Numa época em que proliferam notícias falsas e pseudociências, é urgente criar mecanismos que permitam aos cidadãos comuns interagir diretamente com instituições científicas de referência, especialmente aqueles que normalmente não se envolvem com a ciência. O “CoAstro: um Condomínio de Astronomi@” é um inovador projeto de ciência cidadã que procura fazer isso mesmo, ao envolver professores, astrofísicos e comunicadores de ciência num processo mediado, não só de investigação, mas também de educação e comunicação de astronomia. Os resultados deste projeto foram agora apresentados num artigo, publicado na revista Cuadernos.Info.

O projeto foi desenvolvido por Ilídio André Costa, professor no Agrupamento de Escolas de Santa Bárbara (Gondomar) e investigador no Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA), que aliou a investigação ao seu trabalho pedagógico, ao desenvolver o CoAstro durante o seu Doutoramento em Ensino e Divulgação das Ciências na Faculdade de Ciências da U.Porto (FCUP) no IA.

Ilídio André Costa explica que há “uma enorme tendência para a ciência contar, cada vez mais, com voluntários não especializados. Na verdade, qualquer um de nós pode – e deve – participar em ciência cidadã, ainda que nem todos o façamos como cientistas. Se essa participação traz grandes desafios, traz também oportunidades extraordinárias, tanto para os cientistas como para os voluntários.”

Momento de uma das sessões de envolvimento da comunidade escolar com os investigadores. (Foto: Ilídio André Costa / Planetário do Porto – Centro Ciência Viva)

As vantagens da Ciência Cidadã

Para Carla Morais, coautora do artigo e docente do Departamento de Química e Bioquímica da FCUP, “a ciência cidadã traz vantagens para todos os intervenientes: professores e alunos têm acesso autêntico à ciência em ação, incluindo cientistas, questões de investigação científica, processos, dados e análise de dados, que promovem o envolvimento com a ciência e oportunidades de aprendizagem”.

A também investigadora no Centro de Investigação em Química da Universidade do Porto (CIQUP) nota ainda que, por sua vez, os cientistas e os comunicadores de ciência “podem colaborar com muitos voluntários, ao mesmo tempo que expandem a consciência pública dos seus tópicos e descobertas”.

O projeto procura aumentar a compreensão dos conteúdos e processos associados à investigação em astronomia por parte dos professores do 1.º Ciclo do Ensino Básico, dando-lhes acesso a recursos, iniciativas e projetos que podem potenciar o seu trabalho quotidiano. Os professores, em conjunto com os comunicadores, envolvem depois a comunidade escolar em iniciativas de divulgação, apontando um caminho para o aumento da relevância da comunidade escolar e o seu envolvimento com a ciência.

Este projeto, coordenado pelo Planetário do Porto – Centro Ciência Viva, onde Ilídio André Costa está atualmente destacado, mostra como, através do envolvimento de professores do 1.º Ciclo, astrónomos e comunicadores de ciência, se pode contribuir não só para a produção de nova ciência, mas também para mudar atitudes e disseminar conhecimentos científicos, fazendo-os fluir, com efeitos duradouros, para um público tipicamente afastado da astronomia.

“Queríamos ver se a ideia funcionava, se seria possível colocar, lado a lado, uma unidade de investigação de ponta e escolas com histórico nulo de envolvimento com a astronomia. Queríamos ainda verificar se o conseguimos fazer sem financiamento específico para estas parcerias”.
Ilídio André Costa

No artigo, os investigadores seguiram os participantes do CoAstro durante um ano letivo. Os resultados mostram benefícios pessoais nas relações estabelecidas entre professores, investigadores e comunicadores, mas também mudanças na identidade profissional, capacidade de compreender e envolver-se na investigação em astrofísica e ainda na comunicação/educação nesta área.

“O CoAstro confirma que as interações pessoais numa iniciativa com este perfil são fundamentais para se conseguir uma partilha efetiva para benefício de todos os participantes”, refere Mário João Monteiro, também coautor do artigo. “Tão importante como adquirir conhecimento é a capacidade de aprender a construir esse conhecimento e a comunicá-lo”, destaca o investigador do IA e docente da FCUP.

As conclusões mostram ainda a escola é um poderoso meio de democratização do acesso à ciência, quer para alunos, quer para a restante comunidade escolar, além da relação entre investigação, comunicação de ciência e ensino das ciências ser praticamente incontornável nos processos de democratização do acesso à ciência e consequente formação de opinião informadas.

Mário Monteiro acrescenta: “O artigo agora publicado analisa o sucesso que este projeto em Astronomia conseguiu nessa direção. Ao ligar as comunidades envolvidas de cientistas, professores e comunicadores de ciência, o CoAstro conseguiu um impacto significativo para os próprios, com enorme benefício para os grupos de alunos e para as famílias ligadas aos participantes.”