Vitor Vasconcelos, Diretor do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental da Universidade do Porto (CIIMAR-UP) e Professor Catedrático da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) participou, entre os dias 16 e 30 de agosto, numa expedição científica internacional com o fim de estudar a microbiologia de ecossistemas extremos do Altiplano Andino no sul da Bolívia.

Além de Vitor Vasconcelos, a equipa internacional foi composta por investigadores de Espanha (Universidade de Granada e Universidade de las Palmas), Eslovénia (Universidade de Liubliana), México (Universidade Autónoma do Estado de Morelos e Instituto Tecnológico de Tuxtla-Gutierrez), bem como colegas da Bolívia – Universidade Maior de San Simon e Fundação Proimpa, as duas entidades patrocinadoras desta expedição.

A amostragem teve início no Salar de Uyinu, o maior e mais alto deserto salgado do mundo, com mais de 10.000 km2, localizado a 3.656 m de altitude e com diversas lagoas adjacentes com microbiomas ainda não estudados. É também a maior reserva de lítio do mundo.

Mais a sul, na fronteira com o Chile e a Argentina, foram amostrados ambiente extremos em altitudes entre os 4.500 e 5.000 m de altitude, entre eles a região vulcânica ativa de “Sol de Mañana”, a laguna Hedionda, um lago salgado e alcalino; a laguna Colorada, um lago dominado pela microalga Dunaliela salina e com extensas populações de flamingos, e mais alguns outros lagos alcalinos com grandes depósitos de borato de sódio (Lagunas Coruto, Chojlla, Chalviri, Mamakhumo e Pastos Grandes).

Salar de Uyuni, o maior deserto salgado do mundo (Foto: CIIMAR)

Das aplicações biotecnológicas ao restauro de ecossistemas

As equipas envolvidas nesta expedição farão uma caracterização química destes ecossistemas, muitos deles ainda não estudados, e um estudo microbiológico aprofundado abrangendo bactérias, fungos e microalgas. Serão realizados ainda estudos de metagenómica e isolamento de estirpes, de forma a avaliar o potencial biotecnológico, como em biorremediação de solos e de sistemas aquáticos, produção de novas enzimas, fármacos e aplicações na agricultura.

“Além da importante componente relativa ao conhecimento científico da biodiversidade microbiana, queremos encontrar usos sustentáveis para estes recursos. O isolamento das estirpes permitirá o seu cultivo em laboratório e depois à escala piloto, de forma a podermos encontrar aplicações biotecnológicas. Refiro, por exemplo, o desenvolvimento de novos biofertilizantes, bioestimulantes e biopesticidas para a agricultura em cenários de seca extrema e salinização dos solos, a produção de novos cosméticos e nutraceuticos; produtos com aplicação farmacêutica (antibióticos anticancerígenos, anti-obesidade), bioplásticos e outros materiais com aplicação na área alimentar ou até novas tintas antivegetativas para navios”, elucida Vitor Vasconcelos.

A Fundação Proimpa, sediada em Cochabamba na Bolívia, pretende desenvolver novos biofertilizantes, bioestimulantes e biopesticidas baseados neste microorganismos para aplicações em cultivos de quinoa e batatas, duas das produções agrícolas mais importantes da Bolívia, em condições extremas de altitude, temperatura e de stress hídrico e salino. Esses produtos a desenvolver terão também uma enorme relevância a nível europeu, considerando as implicações das alterações climáticas na agricultura, em especial no sul da Europa.

As amostras de cianobactérias e microalgas recolhidas por Vitor Vasconcelos serão usadas em estudos de metagenómica para estudar a biodiversidade e potenciais aplicações biotecnológicas, bem como para o isolamento de estirpes destes organismos que serão depois depositados na coleção LEGE_CC, uma das maiores coleções de cianobactérias do mundo, com sede no CIIMAR.

Como explica o docente e investigador, “caso os ecossistemas desapareçam, podemos sempre restaurá-los usando este repositório de biodiversidade através de medidas de biorremediação. Por outro lado, esta expedição, ao estudar ecossistemas extremos da Bolívia, pode servir de modelo para cenários de alterações globais, por exemplo ao nível europeu, dado que são ecossistemas com muita falta de água (stress hídrico) e de elevada salinidade”.