A Immunethep, uma empresa spin-off da Universidade do Porto responsável pela conceção da primeira vacina eficaz e totalmente voltada para a prevenção de infecções provocadas por todos os serotipos de um conjunto de bactérias, foi uma das 75 startups selecionadas pelo Conselho Europeu de Inovação (EIC) para receber financiamento ao abrigo do programa EIC Accelerator.

A startup portuense receberá, inicialmente, 2,5 milhões de euros, ficando elegível para um investimento de capital adicional do EIC Fund que totaliza mais de 17 milhões de euros. A Immunethep destacou-se, assim, entre mais de 1000 candidaturas provenientes de toda a Europa.

O EIC Accelerator é um programa que pretende investir e financiar, através do Fundo do EIC, startups ou pequenas empresas que se encontrem a desenvolver e acelerar inovações disruptivas.

O valor do financiamento será aplicado nos primeiros ensaios clínicos em humanos da Paragon Novel Vaccine (PNV), sendo a primeira vez que uma vacina multibacteriana entra em ensaios clínicos.

O processo de candidatura da Immunethep demorou cerca de 1,5 anos, com várias fases que culminaram numa entrevista frente ao júri do programa. Ao longo de todas essas fases os projetos foram avaliados segundo critérios como mérito científico, potencial disruptivo e capacidade de criação de valor, em cujos a spin-off U.Porto se destacou, sendo uma das escolhidas.

Os dados clínicos observacionais obtidos no âmbito deste acordo foram também um fator relevante para o sucesso da candidatura ao EIC, contam os responsáveis da Immunethep. Além disso, referem, foi também muito importante a colaboração da SNAP! Partners e da Margrit Schwarz que atualmente incorpora o “Advisory Board” da spin-off U. Porto.

A abordagem disruptiva da tecnologia da Immunethep também já captou o interesse de empresas farmacêuticas, como a Merck-Sharp-Dome (MSD), com quem já estabeleceram um acordo de colaboração.

Investigação nascida na Universidade do Porto

A PNV é um produto que tem origem numa investigação que começou na Universidade do Porto, mais precisamente no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) num grupo liderado pela investigadora Paula Ferreira da Silva. A investigação deu, depois, origem à formação da empresa Immunethep (com o selo Spin-off U.Porto), a quem a invenção foi licenciada. A Immunethep foi fundada por Pedro Madureira, investigador do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da U.Porto (i3s) e atual Diretor Científico da Immunethep, e pela Venture Catalysts.

Entretanto – e com o apoio da U.Porto Inovação, que continua a apoiar o processo, a tecnologia já foi patenteada em mais de 40 territórios, entre eles Portugal, Estados Unidos, Canadá, Japão, mais de 30 países europeus e também Índia e Hong Kong, sendo a única tecnologia “made in U.Porto” patenteada nestes dois últimos territórios.

“A Índia é um dos países onde a incidência de infeções bacterianas é muito elevada e onde, anualmente, morrem cerca de 200.000 pessoas por doenças causadas por este tipo de infecções”, realça Pedro Madureira.

Uma esperança contra as infeções bacterianas

Explicando de forma relativamente simples, a PNV é a primeira vacina eficaz e totalmente voltada para a prevenção de infeções provocadas por todos os serotipos de um conjunto de bactérias, incluindo multirresistentes, com o objetivo de abranger toda a população desde recém-nascidos até idosos.

Foi desenvolvida com base na descoberta de um novo mecanismo de imunossupressão partilhado por algumas das bactérias mais perigosas e mortais (Staphylococcus aureus, Streptococcus pneumoniae, Klebsiella pneumoniae, Escherichia Coli e Streptococcus do grupo B). Baseada no conhecimento deste mesmo mecanismo bacteriano, a Immunethep está também a desenvolver o produto UNImAb – anticorpos monoclonais – que podem ser usados como tratamento em pessoas já infetadas.

Como referido acima, os próximos passos incluem “finalizar o desenvolvimento do UNImAb (anticorpos) e entrar com a PNV (vacina) em ensaios clínicos”, refere Pedro Madureira.

O investigador e empresário acrescenta que, uma vez que esta parte do processo implica um “investimento significativo”, o reconhecimento do EIC chega numa altura fundamental. Os ensaios clínicos que agora preparam vão permitir avaliar a segurança, imunogenicidade e eficácia da vacina, fazendo com que a Immunethep seja a primeira empresa no mundo a ter uma vacina multibacteriana nesta fase de desenvolvimento, de acordo com o relatório de vacinas da Organização Mundial de Saúde (OMS) de 2021.

Segundo um estudo publicado pelo The Lancet, só em 2019, perto de 5 milhões de pessoas em todo o mundo morreram devido a doenças causadas por infecções bacterianas. Dessas, mais de 1,27 milhões de mortes foram resultado direto da resistência antimicrobiana, tornando fundamental mudar o panorama.

Segundo o relatório da OMS sobre a resistência a antibióticos, prevê-se que, se não ocorreram mudanças significativas na forma como novos medicamentos são desenvolvidos para enfrentar o que chamam de “pandemia silenciosa”, em 2050 a resistência antimicrobiana será a maior causa de morte do mundo, superando o cancro.