Cabo Verde é um arquipélago de composição única e distinta dos demais conjuntos de ilhas que conhecíamos, até agora, como Macaronésia. Do ponto de vista marinho, não existe “região biogeográfica da Macaronésia”. Estas são as principais conclusões de um artigo publicado na revista Scientific Reports, por uma equipa internacional liderada por investigadores do  Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos da Universidade do Porto (CIBIO-InBIO).

A Macaronésia corresponde a um conjunto de arquipélagos oceânicos localizados no Atlântico Nordeste: Açores, Madeira, Ilhas Selvagens, Ilhas Canárias e Cabo Verde. Estes arquipélagos partilham uma biogeografia única, ou em outros termos, uma composição exclusiva de espécies e ecossistemas, o que os classifica como uma unidade biogeográfica.

Resultado do mais completo estudo alguma vez realizado sobre a biogeografia marinha desta região, o artigo agora publicado – intitulado Restructuring of the ‘Macaronesia’ biogeographic unit: a marine multitaxon biogeographical approach –  revela, contudo, que o arquipélago de Cabo Verde se diferencia dos demais e, portanto, deve ser classificado numa unidade biogeográfica independente denominada subprovíncia de Cabo Verde. Os investigadores propõe ainda uma nova classificação biogeográfica e sugere que, do ponto de vista marinho, o termo Macaronésia não deva mais ser utilizado, a não ser como referência informal à região geográfica.

A equipa internacional de cientistas, liderada por Sérgio Ávila, e da qual fazem parte os também investigadores do CIBIO-InBIO, Luís Silva, Ricardo Cordeiro, Patrícia Madeira, Ana Cristina Rebelo, Lara Baptista, Carlos S. Melo e Björn Berning, chegou a esta conclusão após analisar registos de mais de 7.000 espécies marinhas de zonas costeiras que incluem desde algas e pequenos crustáceos até peixes. O artigo revela que Cabo Verde é um hotspot de biodiversidade marinha e que tal diversidade é única e independente do que hoje conhecemos como Macaronésia.

A Baía de Nossa Senhora da Luz, na ilha de Santiago (Cabo Verde), foi uma as áreas estudadas pelos investigadores. (Foto: Sérgio Ávila)

Estudos anteriores já haviam apontado as particularidades na flora, organismos terrestres e algumas espécies marinhas de Cabo Verde, sugerindo a sua exclusão da Macaronésia. Contudo, nenhum destes estudos tinha fornecido evidências sólidas que corroborassem a distinção de Cabo Verde em relação aos outros arquipélagos da Macaronésia.

“Neste estudo quisemos perceber de maneira mais detalhada não só a singularidade de Cabo Verde mas também as semelhanças entre os arquipélagos que compõem a Macaronésia. Para além disso, queríamos investigar se algum outro arquipélago na região poderia também ser considerado uma unidade biogeográfica distinta”, explica Sérgio Ávila, autor correspondente do artigo.

Para responder a estas questões, os investigadores reuniram os registos de ocorrência de seis grupos de organismos marinhos da Macaronésia, com diferentes capacidades de dispersão e que constituem os grupos mais bem estudados da região. Os registos foram recolhidos nos arquipélagos da Macaronésia e também em outros sítios como a Península Ibérica e o oeste do Mar Mediterrânico, correspondendo a lista de espécies compilada e validada, a um total de 7,492 espécies marinhas litorais.

Olá Webbnesia!

O estudo liderado pelo CIBIO-InBIO  permitiu então concluir que o padrão biogeográfico único observado em Cabo Verde sustenta a sua exclusão da Macaronésia e a sua classificação numa entidade biogeográfica independente, a subprovíncia de Cabo Verde, esta por sua vez inserida na província de transição da África Ocidental.

O artigo demonstra também que os arquipélagos da Madeira, Ilhas Selvagens e Ilhas Canárias constituem, no seu conjunto, outra unidade biogeográfica, a qual os autores denominaram ecoregião Webbnesia. “Este nome foi escolhido em homenagem ao investigador Philip Barker-Webb, o primeiro a apontar para as similaridades biogeográficas entre estes três arquipélagos, em 1845”, explica Sérgio Ávila.

Os resultados obtidos neste estudo sustentam igualmente a diferenciação do arquipélago dos Açores e a sua classificação na eco-região dos Açores que, juntamente com a eco-região Webbnesia, estão incluídos na província Lusitânica.