Diz que foi com “muita admiração” – traduzida em “cinco minutos sem dizer nada” – que recebeu a notícia da conquista do Prémio Pessoa 2022, atribuído no passado mês de dezembro. Ora, é com a mesma humildade que João Luís Barreto Guimarães encara os desafios com que tem se deparado ao longo de uma vida marcada por três grandes paixões: a Poesia, a Medicina e a Família.

Este “portuense de gema”, mas assumido cidadão do mundo, nasceu a 3 de junho de 1967. Poeta e tradutor, é médico de Cirurgia Reconstrutiva no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho. Desde 2021, é também o responsável pela inovadora Unidade Curricular de Introdução à Poesia e Medicina, integrada no plano de estudos do Mestrado Integrado em Medicina do ICBAS.

Formado em Medicina no ICBAS, foi no quinto ano da especialidade que decidiu ir para Nova Iorque (no fatídico setembro de 2001) aprender no melhor centro de cirurgia plástica reconstrutiva – o Memorial Sloan Kettering Cancer Center. Aí, aproveitou para reler os autores anglo-saxónicos que o influenciaram na sua escrita, tal como os autores de leste aquando da sua passagem em Praga, sem esquecer os autores portugueses por quem revela admiração, desde Cesário Verde até António Manuel Pires Cabral.

Hoje em dia, João Luís Barreto Guimarães divide o seu tempo entre o Porto e Venade (o seu refúgio de fim-de-semana), onde executa o seu trabalho como médico, mas também onde escreve Poesia, seja numa mesa de um café, seja após uma cirurgia.

Serão a Poesia e a Cirurgia reconstrutiva coexistentes? Para ele sim, não distingue ambos e considera a Poesia como uma “máquina verbal” que se trabalha e burila, tal como um “escultor” na revisão estética do paciente. Daí que a sua estética entenda o Poema como Som e Imagem.

O Professor na Biblioteca ICBAS/FFUP. (Foto: ICBAS)

A obra literária de João Luís Barreto Guimarães inclui 12 livros de poesia publicados em várias línguas. Os primeiros sete estão reunidos em Poesia Reunida (Quetzal, 2011). Seguiram-se: Você está Aqui (Quetzal, 2013); Mediterrâneo (Quetzal, 2016), vencedor do Prémio Nacional de Poesia António Ramos Rosa, em 2017, e do Willow Run Poetry Book Award 2020; e Nómada (Quetzal, 2018), ao qual foram atribuídos o Prémio Livro de Poesia do Ano Bertrand e o Prémio Literário Armando da Silva Carvalho.

As suas obras mais recentes incluem O Tempo Avança por Sílabas (2019) e Movimento (Quetzal, 2020), livro com que conquistou o Grande Prémio de Literatura dst e que viria a “motivar a atenção do júri do Prémio Pessoa”. Já em 2023, lançou Aberto Todos os Dias (Quetzal, 2023).

Naturalidade? Ramalde, Porto

Idade? 55 anos

– De que mais gosta na Universidade do Porto?

Da sua localização na cidade. Falo naturalmente da minha Faculdade, o Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar. A possibilidade de percorrer as ruas, de contactar os habitantes, de permanecer numa esplanada de café no intervalo das aulas ou no final do dia, tudo isso confere ao Conhecimento um carácter prático e humano porque o confronta diariamente com um tempo e uma geografia. E a faculdade está ali, no centro da população que serve. Próxima. Humana.

– De que menos gosta na Universidade do Porto?

Que não seja para a vida inteira. Seis anos é muito pouco tempo.

– Uma ideia para melhorar a Universidade do Porto?

Tudo o que se possa continuar a fazer no sentido de aperfeiçoar o que possa já estar a ser feito quanto ao alojamento dos alunos, ao apoio financeiro aos seus estudos, e à identificação de saídas profissionais será uma mais-valia. Aprofundar as ligações entre a Universidade e a Sociedade Civil.

– Como prefere passar os tempos livres?

A ler e a viajar.

– Um livro preferido?

Só um?… Um romance que me marcou foi “Bairro de Lata”, de John Steinbeck; um livro de crónicas “Crónicas Americanas”, de Sam Shepard; um livro de poesia “Map”, de Wislawa Szymborska.

– Um músico preferido?

Lloyd Cole.

– Um prato preferido?

Tantos… tantos…

– Um filme preferido?

“A Missão”, de Roland Joffé.

– Uma viagem de sonho?

Um mês de carro pelo norte da Noruega, da Suécia e da Finlândia, no Outono. Ou na Primavera pela Mesopotâmia, entre o Tigre e o Eufrates. Ou Alexandria. Não faltam lugares onde ir.

– Um objetivo de vida?

Aproveitar para viver, já agora que estou vivo.

– Uma inspiração?

Manuel António Pina.

– O projeto da sua vida.

Acordar amanhã de manhã.

– Uma ideia para promover uma maior ligação entre a Universidade e a comunidade?

Cada Faculdade ter a possibilidade de divulgar à população da cidade através de cartazes, painéis, outdoors, fachadas, muros, programas ou exposições, exemplos de ideias e projetos que estão a acontecer cada ano, entreparedes.

– Com a nomeação para o Prémio Pessoa 2022, e agora que a “poeira” assentou, o que representou este reconhecimento?

Ainda é muito cedo para perceber…

– O que é que a poesia lhe dá enquanto médico e o que é que a medicina lhe traz para a poesia?

Experiência e imaginação.