Aos 13 anos já podemos saber tudo o que queremos? Para Bruna Moreira talvez sim. Foi com essa idade que visitou, pela primeira vez, a Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEP) e a resposta à pergunta “O que queres fazer quando fores grande?” – que “tinha variado entre ser professora, bibliotecária e historiadora” – passou a ser, naquele momento, “economista”. “Foi o que senti que tinha de fazer…” e foi desta forma que a jovem natural de Felgueiras decidiu entrar na U.Porto.

Bruna costuma “aceitar o fluxo de experiências que se vai chegando”, o mesmo que lhe deu a oportunidade de ir para a China… Mas esta procura pelo “desconhecido” começou até antes. Logo após o primeiro ano da licenciatura em Economia, participou num programa de empreendedorismo social nos Estados Unidos, onde conheceu pessoas que são “ainda hoje, uma fonte constante de inspiração”. E não é por acaso… “Uma delas, curiosamente um português, estudante de Gestão em Lisboa, foi quem me falou sobre o seu período de intercâmbio na China. Até então não tinha sequer pensado em viajar para a China, mas quanto mais ouvia, mais ficava curiosa. Assim, mesmo antes de deixar Washington, Bruna Moreira já tinha decidido e estava convencida de que ia fazer de tudo para ir estudar na China“.

Bruna Moreira tem 22 anos e é natural de Felgueiras. A jovem fez um período de mobilidade em Pequim e voltou para concretizar o sonho de fazer o Mestrado na China. Até que veio a COVID-19… (Foto: DR)

Confessa que os pais e amigos ficaram “mais intrigados com a ideia do que propriamente surpreendidos”. A verdade é que para a jovem de 22 anos, “se, por vezes, este desconhecimento é atrativo, na maioria do tempo alia-se à resistência a tudo o que é diferente, o que gera estereótipos, preconceitos e medos”. Sem receios ou medos, planeou um semestre de mobilidade na Ásia.

“Fui parar a Pequim sem conhecer ninguém, sem falar chinês…ainda me aventurei a passar 24 horas sem cartão de telemóvel ou acesso a internet (bem, aqui foi mesmo teimosia). Passei um semestre a estudar na Beijing Normal University, o que se revelou uma experiência pessoal, social e educativa fantástica”.

Na verdade, esta experiência acabou por “mudar a vida” de Bruna Moreira. Quando voltou do período de mobilidade, decidiu que queria “passar mais tempo a compreender a China”. Ao abrigo da bolsa China Three Georges atribuída a estudantes da U.Porto, candidatou-se ao Mestrado em Política Chinesa, Relações Internacionais e Política Externa na Tsinghua University, uma das melhores na China. Um ano depois, a história “repetiu-se” e voltou a Pequim.

A agora alumna da FEP fez mobilidade na Beijing Normal University ao abrigo de uma bolsa China Three Georges destinada a estudantes da U.Porto. (Foto: DR)

O plano era esse… Mas Bruna aterrou em Portugal para as férias de Inverno dois dias antes da primeira notícia sobre o “aparecimento do então surto de infeções respiratórias em Wuhan”. “A partir daí, a data de regresso à China foi sendo repetidamente adiada e, tendo em conta a ‘política 0’ e o encerramento quase total das fronteiras Chinesas (que ainda vigora), acabei por realizar três quartos do Mestrado em regime online”.

Bruna Moreira levou na bagagem de “férias” a vontade de regressar e a certeza que terá que voltar à Ásia, para ” continuar o percurso que comecei, e continuar a explorar todas as dissonâncias cognitivas que vão surgindo para quem estuda (n)a China”. Na verdade, e depois de tantas horas de ensino à distância, para a alumna da U.Porto, “há muito que podia dizer sobre estudar online, longe de professores e amigos, palavras certamente refletidas por todos os que viveram está situação, mas acabo assim: mesmo com o sono perdido, a tentar conciliar oito horas de diferença horária, a emendar a esperança num coração partido, não há lugar para arrependimento”.

