OMS, de um olhar para a saúde que inclua determinantes sociais, políticos e comerciais. Orgulha-se ainda por viver num país onde não é negado o direito aos cuidados de saúde a ninguém, algo que acontece em poucos países do Mundo.

O que o preocupa estudar enquanto investigador do CINTESIS é o tipo de regulamentação e o tipo de mecanismos de governação que deve existir para acompanhar o crescimento das soluções de inteligência artificial e a automatização dos diagnósticos e das ferramentas terapêuticas. Entende ainda que faz falta à Academia Portuguesa e aos Centros de Investigação um maior empenho em transformar a evidência que produzem em políticas públicas.

Com muitos sonhos, projetos e dedicação à mistura, Jorge acaba por não ter tanto tempo livre como gostaria, considerando que ainda não sabe como equilibrar a sua vida profissional e pessoal, já que ambas as vidas se misturam muito e muitas das coisas que faz começaram por ser hobbies que se profissionalizaram. No entanto, não esconde que de vez em quando tem de “pôr um travão forte” em si mesmo.

Naturalidade? Gaia, Portugal

Idade? 23 anos

– De que mais gosta na Universidade do Porto?

Do enorme talento que passou e passa pelos corredores da Universidade, um potencial que me deixa esperançoso quanto ao seu futuro.

– De que menos gosta na Universidade do Porto?

A rigidez institucional, nomeadamente no que toca à separação entre Unidades Orgânicas. É crucial que se partilhem recursos e se esbatam barreiras entre as várias Faculdades, gerando melhores resultados pedagógicos, na investigação, e na dinamização da comunidade que serve de casa à Universidade, a cidade do Porto.

– Uma ideia para melhorar a Universidade do Porto?

Reduzir barreiras à multidisciplinaridade, já que é nas áreas de interface que está à espreita muito do progresso. É importante permitir que os estudantes diversifiquem os seus currículos e aproveitem a oferta formativa de toda a universidade para criarem perfis diferenciados e capazes de fazer a diferença num mundo extremamente competitivo – e não basta que isso seja uma possibilidade no regulamento, é preciso que haja condições para o fazer. A ideia de Abel Salazar, sobre o conhecimento de uma única área em isolamento não ser suficiente, ainda não está presente nos currículos da Universidade.

– Como prefere passar os tempos livres?

O tempo livre não é muito, e isso tem-me ensinado também a importância de desacelerar periodicamente o ritmo, um aspeto muitas vezes negligenciado (contra mim falo). Guardo esses momentos para estar com os amigos e família, ou para me afastar um pouco da azáfama do mundo, acompanhado por um livro ou pela guitarra.

– Um livro preferido?

“À Espera no Centeio”, de J. D. Salinger. Em português, talvez a “Aparição”, do Vergílio Ferreira, tenha sido o que mais me marcou ultimamente.

– Um disco/músico preferido?

Neste momento tenho ouvido muito Tom Misch, Jorja Smith e – uma referência da minha terra Natal – o grande David Bruno. Mas é algo que tende a variar muito.

– Um prato preferido?

Impossível escolher um. Fica mais fácil nos doces, basta ter creme de ovos.

– Um filme preferido?

Prefiro nomear um filme que me parece muito pertinente nos dias de hoje: “Dr. Strangelove or: How I Learned to Stop Worrying and Love the Bomb”, o Kubrick.

– Uma viagem de sonho?

Sou fanático por viagens de comboio, por isso teria de escolher, ou o Transiberiano, ou o Belmond Andean Explorer.

– Um objetivo de vida?

Contribuir para que a saúde seja um bem universal, disponível a todos. Olhando para o mundo vemos que as desigualdades em saúde são gritantes, e que temos realidades danosas causadas por fenómenos opostos: uns sem acesso a medicamentos, outros a sofrer com a polimedicação; uns a sofrer de desnutrição, outros obesos. Quero trabalhar para permitir a mais pessoas no mundo uma vida com maior qualidade, com acesso a cuidados de saúde, e com a possibilidade de manter um estilo de vida que promova a saúde, coisa que hoje não acontece.

– Uma inspiração? (pessoa, livro, situação…)

Um nome algo esquecido, mas que me parece essencial nos dias de hoje: Dag Hammarskjöld. Talvez o melhor secretário-geral das Nações Unidas, um estadista que sempre lutou para que os conflitos se resolvessem através do consenso e que usou a política para construir um mundo melhor, pisadas que procuro seguir.