Desde a infância que Elsa Logarinho se habituou a seguir os programas do National Geographic e a fazer disseção de abelhas para lhes extrair o ferrão. Mas havia também o gosto pelas artes e pela arquitetura. Uma visita de estudo ao Departamento de Citogenética do Hospital de S. João ajudou-a a encontrar o seu caminho: “Fiquei maravilhada por essas estruturas fantásticas que contêm o material genético, os cromossomas…”.

Aliás, mais tarde, Elsa viria a escolher o curso de Bioquímica, na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP), por ser o único com disciplinas de genética e biologia molecular. Seguiu-se o doutoramento em Ciências Biomédicas no Instituto de Biologia Molecular e Celular (IBMC) – hoje integrado no Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S), da U.Porto –, onde, sob supervisão do investigador Claudio Sunkel, estudou os mecanismos de regulação da fidelidade da divisão celular/mitose.

No final do doutoramento, enveredou por uma carreira de sete anos no ensino universitário. Até ter “um momento de crise”. Faltava-lhe algo. “Falei com o Prof. Claudio Sunkel que me incentivou a voltar à investigação. Coragem ou loucura, assim decidi”, conta. Assim, em 2009 regressou para a investigação em ciência básica, no laboratório do investigador Helder Maiato, no âmbito do programa Ciência. Em 2011, Elsa Logarinho conquistou o Prémio Pfizer e, um ano depois, o prémio de investigação atribuído pela Sociedade Portuguesa de Genética Humana. Entre o ensino e a transição para a independência científica, Elsa Logarinho teve três filhos.

Em 2017, torna-se líder do grupo de investigação em «Envelhecimento e Aneuploidia» do i3S, onde vem centrando o seu estudo nas “alterações do material genético durante o envelhecimento e como estas contribuem para a acumulação de características senescentes a nível celular e estão associadas a doenças do envelhecimento, como o cancro, inflamação e neurodegeneração”.

Foi neste contexto que a sua equipa descobriu um novo composto capaz de corrigir a instabilidade do material genético, uma característica que está na base do envelhecimento celular. Esta primeira estratégia farmacológica de rejuvenescimento celular baseada no aumento da estabilidade cromossómica foi publicada no início deste ano na prestigiada revista científica EMBO Reports e teve honras de capa na edição de maio.

Mais recentemente, o grupo de investigação liderado por Elsa Logarinho foi distinguido pela Progeria Research Foundation (PRF) com uma bolsa para aplicar no combate à progeria, uma doença rara de envelhecimento precoce em crianças.

Naturalidade? Leça da Palmeira, Matosinhos

Idade? 48 anos

– Do que mais gosta na Universidade do Porto?

A formação sólida que oferece aos seus alunos ao longo dos vários ciclos. A preparação dos alunos é reconhecida a nível internacional. Também aprecio que a Universidade do Porto tenha criado nas duas últimas décadas cursos e programas doutorais atualizados e adaptados aos novos perfis profissionais.

– Do que menos gosta na Universidade do Porto?

A Universidade do Porto, e as Universidades em Portugal, de um modo geral, perdem pela falta de uma integração eficaz dos investigadores, que ajudariam a tornar os conteúdos programáticos menos estanques. A carga letiva excessiva dos docentes universitários não é compatível com uma investigação competitiva e os investigadores não têm sido devidamente atraídos e valorizados pelas Universidades.

– Uma ideia para melhorar a Universidade do Porto? 

Para além do aspeto acima mencionado sobre a necessidade da integração das carreiras universitárias e científicas, do ajustamento das cargas letivas, e da transparência nas contratações, um outro aspeto a melhorar prende-se com a adaptação dos currículos e cursos às tendências atuais. É verdade que existem novos cursos que não existiam há 20 anos atrás, mas é interessante assistir a como certos cursos previamente existentes se tornaram tão populares enquanto outros se tornaram menos atrativos. A Universidade deve dinamizar o corpo docente e os currículos de uma forma mais eficaz e progressista.

– Como prefere passar os tempos livres?

Em passeios com a família no campo e na praia, em convívio com os amigos (+ vinhos e tapas), e em concertos e festivais.

– Um livro preferido?

Tantos. Autores de eleição são Gabriel Garcia Marquez, Eça de Queirós e Mia Couto. Gostei de ‘Meia-Noite ou o Princípio do Mundo’, de Richard Zimler. Estou a ler ‘A elegância do Ouriço’, de Muriel Barbery.

– Um disco/músico preferido?

O meu estilo musical favorito é o post-punk, obviamente determinado pela minha adolescência nos anos 80. Joy Division, The Jesus and Mary Chain, Nick Cave, Cocteau Twins, mas destaco The Sound e o vocalista Adrian Borland. Grupos atuais incluem Arcade Fire, Franz Ferdinand, The XX, Interpol, IDLES.

– Um prato preferido?

Cabrito assado da mãe em ocasiões festivas, ainda que, por regra, prefira peixe grelhado (sempre fresco em Matosinhos). A cozinha mediterrânica é excelente, mas, se possível, seria alvo de traição pela maravilhosa cozinha japonesa.

– Um filme preferido?

«Lost in translation», de Sofia Coppola. Adoro esta realizadora e as bandas sonoras dos seus filmes são sempre excelentes. E a série «Peaky Blinders», genérico ‘Red Right Hand’ do Nick Cave, e banda sonora impressionante com Artic Monkeys, PJ Harvey, White Stripes,…

– Uma viagem de sonho ? 

Dos países que visitei, escolho o Japão pela harmonia perfeita que se encontra entre a cultura milenar e a contemporânea. E isso é patente no respeito que têm pelos idosos ao mesmo tempo que abraçam a modernidade. Adoro a arquitetura, os jardins e a culinária japoneses. Quero voltar a visitar com mais tempo. Num registo diferente, e pelo fascínio que tenho pela civilização inca, gostaria de visitar o Perú.

 – Um objetivo de vida?

Ser feliz e conseguir alcançar uma inteligência emocional capaz de contribuir para a felicidade de todos os que me rodeiam.

– Uma inspiração? (pessoa, livro, situação…)

Em geral sou inspirada por personalidades vanguardistas, quer nas artes quer na ciência. Destaco três mulheres: Frida Kalo, Rosalind Franklin e Sophia de Mello Breyner.

– O projeto da sua vida…

Os meus filhos. Conseguir transmitir-lhes os valores de honestidade, generosidade e empenho, e sobretudo, torná-los sonhadores e otimistas.

Um projeto profissional: o envelhecimento saudável.

– Uma ideia para promover a investigação da U.Porto a nível internacional?

O reconhecimento pela comunidade científica internacional dos investigadores da U.Porto é o melhor veículo de promoção. A internacionalização, a meu ver, não passa pela exportação dos investigadores U.Porto, mas sim pela capitalização do seu conhecimento científico ao serviço da da U.Porto. O reconhecimento internacional assenta em publicações de alto impacto e descobertas disruptivas, mas que requerem financiamento competitivo e estabilidade da carreira científica, algo a melhorar.

A U.Porto deveria também promover o ensino lecionado por professores internacionais convidados, aliás, promover um intercâmbio entre as universidades europeias. Um exemplo de projecção internacional e fruto da grande visão da Prof. Maria de Sousa, é o programa doutoral GABBA, que promove o ensino modular por investigadores convidados líderes em diferentes áreas.