Marianela Ferreira, investigadora do ISPUP, e autora do estudo “A carreira médica e os fatores determinantes do abandono do SNS”.

As principais conclusões da primeira fase de um estudo sobre a carreira e os fatores de saída do SNS realizado por Marianela Ferreira, investigadora do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), em colaboração com o Gabinete de Estudos da SRNOM, aponta que três em cada quatro médicos inscritos na Secção Regional do Norte da Ordem dos Médicos (SRNOM) admite a hipótese de deixar o setor público para trabalhar exclusivamente no privado e 45% coloca a possibilidade de se aposentar.

A amostra deste estudo foi obtida através do preenchimento de um inquérito online, entre julho e novembro de 2015, período durante o qual o questionário esteve disponível na plataforma eletrónica da Universidade do Porto. Dos 13.801 médicos inscritos na SRNOM, 2.070 responderam, tendo sido validadas as respostas de 1.495 profissionais que ainda se encontram a trabalhar no SNS.

Entre a faixa etária mais velha, a alternativa à saída do Serviço Nacional de Saúde (SNS) mais ponderada é a aposentação, seja ela antecipada ou não. Entre os mais jovens, quase 36% dos inquiridos coloca a hipótese de deixar o SNS e emigrar.

De acordo com Marianela Ferreira, “os resultados deste trabalho sociológico, realizado com o apoio do Gabinete de Estudos da SRNOM, mostram uma elevada insatisfação dos médicos com as actuais condições de trabalho no SNS“. “Mais de 76% admite que ultrapassa o seu horário de trabalho semanal, sendo que 26% o faz praticamente todos os dias”, salienta. A este dado junta-se ainda a questão de quase metade dos inquiridos (46,6%) considerar que os descansos compensatórios por lei não são aplicados.

A falta de participação na tomada de decisão e a ausência de tempo para a família, amigos e outras actividades de lazer são outros dos pontos negativos apontados pelos médicos, num estudo em que o único ponto positivo é a valorização dada à relação com os colegas, já que 76,7% diz estar satisfeito com esse relacionamento.

Marianela Ferreira destaca ainda a crescente desmotivação dos médicos inquiridos. “Cerca de 76,7% dos médicos inquiridos neste estudo relevam estar insatisfeitos com a sua atual remuneração no SNS, o que ajuda a perceber por que motivo 54,4% dos inquiridos acumula funções no setor privado”, frisa a investigadora, que alerta ainda para a insatisfação com as perspetivas de evolução na carreira médica.

“É importante que o Ministério da Saúde olhe para estes dados e os analise com cuidado. Os resultados mostram sinais preocupantes. Se, por hipótese, os médicos que admitem sair do SNS o fizessem teríamos um problema gravíssimo num setor que, de si, já se debate com uma falta de recursos humanos considerável”.

No terreno está já a segunda fase deste trabalho de investigação que terá como ponto central de análise os médicos especialistas inscritos na SRNOM que saíram do SNS e os médicos a realizar internato de especialidade. Numa terceira fase, a investigadora do ISPUP pretende replicar o trabalho nas secções regionais do Centro e Sul da Ordem dos Médicos.