Desde que a Covid-19 mudou o mundo, há quase dois anos, também os cientistas passaram a fazer parte do nosso quotidiano. Que o diga Margarida Saraiva, investigadora do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S) que tem sido chamada várias vezes a público para esclarecer temas relacionados com a pandemia. E não por acaso. Presidente da Sociedade Portuguesa de Imunologia entre 2018 e 2021, integrou a equipa do i3S que iniciou a realização de testes de diagnóstico do SARS-COV-2 no Instituto, e, em 2021, desenvolveu os ensaios pré-clínicos para uma vacina portuguesa. Mas é ao nível da tuberculose que o trabalho desta cientista portuense se tem destacado e obtido reconhecimento mundial…

Licenciada em Bioquímica pela Faculdade de Ciências da U.Porto (FCUP), Margarida Saraiva seguiu depois para a Universidade de Cambridge (Reino Unido), onde fez o doutoramento em Virologia no laboratório de Antonio Alcami, ainda hoje um dos seus mentores a nível de investigação científica. Durante quatro anos, centrou a sua investigação em virologia, mais especificamente nos poxvirus, a família do vírus que causa a varíola, e só quando mudou para o laboratório da cientista Anne O’Garra, no MRC-National Institute for Medical Research, em Londres, para fazer o pós-doutoramento, é que começou a dedicar-se à imunologia. Aqui investigou os mecanismos moleculares que regulam a expressão da Interleukin-10 pelas células imunes.

Em 2007, Margarida Saraiva regressou a Portugal e juntou-se ao Instituto de Investigação em Ciências da Vida e da Saúde (ICVS) da Universidade do Minho, onde esteve durante oito anos, primeiro como Investigadora Ciência e mais tarde como Investigadora Associada da FCT. Em 2015, volta ao Porto para liderar um grupo de investigação no Instituto de Biologia Molecular e Celular (IBMC), hoje integrado no i3S. Este grupo, denominado «Immune Regulation», tem como objetivo investigar os mecanismos subjacentes à regulação das interações entre hospedeiro e patogéneo.

Em 2021, a sua investigação mereceu referência na revista científica Nature Communications e, também nesse ano, conquistou um Concurso CaixaResearch de Investigação em Saúde com um projeto denominado «TB-TARGET – Uma abordagem multidisciplinar para compreender as interações entre o hospedeiro e os agentes patogénicos a fim de desenvolver novas estratégias para combater a tuberculose».

Com vários projetos desenvolvidos no domínio da tuberculose, nomeadamente na Guiné Bissau, Margarida Saraiva liderou, mais recentemente, a equipa do i3S responsável – juntamente com o ICVS, o Instituto Pasteur (França) e a Universidade de Nanjing (China) – pela descoberta do mecanismo que limita a utilização da citocina IL-10 no tratamento do cancro e outros tratamentos anti-inflamatórios.

Margarida Saraiva é a líder do grupo de investigação em «Immune Regulation» do i3S. (Foto: i3S)

Naturalidade? Porto

Idade? 46 anos

– Do que mais gosta na Universidade do Porto?
Da qualidade dos seus estudantes e do espírito que nos une, mesmo quando não necessariamente ligados à Universidade.

– Do que menos gosta na Universidade do Porto?
Do relativo distanciamento entre a Universidade e os investigadores do universo U.Porto.

– Uma ideia para melhorar a Universidade do Porto? 
No seguimento da questão anterior, gostava de ver uma melhor e maior integração dos investigadores nas carreiras ligadas à Universidade do Porto.

– Como prefere passar os tempos livres?
Estar com a minha família, praia, ler, viajar, andar a pé, praticar pilates.

– Um livro preferido?
Adoro ler e tenho sempre livros por perto. Talvez o meu livro favorito seja O Memorial do Convento, de José Saramago. Mas gosto muito de ler Paul Auster, Siri Hustvedt, Vikram Seth, Ian McEwan, Julian Barnes, Margaret Atwood, Hemingway, Garcia Marquez… Em língua Portuguesa, para além de Saramago, gosto bastante de João Tordo, Mia Couto, Eça de Queirós. Estou a ler Our Man in Havana, do Graham Greene.

– Um disco/músico preferido?
Gosto muito de jazz e bossa nova. Todas as músicas de Chet Baker são favoritas.

– Um prato preferido?
Perco-me com marisco.

– Um filme preferido?
Qualquer um do Woody Allen, com um fraquinho pelo Manhatan Murder Mistery.

 – Uma viagem de sonho? 
Qualquer uma, grande ou pequena, na companhia dos meus filhos e marido. Se enumerar uma já feita: a ida à Australia. Uma por fazer: Japão.

– Um objetivo de vida?
Continuar a viver com entusiasmo, empenho e envolvimento, para ajudar os que me são queridos a atingir os seus objetivos.

– Uma inspiração? (pessoa, livro, situação…)
Felizmente tive a sorte de me cruzar com muitas pessoas inspiradoras. Em termos de trabalho, sou muito inspirada pelos meus orientadores de doutoramento (Antonio Alcami) e de pós-doutoramento (Anne O’Garra). Ter vivido muitos anos no Reino Unido foi também uma influência enorme na minha vida. A minha família que sempre me deu asas para poder voar.

– O projeto da sua vida…?
Os meus filhos. E se no caminho puder contribuir para uma melhor compreensão das doenças infeciosas…

– Uma ideia para promover a investigação da U.Porto a nível internacional?
Atrair investigadores de topo para carreiras na Universidade.