É possível ouvir o passado? Será que há tanto por vir como o que já passou? Poderemos olhar para o futuro, sem entender o passado? Há perguntas em forma de anzol que nos fazem emergir da linha do tempo, o tempo do agora, parar e pensar. Em quê? Podemos começar pela escala de tempo e espaço. Ruído é um espetáculo de divulgação científica sobre ondas gravitacionais para ver e ouvir no Planetário do Porto – Centro de Ciência Viva nos dias dias 11, 12, 13, 24, 25, 26 e 27 de novembro.

Embora inicialmente previstas por Albert Einstein, só em 2015, e graças a um detetor, o Laser Interferometer Gravitational-Wave Observatory ou LIGO, se conseguiu confirmar a existência de ondas gravitacionais que permitem estudar o início do universo. O LIGO é composto por dois grandes interferômetros a laser, localizados a milhares de quilômetros de distância, um em Livingston, Louisiana e outro em Hanford, em Washington.

Como conhecer o inicio da vida do universo?

Em 2017,  uma investigadora do Instituto de Astrofísica e de Ciências do Espaço (IA) na Universidade do Porto, Lara Sousa, colocava a si própria algumas questões: Como conhecer melhor o início da vida e como foi a evolução da física ao longo da vida do universo? Qual a forma de lá chegar?

À procura de cordas cósmicas e outros defeitos topológicos com ondas é o título do projeto de investigação científica apresentado à Fundação para a Ciência e Tecnologia, com uma vertente de comunicação de ciência. Sobe agora ao palco do Planetário do Porto.

Há muito familiarizada com estas questões da cosmologia está Raquel S., responsável pela dramaturgia do espetáculo. Desde os tempos em que frequentou o curso de Filosofia da Faculdade de Letras da U.Porto que as debate, precisamente com a irmã, Lara Sousa, com quem vivia, na altura, e que estava a completar o curso de Astronomia na Faculdade de Ciências. Cada uma na sua área de estudo, as irmãs chegaram até a ter uma disciplina com o mesmo nome: Cosmologia.

Tendo sido pensado desde o início como um projeto de divulgação científica e dada a complexidade do tema, Raquel S. teve como preocupação “o nível de precisão que poderíamos atingir com este tipo de discurso”, mas sem o tornar críptico.  Ou seja, para além de “concessões artísticas”, sabia que o caminho seria estabelecer cruzamentos, nomeadamente com o recurso a elementos da Filosofia para ajudar a pensar estas grandezas do Cosmos. Uma prática que, de resto, já é habitual à Associação Cultural Noitarder, que enlaça os seus projetos de teatro com disciplinas como a filosofia e a literatura.

Aproximação a experiências do quotidiano

Se conseguimos ouvir o que não vemos, como uma ambulância a passar na rua quando estamos dentro de casa, por exemplo, “podemos detetar ondas gravitacionais de objetos que não vemos e que passam através de obstáculos”, explica Lara Sousa. Daí a analogia com o som, mas há outras aproximações a experiências do quotidiano.

As transições de fase do início do universo (que provocam ondas gravitacionais) são associadas à ocorrência de um trauma, já que se trata de “um acontecimento que provoca uma onda de choque sobre a nossa forma de agir”, diz-nos Raquel S.. A queda de um objeto no chão e a consequente projeção de vidros originada pelo embate servirá para, visualmente, ilustrar o movimento de expansão do Big Bang, e o recurso a um tecido onde é colocado um objeto circular, que através do peso curva o tecido, servirá para exemplificar a relação espaço / tempo.

Pequenas perguntas para chegar às grandes questões

A grandeza de tempo foi uma ideia que Raquel S. quis “trocar por miúdos”. “O que é este tempo do universo que é tão comprido e inimaginavelmente longínquo? Como é que o conseguimos comparar com o nosso dia-a-dia? Com a nossa finitude?” Daí o paralelo com a escala de tempo da existência humana. “A forma do meu corpo é a consequência de uma genética (…) do cabelo escuro da minha mãe, das características da minha bisavó e assim sucessivamente”. Da mesma forma, esclarece, que “o processo científico também deduz a partir das ondas gravitacionais. Também faz investigação do que está para trás (o início da vida do universo) através do ruido que chega até nós hoje.”

A linha dramaturgia que Raquel S. seguiu foi: A partir de pequenas perguntas, chegar às grandes questões. Por exemplo: Porque é que há noite? Que servirá para explicar o paradoxo de Olbers, ou qual a diferença entre ruído e barulho? Pretexto para falar dos sinais gerados no início da vida do universo que, sobrepostos, criam ruído, comparável (outro paralelismo) com o barulho do “e se”, “e se”, “e se” que geramos na nossa própria mente e que nos impede de obter clareza.

Para nos reposicionar, no espaço e no tempo, o Ruído tem estreia marcada para dia 11 de novembro, às 21h00 e repete dia 12, à mesma hora. No dia 13 acontece um pouco mais cedo, às 19h00. Retoma também às 19h00, mas de dia 24 de novembro. Dias 25 e 26 tem sessões marcadas para as 21h00 e termina a 27 de novembro, com um espetáculo às 19h00.

Com produção da Noitarder, o espetáculo tem música de José Alberto Gomes, vídeo de Miguel C. Tavares e interpretação de Maria Inês Peixoto.

A entrada é livre, e pode fazer a reserva prévia.