Há muito que Catarina Esquível se habituou a trocar os feriados e os sábado à noite com os amigos pelas experiências que povoam o laboratório do grupo de investigação em «Cancer Metastasis» do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S). É ali que, há quase dois anos, procura compreender os mecanismos por detrás do cancro da mama metastático. “Foi a primeira doença com que me deparei que não tinha cura. Tinha um caso de cancro da mama na família e isso deixou-me intrigada”, começa por revelar a investigadora de 22 anos.

Os últimos cinco anos de Catarina foram passados em busca de respostas nos livros do curso de Bioengenharia, repartido entre a Universidade de Trás os Montes e Alto Douro (UTAD) e o Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da U.Porto (ICBAS), com uma passagem pelo prestigiado Institut Curie, em Paris, ao abrigo do programa Erasmus. Já em 2019, a vontade de aprofundar a investigação em cancro da mama trouxe-a ao grupo liderado pela investigadora Joana Paredes, no i3s, onde se tem dedicado a estudar uma molécula associada à metastização do cancro, “processo pelo qual as células cancerígenas saem do tumor inicial e vão colonizar outros órgãos”.

A escolha não foi por acaso. “Por mais que a medicina evolua, os tumores metastáticos continuam a ter as taxas de mortalidade muito elevadas que tinham há uns anos atrás”, revela a jovem investigadora portuense .

Nada que abale a confiança de Catarina. Terminado o mestrado, prepara-se para prosseguir o doutoramento na mesma área, com o apoio de uma bolsa da Liga Portuguesa Contra o Cancro (LPCC). E promete não ficar por aqui. “Estou a fazer o que gosto e esta é a área em que quero continuar no futuro”, vinca. Até onde chega a ambição? “Pode não ser a uma cura, mas qualquer coisa consistente que possa ajudar a melhorar a vida dos doentes…”.

Catarina Esquível,  22 anos (Foto: Egidio Santos/U.Porto)

“Nenhum dia é igual…”

A motivação de Catarina multiplica-se pela dos dos mais de 400 “guerreiros” que garantem a linha da frente do combate ao(s) cancro(s) que se trava, diariamente, na “fortaleza” do maior centro de investigação nacional na área da saúde. “Tornou-se cada vez mais importante fazer parte disto”, sentencia Francisca Diniz, quando questionada sobre o que a levou a dedicar os últimos quatro anos a estudar o cancro gástrico no grupo de investigação em «Glycobiology in Cancer» do i3S. “Trabalhamos com açúcares e glicanos e o objetivo é desenvolver uma terapia dirigida a estes, já que estão altamente expressos em células gástricas. As partículas vão ser direcionadas para as células que têm esses açúcares que estão nos tumores”, explica.

Neste processo, “nenhum dia é igual, todos são diferentes, por mais que planeemos”. Enquanto investigadora, a jovem natural de Monção realça que lida muito com a “tentativa-erro” e que, por isso, o “doutoramento é uma lição de vida. Saímos mais resilientes”. Em resumo, o “dia-a-dia é sairmos daqui mais fortes e sabermos lidar com o não, o sim, com as vitórias e as derrotas”.

Licenciada em Bioquímica pela Faculdade de Ciências da U.Porto (FCUP) e pelo ICBAS, e mestre em Oncologia pelo mesmo instituto, Francisca está atualmente a terminar o doutoramento em Ciências Biomédicas. A meta imediata é clara: conseguir a aplicação do estudo na vertente clínica. A longo prazo, o grande objetivo é “tentar que os trabalhos que estamos a desenvolver ajudem a minimizar, ao máximo, os efeitos colaterais que possam existir nas pessoas”.

Francisca Diniz,  28 anos (Foto: Egidio Santos/U.Porto)

É também para fazer a diferença na vida de quem sofre de cancro que Bárbara Ferreira faz o trajeto diário até ao i3s. Mas, no caso desta investigadora natural de Viseu, tudo começou há apenas três meses, quando iniciou um estágio no grupo de investigação em «Cancer Signalling & Metabolism», integrado no Mestrado em Medicina e Oncologia Molecular da Faculdade de Medicina da U.Porto (FMUP). Desde então, dedica os dias a fazer culturas celulares com o objetivo de perceber a resposta das células de cancro da tireoide a diferentes tratamentos. “Estou a aprender muito. O objetivo é tentar perceber o que quero fazer na tese de mestrado”, conta.

Para Bárbara, foi a curiosidade pelo desconhecido que a motivou a enveredar pela investigação em cancro. A mesma que, há quatro anos, a levou a ingressar na licenciatura em Bioquímica da U.Porto. “Nós crescemos a ouvir coisas sobre o cancro e sempre me intrigou o que é isto, o que é que acontece quando aparece nas pessoas. Na licenciatura, comecei a perceber que estas áreas me interessavam e, agora com o mestrado, tenho a certeza de que no futuro quero trabalhar em oncologia”.

