Uma equipa internacional, que inclui os investigadores Angelica Crottini e Francesco Belluardo, da Associação BIOPOLIS/CIBIO-InBIO (Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos, InBIO Laboratório Associado da Universidade do Porto) e do Departamento de Biologia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP), acaba de publicar dois estudos na prestigiada revista Science, nos quais é apresentada uma  revisão da extraordinária biodiversidade de Madagáscar e são apontadas as oportunidades no campo da conservação do património natural único existente na ilha.

A ilha de Madagáscar é um dos principais hotspots de biodiversidade do mundo, apresentando um conjunto único de plantas, animais e fungos. A maioria das espécies de Madagáscar evoluíram na ilha e não ocorrem em mais nenhum lugar do planeta.

Os estudos agora publicados destacam o grande desconhecimento que ainda subsiste relativamente à biodiversidade de espécies, particularmente nos grupos dos fungos e invertebrados, mas também em vários grupos de vertebrados terrestres, cujas descrições científicas atuais representam apenas uma fração da diversidade total.

“Apesar de séculos de investigações, é extraordinário ver que a maior parte da biodiversidade de Madagáscar ainda precisa de ser descoberta, mesmo em grupos taxonómicos bem estudados como os anfíbios e os répteis, destacando o papel fundamental que a investigação no terreno e baseada em coleções continua a ter no nosso tempo atual!” destaca Angelica Crottini, investigadora do CIBIO-InBIO/BIOPOLIS e coautora do estudo.

Mais conhecimento para uma maior proteção

Através da comparação com os dados de avaliação disponíveis da União Internacional para Conservação da Natureza (UICN) sobre plantas e vertebrados, os investigadores verificaram que apenas um terço de todas as espécies vegetais foram formalmente avaliadas. Ao mesmo tempo, avisam que a sobre exploração (através da caça e colheita de espécies) e as práticas agrícolas insustentáveis afetam 62,1% e 56,8% das espécies de vertebrados nativos, e cada uma delas afeta quase 90% de todas as espécies vegetais.

Atualmente, as áreas protegidas cobrem 10,4% da ilha, e esta rede oferece uma boa cobertura dos principais habitats e da biodiversidade de vertebrados e plantas nativas de Madagáscar. Complementarmente, as coleções ex situ detêm 18% das espécies de vertebrados e 23% das espécies de plantas.

A sobre exploração e as práticas agrícolas insustentáveis são algumas das ameaças à biodiversidade em Madagáscar. (Foto: DR)

Os investigadores defendem que é urgente manter e melhorar a qualidade da proteção das áreas protegidas e desenvolver programas comunitários integrados. Isso, juntamente com ações de conservação ex situ eficazes, tais como o melhoramento de bancos de sementes e a criação de programas de reprodução e reintrodução, será a chave para o sucesso.

“Atualmente, apenas 18% dos vertebrados de Madágascar encontram-se em coleções ex situ. Destes, apenas uma pequena fração é reproduzida com sucesso, e apenas alguns deles são classificados nas categorias mais ameaçadas da lista vermelha da UICN. Há uma necessidade urgente de preencher essas lacunas na conservação ex situ antes que seja tarde demais e aumentar a nossa capacidade de neutralizar as extinções”, avisa Angelica Crottini.

Um “oásis” de biodiversidade

A biodiversidade única de Madagáscar, particularmente na sua flora diversificada, tem proporcionado muitas oportunidades de utilização humana, existindo um manancial enorme de propriedades úteis que podem ainda ser exploradas. Das 40.283 espécies vegetais documentadas para serem utilizadas pelo homem em todo o mundo, 1.916 (5%) encontram-se em Madagáscar. Destas, 1.596 são nativas e endémicas da ilha.

O desafio será encontrar um equilíbrio entre o uso da biodiversidade e a conservação da integridade das áreas protegidas. A maioria dos mais de 28 milhões de habitantes de Madagáscar vive fora, mas muitas vezes próximo de áreas protegidas. Essas comunidades enfrentam desafios relacionados à pobreza generalizada, que está relacionada à degradação do capital natural na paisagem, acesso limitado à educação formal, assistência médica e questões relacionadas com a regulamentação, incluindo a posse da terra.

(Foto: DR)

Madagáscar tem feito progressos importantes para atingir as metas internacionais de clima, biodiversidade e desenvolvimento sustentável, preparando-se para os desafios das próximas décadas. Os investigadores enquadram a biodiversidade como a maior oportunidade e o bem mais valioso para o desenvolvimento de Madagáscar – um recurso essencial para o futuro sustentável e o bem-estar de seus cidadãos.

Os dados agora apresentados, resultantes de décadas de investigação, permitem uma compreensão mais completa e detalhada da biodiversidade de Madagáscar e tornam evidente que Madagáscar constitui uma das principais prioridades e termos de conservação da biodiversidade do mundo.