Um estudo internacional no qual participou Paulo Célio Alves, docente do Departamento de Biologia da Faculdade de Ciências (FCUP) e investigador do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (BIOPOLIS-CIBIO) da Universidade do Porto, mostra que os atuais esforços de monitorização da diversidade genética na Europa são incompletos e insuficientes. Os investigadores têm-se centrado particularmente nas regiões que serão especialmente relevantes para a adaptação ao aumento do calor e da seca, resultantes das alterações climáticas.

Publicado recentemente na prestigiada revista Nature Ecology & Evolution, este trabalho analisou a monitorização da diversidade genética na Europa, identificando o que cada país o faz e quais e quantas espécies são abrangidas. O estudo foi realizado por 52 cientistas que representam 60 universidades e institutos de investigação de 31 países.

Cada ser vivo do nosso planeta distingue-se dos seus semelhantes por pequenas diferenças no seu material hereditário. Assim, quando o ambiente muda e se torna desfavorável para as populações de organismos, esta variabilidade genética pode permitir-lhes adaptarem-se às novas condições, em vez de se extinguirem ou terem de migrar para outros habitats. Em termos simples, a diversidade genética é, portanto, uma das chaves para a sobrevivência das espécies.

No estudo agora publicado, para além da falta de trabalhos de monitorização genética, os cientistas concluíram que os que existem são fortemente enviesados do ponto de vista taxonómico.

Como era de esperar, encontrámos projetos de monitorização principalmente dirigidos a grandes carnívoros, como o urso pardo ou o lobo, espécies icónicas que também têm relevância política. Não há praticamente informação sobre espécies de outros grupos animais, como por exemplo aves, anfíbios, insetos, moluscos, bem como de plantas. Esta situação de quase total ausência de informação é principalmente preocupante em locais com extremos climáticos e com elevada biodiversidade, como acontece em Portugal”, concretiza Paulo Célio Alves.

A diversidade genética é crucial para que as espécies se adaptem às alterações climáticas. (Foto: DR)

Informação crucial para a conservação das espécies

Esta informação e análise da diversidade genética e das suas alterações ao longo do tempo em populações periféricas do ponto de vista climático é especialmente importante para a conservação, pois permite a tomada de medidas para proteger as populações.

As espécies que têm populações nos limites climáticos da sua área de distribuição têm maior probabilidade de albergar variantes genéticas favorecidas pela seleção natural para lidar com estas condições adversas. Por isso, estas regiões ecologicamente periféricas podem funcionar como reservatórios a partir dos quais, através do fluxo genético, as variantes adaptativas se podem disseminar para as populações da área de distribuição principal que serão afetadas mais tarde pelas alterações climáticas. Desta forma, segundo os investigadores, é possível aumentar a resiliência global das espécies.

Os resultados, como enfatiza o BIOPOLIS-CIBIO em comunicado, mostram que as atividades de monitorização são incompletas e precisam de ser complementadas. Em especial no sudeste da Europa (Turquia e Balcãs), são necessários mais esforços, uma vez que esta região está sub-representada, mas, ao mesmo tempo, é fortemente afetada pelas alterações climáticas e, por conseguinte, alberga muitas populações reservatório de elevado potencial de adaptação.

Uma estratégia de monitorização menos enviesada do ponto de vista geográfico e taxonómico, bem como a focalização sistemática de todos os gradientes ambientais e regiões de elevada biodiversidade, constituiriam um contributo importante para a proteção das espécies ameaçadas, muitas das quais prestam também serviços inestimáveis ao homem, como a polinização das culturas ou o controlo de pragas.

Tendo em conta os recentes acordos para travar o declínio da biodiversidade, de que Portugal é um dos países signatários, o estudo salienta também que é urgente a implementação de sistemas de monitorização das espécies em geral, e da sua diversidade genética em particular, a nível regional, nacional e internacional. Tal permitirá um melhor ordenamento do território e um melhor apoio às ações de conservação e recuperação dos ecossistemas, que contribuem para assegurar a persistência das espécies e dos serviços que prestam.