Numa nova investigação que acaba de ser publicada na prestigiada revista Science, uma equipa internacional liderada pelo investigador Vardan Adibekyan, do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) e do Departamento de Física e Astronomia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP), conseguiu estabelecer, pela primeira vez, uma correlação entre a composição de exoplanetas rochosos e a composição das suas estrelas-mãe. A equipa demonstrou ainda que, ao contrário do que se supunha, esta relação não é direta.

As estrelas recém-formadas estão rodeadas por um disco protoplanetário, com uma fração do material deste disco a condensar em blocos de formação planetária e o resto eventualmente a cair para a estrela. Devido a esta origem comum, pressupunha-se que a composição desses “tijolos” planetários e dos planetas rochosos de baixa massa seria semelhante à composição da estrela-mãe.

No entanto, até aqui a única referência que havia disponível era o nosso próprio Sistema Solar e para este, a composição dos principais elementos de formação de rochas nos planetas telúricos (com exceção de Mercúrio), tais como magnésio, silício ou ferro, é semelhantes à composição do Sol.

Uma realidade que se altera com o trabalho agora publicado. “O nosso trabalho vai restringir os parâmetros dos modelos de formação planetária, que terão um nível de fiabilidade e detalhe verdadeiramente sem precedentes”, destaca Vardan Adibekyan.

Ilustração da formação de planetas à volta de uma estrela semelhante ao Sol, com rochas e moléculas de Ferro, os “tijolos” para a formação dos planetas, em grande plano. (Imagem: Tania Cunha/Planetário do Porto – Centro Ciência Viva & IA/U.Porto)

A equipa determinou que “a composição dos planetas telúricos está intimamente ligada à composição da sua estrela. O nosso estudo demonstra igualmente que a quantidade de ferro nestes planetas telúricos é maior do que seria de esperar, se deduzida pela a composição do disco protoplanetário onde estes se formaram. A nossa interpretação acerca deste enriquecimento de ferro é que este será provocado por reações químicas no disco protoplanetário e pelas particularidades da formação planetária”, explica o investigador do IA/U.Porto.

Apesar de tudo, este resultado não era inesperado, uma vez que a equipa estava ativamente à procura desta correlação. Para tal, selecionou 21 dos exoplanetas rochosos conhecidos caracterizados com mais precisão.

Esta caracterização baseou-se em medições da massa e do raio, que foram usados para calcular a densidade, assim como a quantidade de ferro nos planetas. Também foram usados espectros de alta resolução, obtidos com os mais avançados espectrógrafos, montados em grandes observatórios espalhados pelo planeta, nos observatórios do ESO de La Silla e Paranal, em Mauna Kea e Roque de los Muchachos, para determinar a composição das estrelas-mãe e deduzir a composição dos componentes essenciais de formação de rochas nos discos protoplanetários”, refere Vardan Adibekyan.

Novas descobertas no horizonte

Segundo Nuno Santos, investigador do IA/U.Porto e professor na FCUP,  compreender a relação entre a composição das estrelas e dos seus planetas tem sido um tópico central da investigação do IA há mais de uma década. “Há anos que a nossa equipa tem recolhido espectros das estrelas que têm exoplanetas, com os melhores espectrógrafos de alta resolução, como o HARPS ou o ESPRESSO do Observatório Europeu do Sul (ESO). Estes espectros são usados para determinar propriedades e abundâncias estelares, e estão compilados publicamente no Catálogo SWEET-Cat“.

A nova geração de espectrógrafos e de telescópios extremamente grandes irão ajudar a levar esta investigação a novos patamares. “Além de permitirem o cálculo das massas dos planetas com menor massa que orbitam estrelas do tipo solar, a instrumentação do ELT, como o HIRES, irá permitir que os investigadores aprofundem mais estes estudos, ao analisar em detalhe a composição das atmosferas dos planetas rochosos, o que irá permitir explorar pistas adicionais acerca da conexão estrela-planeta”, acrescenta Sérgio Sousa (IA & Universidade do Porto).

A equipa ainda encontrou um resultado intrigante. Eles descobriram que há uma falha entre a fração de ferro das super-Terras e dos super-Mercúrios, o que dá indícios que estes planetas representam populações distintas em termos de composição, que poderá ter origem em diferenças no processo da sua formação.

Percentagem de ferro dos planetas analisados e do disco protoplanetário onde os planetas se formaram. (Crédito: Adibekyan et al. (2021)/Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço)

Isto requer mais estudos, já que as simulações de formação planetária que levam em conta apenas colisões, não são capazes de reproduzir os super-Mercúrios de mais alta densidade. Adibekyan acrescenta: “compreender a formação de super-Mercúrios que orbitam outras estrelas vai ajudar-nos a percebermos a densidade particularmente alta de Mercúrio”.