Seiichiro Mise regressa ao Porto um ano depois de ter estado na cidade, a convite da ONG japonesa Peace Boat. (Foto: Thomas Züger)

Seiichiro Mise tinha dez anos quando, pelas 11h01 do dia 9 de agosto de 1945, o Bockscar – bombardeiro B-29 da Força Aérea do Exército dos Estados Unidos – largou a bomba atómica sobre a cidade japonesa de Nagasaki, matando entre 25 a 75 mil pessoas e colocando praticamente um ponto final na II Guerra Mundial. Mais de 70 anos depois, é essa experiência que o hoje octogenário vai recordar, na primeira pessoa, esta quinta-feira, 11 de outubro, a partir das 17h30, no Salão Nobre da Reitoria da Universidade do Porto, numa iniciativa integrada nas comemorações dos 40 Anos da Geminação entre as cidades do Porto e de Nagasaki.

Foi na sua casa, situada a 3,6 quilómetros do hipocentro da explosão, que Seiichiro viveu a experiência que lhe iria mudar a vida. “Estava a tocar órgão e imitei o som de uma avião B29, o avião que bombardeava as cidades, e o meu avô chateou-se comigo e disse para eu parar de fazer aquele barulho porque podia assustar as pessoas. Eu estava a fechar o órgão quando vi lá fora uma luz muito forte, era a bomba atómica, aquela luz durou cerca de 2 minutos”, recorda. Mas foi apenas uns dias depois, quando visitou a sua escola, que percebeu a dimensão da tragédia: “O que encontrei estava muito para além de qualquer coisa que eu poderia imaginar. Havia pessoas a morrer e outras com queimaduras horríveis a ser levadas em carroças. Alguns gritavam “Água! Dêem-me água!” e outros tinham tantas dores que gritavam: “Matem-me! Apenas matem-me!”.

Entre 25 mil e 75 mil pessoas terão perdido a vida em consequência da bomba de Nagasaki. (Foto: DR)

Esta será apenas uma parte do relato que o hibakusha – nome dado a sobreviventes de ataques com bombas nucleares – tem partilhado pelo mundo fora e que vai agora contar na U.Porto, numa palestra aberta ao público – em japonês com tradução simultânea em português – e que contará com a presença de Nagiko Yokoyama, diretor do Nagazaki National Peace Memorial Hall for the Atomic Bomb Victims. Ao longo de cerca de uma hora e meia, com espaço no final para perguntas por parte do público, pretende-se então consciencializar a audiência para a importância da paz e para os horrores causados pela guerra.

A sessão desta quinta-feira serve  também de “cartão de visita” para  a exposição “Bomba Atómica – Hiroxima e Nagasaki”, produzida pelo Nagasaki National Peace Memorial Hall for the Atomic Bomb Victims, em conjunto com a Câmara Municipal do Porto, e patente ao público no átrio da Câmara Municipal do Porto até 30 de novembro. Por ocasião da inauguração da exposição, no passado dia 2 de outubro, a cidade acolheu uma delegação composta por 55 habitantes de Nagasaki, encabeçada pelo atual governador –  cargo equivalente ao de Presidente da Câmara – da cidade, Tomihisa Taue, e pelo Embaixador do Japão em Lisboa, Hiroshi Azuma.

Recorde-se que, no âmbito do acordo de geminação entre o Porto e Nagasaki, têm sido várias as atividades conjuntas promovidas pelas duas cidades. Entre elas incluem-se a exposição organizada em 2006, subordinada ao tema “Histórias e Tradições do Japão”; o “Projeto Kaki” desenvolvido com as escolas do 1º ciclo do Porto em 2007, e na sequência do qual foi plantada, nos jardins do Palácio de Cristal, uma árvore Kaki descendente de uma outra sobrevivente ao ataque nuclear da II Guerra Mundial; ou a Japan Week que, em 2010, reuniu no Porto milhares de participantes em torno da cultura japonesa.