(Foto: DR)

– De que mais gostas na Universidade do Porto?
Das pessoas. No dia em que realizei a matrícula ouvi o testemunho que um estudante dava aos novos alunos. Não consigo replicar o que disse, mas lembro-me bem de como os seus olhos brilhavam com entusiasmo genuíno. É esse entusiasmo, exposição a diversidade de ideias e aceitação das diferenças que marcam positivamente a U.Porto.

– De que menos gostas na Universidade do Porto?
Que cursos, principalmente nas Ciências Sociais e Humanidades, corram o risco de serem apenas uma extensão do secundário.

– Uma ideia para a Universidade do Porto?
História e tradição são importantes, mas não devem fazer esquecer a necessidade de inovar organização estrutural, métodos e conteúdos de ensino. Penso que a Universidade beneficiaria com uma flexibilização na construção de currículos com maior autonomia de escolha pelos alunos, unidades curriculares direcionadas para as novas necessidades do mercado e promoção da multidisciplinariedade.

– Como preferes passar os tempos livres?
Cresci a aprender, fazer e ouvir música. Apesar de agora só ocupar os tempos livres a ouvir, é sem dúvida a minha atividade favorita. Mas gosto de entretenimento no geral.

– Um livro preferido?
Quando Nietzsche Chorou de Irvin D. Yalom. Tecnicamente é um livro de ficção, mas com muita filosofia e psicologia à mistura. Imaginem como seria se Nietzsche e Breuer, um dos fundadores da psicanálise se sentassem a conversar, porque foi exatamente isso que Yalom fez.

– Um disco/músico preferido?
Como adoro música, de muitos gêneros e origens diferentes, é mesmo impossível escolher. O mais próximo que tenho de uma resposta é recomendar as mais repetidas do momento: Impossible (Orchestral Version) dos Nothing But Thieves; Still Fighting It de Lee Chan Sol; e para quem se quiser aventurar numa balada em mandarim 永不失聯的愛 (Unbreakable Love) do Eric Chou.

– Um prato preferido?
Não tenho um prato favorito (durante muito muito tempo dizia que era esparguete com atum. É verdade…). Mas gosto de pratos picantes, especialmente se houver noodles à mistura.

– Um filme preferido?
Como escrevi a minha tese sobre a contribuição para soft power das indústrias cinematográficas da China, Japão e Coreia do Sul, a forma como escolho e assisto a filmes mudou muito. Portanto respondo com um título que me foi recomendado The Departed (2006) e complemento com Infernal Affairs (2002), a versão original produzida em Hong Kong.

– Uma viagem de sonho?
Não consigo fugir, quero muito conhecer bem o Leste Asiático. Mas Austrália, Escócia e México também estão na (longa) lista…

– Um objetivo de vida?
Li algures que não é garantido que a procura de felicidade nos traga felicidade, mas a procura de um significado para a nossa existência trará. Na verdade, só quero encontrar a melhor forma de aproveitar o que “tenho” para tornar a passagem de alguém pelo caos (mesmo que infinitesimamente) mais positiva. Na prática, penso que passará por trabalhar no avanço das interações e compreensão entre regiões e países, particularmente a Europa e a China.

– Uma inspiração? (pessoa, situação, livro, …)
Acredito que como estamos rodeados de histórias a todo momento, estamos sempre expostos a fontes de inspiração. Sou daquelas pessoas que se inspira mesmo com as coisas mais pequenas e aleatórias. Para além disso, tive o privilégio de crescer numa família que valoriza a amor incondicional e livre. A ‘avó Maria e as suas seis filhas’ podiam ser protagonistas num romance ao estilo de Austen, mas são, pelo menos para mim, importantes exemplos de força no feminino.

– Um conselho para futuros estudantes que ainda estejam a ponderar fazer mobilidade?
Fazer mobilidade é uma oportunidade gigante para crescer. É um período geralmente curto, mas muito intenso, em que somos constantemente desafiados a expandir a zona de conforto. Além disto, as pessoas que conhecemos têm um efeito transformador no nosso percurso pessoal e profissional. No fim de um período de mobilidade, eventualmente chegamos à conclusão que não há como reverter este “vício” de conhecer mais mundo.