Apesar de acreditar que “o cancro caminha mais para ser uma doença crónica do que para uma doença curável”, a jovem investigadora de 22 anos não esconde o desejo de deixar a sua marca. “Seria importante descobrir algo que, de certa forma, tornasse a doença menos dolorosa e atenuasse o sofrimento em que as pessoas estão”.

Bárbara Ferreira,  22 anos (Foto: Egidio Santos/U.Porto)

“É preciso melhorar a qualidade da vida dos pacientes”

Para Miguel da Cruz Ribeiro, a “descoberta” do cancro aconteceu pelos piores motivos. A doença do avô, de quem herdou o nome, acabaria, porém, por despoletar o “bichinho” que, há dois anos, levou este bioquímico de 22 anos a trocar Lisboa pelo Porto, para ingressar no Mestrado em Oncologia do ICBAS. “Queria mudar de ares e alargar a minha rede de contactos. Também sabia que era um bom mestrado e que me daria a oportunidade de trabalhar no i3s”, explica.

Um ano depois, o desígnio de Miguel cumpre-se hoje entre os balcões do grupo de investigação em “Tumour and Microenvironment Interactions” e as “estufas” celulares do instituto, onde está a estudar, com a ajuda de modelos tridimensionais de cultura de células, os efeitos da radiação nas moléculas emitidas pelas células do cancro do reto, um subtipo de cancro colorretal. É a esse projeto que vai dedicar o próximo ano. Depois? “É um pouco difícil pensar a longo prazo, mas quero manter-me na área da investigação em Oncologia. Gostaria muito de trabalhar em cancro do pâncreas, que é o mais letal neste momento”.

Sim, a morte faz parte do jogo… “O cancro é a segunda doença que mais mata no mundo, depois das doenças cardiovasculares. Só que ao contrário destas,  há todo o peso psicológico de se ser diagnosticado e ficar meses e anos em tratamentos que diminuem muito a qualidade de vida das pessoas. É aí que eu quero contribuir”, atira Miguel. Como? “Enganando” a morte. “Ao investigar em cancro, sabemos que não é realista pensar numa cura, mas sabemos que é preciso melhorar a qualidade da vida dos pacientes. O meu objetivo é trabalhar em algo que prolongue ao máximo a vida das pessoas. Encontrar alguma molécula inibidora nova, quem sabe. Mas ainda falta muito tempo…”.

Miguel Ribeiro, 22 anos (Foto: Egidio Santos/U.Porto)

“O cancro está muito presente na vida das pessoas”

O tempo é um dos maiores inimigos de Inês Batista e dos restantes investigadores do grupo «Intercellular Communication and Cancer» do i3S que se dedicam a estudar de que forma o sistema imunitário afeta o crescimento do cancro pancreático. Para isso, estão a procurar perceber como poderão ser usadas imunoterapias eficazes e por que razão não tem funcionado. Nesta doença, que é “silenciosa e não tem sintomas”, “apenas 10% dos pacientes sobrevivem 5 anos após o diagnóstico. É uma realidade muito triste e chocante”.

Interessada deste muito cedo pelo mundo da investigação e pelo cancro em particular, a verdade é que Inês escolheu precisamente compreender melhor esta doença porque foi “percebendo que o cancro está muito presente na vida das pessoas. Não conheço ninguém na minha vida que não tenha um familiar que tenha tido cancro. Percebi a magnitude deste problema”. Vai daí, decidiu juntar-se ao combate, até porque “precisamos de estudar muito mais nesta área, para ajudar os pacientes”.

Inês Batista, 28 anos (Foto: Egidio Santos/U.Porto)

Talvez isso explique um pouco do percurso da jovem investigadora de 28 anos . Passou por Coimbra e Aveiro e foi até à Escócia, onde fez um mestrado na área da biologia do cancro. Foi no Reino Unido que encontrou “uma outra perspetiva de ver e trabalhar o cancro” e essa foi, sem dúvida, “uma experiência muito importante para me ambientar à área”. De regresso a Portugal, encontrou uma oportunidade no i3S, na área do cancro pancreático. Atualmente, está a iniciar o 3.º ano do Programa Doutoral Internacional em Biotecnologia Molecular do ICBAS e os seus dias “nunca são iguais”. Confessa que o trabalho é “imprevisível”, num “ambiente muito dinâmico e, por vezes, stressante”.

Quanto ao futuro, Inês não fala da cura do cancro como um objetivo, mas acha que “um dia iremos lá chegar”. A jovem investigadora acredita que “os cientistas têm de pensar assim. Somos um grande sistema, estamos todos a contribuir para chegar a um objetivo final… e eu quero contribuir para isso!”